
Apesar de a circulação de bicicletas na freeway ser proibida, muitas pessoas pedalam na rodovia, seja para locomoção, seja para fins desportivos. A prática, que já traz seus riscos relacionados à divisão da pista com veículos automotores, e justamente por isso é vedada, tem oferecido aos ciclistas um outro perigo: os assaltos. Os roubos ocorrem, principalmente, em um trecho no município de Gravataí. Somente em agosto, foram ao menos três registros que chegaram ao conhecimento da reportagem.
Os dados da Polícia Civil do Rio Grande do Sul e da Secretaria Estadual da Segurança Pública (SSP), apontam 19 roubos a ciclistas na BR-290, principalmente nos arredores do km 79, entre janeiro de 2018 e julho de 2023. Porém, como muitos casos não são registrados, o número certamente é maior.
De acordo com a Polícia Rodoviária Federal (PRF), além de o tráfego de bicicletas ser proibido em toda a rodovia, o trecho é considerado especialmente perigoso para quem pedala, em virtude da mata existente no sentido Litoral-Capital.
No dia 15 de agosto, um homem, morador de Cachoeirinha, foi assaltado justamente nas proximidades deste matagal. Os entrevistados não serão identificados na reportagem. Ele conta que estava saindo do trabalho para casa, por volta das 17h30min, quando foi atacado por uma dupla de ladrões.
Um deles o derrubou, enquanto o outro ficou à espreita. Os dois roubaram a bicicleta e fugiram por uma trilha pelo mato.
— Eu estava vindo em uma velocidade rápida. Volta e meia passa alguém, mas aquele guri ficou ao lado do guard rail. Ele me empurrou, caí e me machuquei. Levantei no susto e fui em direção ao celular (que havia caído no chão), foi quando vi o segundo rapaz. Ele pegou um pedaço de madeira e começou a me ameaçar, querendo meu celular. Não entreguei, mandei mensagem para minha esposa, peguei a madeira e desci no mato atrás deles, por uma trilha que mostrava a marca dos pneus, mas perdi eles de vista e desisti. Um outro colega havia sido assaltado 20 minutos antes ali — lamentou.

O morador de Cachoeirinha registrou a ocorrência de roubo e uma ação policial recuperou a bicicleta dele. A outra vítima citada por ele, que teria sido assaltada pouco antes, no mesmo local, não teve, ainda, a mesma sorte. O homem, de 55 anos, relata prejuízo de R$ 11 mil com a ação criminosa e torce para que a polícia ainda consiga encontrar a bicicleta roubada.
— Eu ainda tentei segurar a bicicleta, mas eles foram mais fortes, mais rápidos e entraram no mato que tem aqui. Eu saí no sentido contrário, após um deles ter pego um pedaço de pau do tamanho de um cabo de vassoura. Um deles, de 16 anos anos, foi preso. O outro eu não sei, porque a polícia ainda está investigando — relatou.
De acordo com o titular da 1ª Delegacia de Polícia Regional Metropolitana, delegado Rodrigo Bozzetto, no trecho, que é próximo ao antigo pedágio, são frequentemente registrados diversos tipos de crimes, como furtos, roubos a pedestres e até assaltos a ônibus.
— Vários casos envolvem pessoas que saem dessa região. Eles (criminosos) se aproveitam da situação. Tem muitos usuários de droga por ali que cometem esses crimes, assaltando até mesmo à mão armada — apontou o delegado.
Os roubos de bicicletas na freeway haviam diminuído em 2022, segundo o chefe de Comunicação Social da Polícia Rodoviária Federal, Douglas Paveck, após reforço da fiscalização no trecho. De acordo com dados da Polícia Civil, foram cinco ocorrências registradas no ano passado, enquanto neste ano, até julho, houve apenas um registro. Porém, nas últimas duas semanas, pelo menos três casos foram registrados no trecho do km 79.
Por conta disso, o órgão voltará a reforçar o monitoramento.
— Nós iremos utilizar as câmeras de monitoramento da CCR Via Sul para monitorar esses criminosos e, o mais breve possível, conseguir prendê-los. Caso a gente não consiga (prender os suspeitos), pelo menos cessar esse tipo de situação no local — afirmou Paveck.
A CCR Via Sul, concessionária que administra a freeway, opera 42 câmeras na rodovia. O número de equipamentos no trecho em questão não foi confirmado.
O chefe da comunicação da PRF diz que a fiscalização é focada em evitar os roubos, embora o tráfego de bicicletas na rodovia seja proibido. Segundo ele, quando a polícia flagra os ciclistas, não os autua, apenas orienta que saiam da pista.
Como os ladrões agem
Conforme a polícia, os assaltos a ciclistas são cometidos, em geral, por três homens. O primeiro monitora o movimento na rodovia e alerta os demais quando avista um ciclista. Depois, os outros dois, escondidos na região, partem para cima do alvo. Um deles empurra a vítima, derrubando-a e, em alguns casos, agredindo-a, enquanto o terceiro foge com a bicicleta mato adentro.

Uma moradora de Gravataí, de 52 anos, foi vítima de uma ação do tipo em 2021. Ela conta que pedalava pela rodovia quando foi abordada por um homem, que puxou a bicicleta dela, derrubando-a no chão. Mesmo com equipamento de proteção, o impacto da queda a deixou inconsciente.
— Esfolei meus joelhos, meu braço e a costela quase faturou. Eu não morri por um detalhe, mas graças a um grupo de ciclismo que vinha logo atrás, fui socorrida e levada até o Hospital Becker, de Gravataí, inconsciente. Roubaram a minha bike e eu ainda estava pagando. Fiquei muito tempo sem praticar esporte, mas o triste disso tudo é que faz dois anos que aconteceu e no mesmo lugar diversas pessoas têm sofrido o mesmo ataque — relatou a ciclista, que disse que, apesar do roubo, voltou a pedalar na freeway.
O delegado Rodrigo Bozzetto acredita que os casos são muito mais numerosos do que os registros oficiais apontam. Isso porque, como pedalar na freeway é irregular, muitos ciclistas deixam de procurar a polícia. A mesma avaliação é feita pelo chefe de comunicação da PRF, Douglas Paveck.
— A gente sempre pede que as pessoas que, porventura, tenham situações similares a essa, entrem em contato conosco. Infelizmente, nem sempre essa ocorrência, que é registrada na Polícia Civil, chega para nós de forma ágil. Então, além de fazer o registro, é importante nos alertar a respeito dessa situação, que aí conseguimos trabalhar e dar uma resposta mais rápida para esse tipo de crime — afirmou Paveck.

PRF alerta para situação de irregularidade
Segundo o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), o tráfego de bicicletas é permitido em rodovias, desde que a circulação ocorra mais à direita na pista, no mesmo sentido dos veículos, caso não existam ciclovias, ciclofaixas ou acostamentos. Entretanto, o chefe da Comunicação Social da PRF aponta que a legislação autoriza o órgão executivo da rodovia ou a concessionária a restringirem o tráfego em algumas estradas. Na freeway, o trânsito de ciclistas sempre foi proibido e a restrição está sinalizada por placas na rodovia ao menos desde 2011, no período de administração da concessionária Triunfo Concepa.
— A freeway não é a rodovia adequada para andar de bicicleta. Nós temos uma rodovia com alta velocidade, de 110 km/h, um alto fluxo de veículos no local e de grande porte rodando. Então não é o local adequado, é um local inseguro, por isso que é proibido. No verão também nós temos a questão de que muitas vezes, o acostamento é liberado para o trânsito, aí é mais uma insegurança para os ciclistas. Por isso, a gente pede para não utilizarem — alertou Paveck.
Procurada pela reportagem de GZH, a concessionária CCR ViaSul afirmou apenas que a fiscalização do tráfego de ciclistas na rodovia é atribuição da Polícia Rodoviária Federal.