Depois de realizar na semana passada uma operação para combater um esquema de extorsão contra comerciantes do Vale do Sinos, quando cinco suspeitos foram presos, a Polícia Civil identificou 24 vítimas deste esquema criminoso. Até então, havia apenas cinco. Mas os agentes acreditam que sejam dezenas e que todas estão com medo de represálias.
Um grupo de 11 investigados estava cobrando, inicialmente, R$ 500 mensais. Os valores chegaram até R$ 1,5 mil no caso de comerciantes que atuam à noite, como bares e casas de prostituição. Mediante ameaças e violência, eles ofereciam um suposto serviço de vigilância. Esta foi uma segunda fase da investigação.
No início do ano, outros 32 comerciantes e também empresários da região e do Vale do Paranhana foram identificados após prisões de suspeitos.
A investigação é realizada pelo titular da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) de São Leopoldo, delegado Ayrton Martins Figueiredo Júnior. Ele diz que, anteriormente, outra célula da facção cobrava valores de comerciantes que atuavam durante o dia, como donos de revendas, lojas de produtos gerais ou, por exemplo, barbearias e institutos de beleza.
— O que nos chama a atenção é como diversificam, vamos dizer assim, o ramo de atuação. Se antes extorquiam revendas, lojas em geral, agora eram donos de bares noturnos e casas de entretenimento. Tudo para capitalizar o tráfico de drogas e de armas que estes grupos realizam — explica Figueiredo Júnior.
O inquérito ainda não foi concluído e o delegado diz que seguem buscas a foragidos, assim como também se tenta identificar mais vítimas. Para isso, ele disponibiliza os seguintes contatos: WhatsApp 51 - 98585 6118 e telefone 51 -3579 0424. Além disso, segue a análise de provas apreendidas, bem como pedidos judiciais de bloqueio de bens. Segundo Figueiredo Júnior, o valor bloqueado já chega a R$ 5 milhões.
Operação Timeo
No dia 18 deste mês, 125 agentes cumpriram cinco mandados de prisão preventiva, 21 de busca e apreensão, além do sequestro judicial e bloqueio de R$ 3,9 milhões em imóveis, veículos e valores depositados em oito contas bancárias. As ordens judiciais ocorreram em Novo Hamburgo, Sapiranga e Campo Bom.
Um dos presos foi detido em um sítio de luxo no bairro Lomba Grande, em Novo Hamburgo. O local tinha riacho, quadras de esportes, duas mansões, piscina e um forte esquema de segurança, incluindo um sofisticado circuito de câmeras de vigilância. No quarto da filha do investigado, a polícia encontrou até um alçapão que servia de entrada para uma espécie de bunker.
O delegado Figueiredo Júnior comprovou que as extorsões ocorriam em larga escala mediante ameaças, agressões e até mesmo estabelecimentos depredados ou incendiados. Por isso, um dos motivos também é apurar a lavagem de capitais. Todos estes fatos envolvendo esta suposta segurança imposta pelos criminosos levou a polícia a deflagrar nesta sexta a chamada "Operação Timeo", que quer dizer medo em latim.
"Tem que pagar, todas têm que pagar"
A polícia divulgou, por meio de transcrições, o teor de alguns áudios durante conversa entre os cinco foragidos. Em alguns deles, um responsável por fazer as cobranças dizia o seguinte para um dos dois líderes do esquema:
"Tem que pagar e todas têm que pagar. Pode se atirar no colo do Papa, do bispo, de quem for. Pode mandar vir na fita, pode me chamar. Pode dizer, ó, eles tão te cobrando. Se o Papa vim, o Papa vai ter que pagar por eles, entendeu? Quando tá decretado, tá decretado. Aí não tem carinho pra ninguém. Nós vamos ir aí e vamos falar com eles, se eles não quiser pagar daí, nós vamos passar a visão pros guris e os guris vão ver o que vão fazer"
Cronologia dos crimes
No dia 24 de março deste ano, o líder de outra célula que integra a mesma facção foi preso em Sapucaia do Sul, na Região Metropolitana. Ele foi, segundo a polícia, responsável por dois ataques, em Estância Velha, a vítimas que não quiseram pagar pelo suposto serviço de segurança oferecido pelos criminosos. Outros cinco suspeitos de integrar o grupo dele foram investigados e responsabilizados em inquérito policial.
Dias antes, em Taquara, havia sido preso um integrante de outra quadrilha que adotou a mesma prática no Vale do Paranhana. Nesta região já há oito presos desde o ano passado, mas também são poucas as pessoas que procuraram a polícia. Foram somente quatro nos últimos dois anos. No final de 2022, seis integrantes de organização criminosa que agiam na região extorquindo donos de empresas foram condenados a 61 anos de prisão. Ao todo, a Polícia Civil chegou ao número de 32 vítimas, pelo menos oficialmente.
A polícia prendeu no dia 18 de julho deste ano sete pessoas suspeitas de envolvimento no mesmo tipo de extorsão contra comerciantes e também moradores de condomínios residenciais do Vale do Sinos. A suspeita é de que outros integrantes da mesma facção, portanto, uma outra célula, tenham lesado vítimas em mais de R$ 2,5 milhões em oito meses. Trata-se de outra quadrilha investigada pelo delegado André Serrão.
Dos sete presos, três eram homens, com diversos antecedentes criminais, que já estavam na Penitenciária Estadual do Jacuí. Outras quatro eram mulheres, sem passagem pela polícia, mas que foram presas por suspeita de receber e transferir dinheiro do grupo criminoso. As buscas ocorreram em São Leopoldo, Novo Hamburgo e Campo Bom.