O réu Arnoir dos Santos foi condenado a seis meses de detenção por lesão corporal na manhã desta terça-feira (7), durante o primeiro tribunal do júri realizado dentro da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). O julgamento pôde ser acompanhado por alunos e professores da universidade no teatro do prédio 40 e contou com transmissão via YouTube.
A iniciativa é fruto de uma parceria entre a universidade e o Tribunal de Justiça do RS (TJ) para levar uma experiência real aos alunos de todos os semestres da Escola de Direito da instituição e, em especial, aos estudantes que acabam de ingressar no curso.
— É a primeira vez que estamos sediando um julgamento do tribunal popular, ou seja, tribunal do júri. Nas últimas décadas, sempre temos alguns julgamentos por semestre, como por exemplo de Câmaras do TJ, cíveis e criminais, das turmas do TRF ou do Tribunal Eleitoral. Mas é a primeira vez que há julgamento dos crimes dolosos contra a vida em um tribunal popular — explica Marcos Eberhardt, professor coordenador do Grupo de Prática Jurídica da Escola de Direito da PUCRS.
Além dos 500 assentos do teatro onde ocorria o júri, a universidade disponibilizou mais 300 lugares no prédio 11 da Escola de Direito, onde mais alunos assistiam à transmissão via YouTube. No teatro, os olhares atentos dos estudantes só desviavam da sessão para fazer anotações em seus blocos, cadernos ou tablets.
Para o aluno do primeiro semestre de Direito, Caetano Ramos Zorrer da Silva, 19 anos, que nunca tinha assistido a um júri, a sessão foi uma oportunidade de se conectar com a prática da profissão.
— Considero uma atividade extremamente gratificante, que nos dá uma experiência muito boa, para ter ideia de como é um júri, além de acumular conhecimento com grandes figuras que temos aqui, o que nos ajuda a nos construirmos como seres humanos — comenta.
Com a formatura prevista para a segunda metade de 2024, a aluna do sétimo semestre Maria Eduarda Luchtemberg, 21, destacou que a atividade pode ajudá-la na definição da área do Direito em que pretende atuar futuramente.
Acho que é uma atividade prática muito válida porque faz com que nos coloquemos no lugar daqueles profissionais, como juiz, advogado, promotor, ainda durante a formação.
MARIA EDUARDA LUCHTEMBERG, 21 ANOS
Estudante do 7º semestre de Direito
— Acho que é uma atividade prática muito válida porque faz com que nos coloquemos no lugar daqueles profissionais, como juiz, advogado, promotor, ainda durante a formação. Eu gosto muito da área penal, comecei a estagiar no Ministério Público em uma promotoria especializada no (Direito) criminal e agora estou em escritório aprendendo sobre o cível, então, esta é mais uma atividade que vai me ajudar a definir o que eu quero — diz a estudante.
Sobre o caso
O crime aconteceu em 18 de julho de 2019, por volta das 19h30min, na Avenida Edvaldo Pereira Paiva, em Porto Alegre. Segundo a acusação, o réu Arnoir dos Santos teria tentado matar Cristiane Miranda Canofre, agredindo-a com um objeto contundente (um pedaço de ferro ou de madeira), além de socos e pontapés. Testemunhas disseram que a mulher acabou desmaiando e que as agressões foram interrompidas pela intervenção de quem passava pelo local e presenciou os fatos.
A sessão desta terça-feira, que iniciou às 9h30min, foi presidida pela juíza de Direito Cristiane Busatto Zardo, titular da 4ª Vara do Júri de Porto Alegre. Na acusação, atuou o Promotor de Justiça Eugênio Paes Amorim e a defesa ficou a cargo dos advogados Jader Marques e Pamela Aquino.
Na primeira etapa do júri, ocorreu a fase de instruções. Duas testemunhas de acusação foram ouvidas durante a manhã. O réu não participou e, segundo o TJ, a vítima faleceu no decurso do processo. Ao fim das instruções, teve início a fase de debates, em que defesa e acusação têm direito a 1h30min para suas explanações.
O primeiro a falar foi o promotor Amorim. Em sua apresentação, ele concluiu que o crime ocorreu, mas que não poderia ser caracterizado como tentativa de homicídio, pois no seu entendimento, não houve a intenção de matar, mas sim, de lesionar. Por isso, ele pediu aos jurados como tese de acusação que o réu fosse condenado por lesão corporal e não por tentativa de feminicídio.
Após um breve recesso de 20 minutos, às 11h44min foi a vez do advogado Jader Marques apresentar a defesa. Em sua fala, ele apresentou a tese de que o julgamento tratava sobre a miséria pessoal das partes — uma vez que o acusado e a vítima são pessoas em situação de rua — e da “miséria processual” da Justiça. O advogado mostrou fotos e áudios da vítima na data da agressão, criticou a atuação da Defensoria Pública e também pediu a desclassificação do julgamento por tentativa de feminicídio.
Após uma pausa para o almoço, entre 12h40min e 14h30min, a sessão foi retomada para réplica e tréplica. Às 15h28min, a defesa terminou sua tréplica e os jurados foram para a sala secreta deliberar sobre o caso.
Decisão
Os jurados analisaram três quesitos. O primeiro quesito foi a existência ou não de um fato criminoso que causou lesões corporais à vítima, o qual eles responderam afirmativamente. O segundo quesito analisado foi se o autor do seria o acusado. Os jurados também responderam afirmativamente. E o terceiro quesito se referiu à existência da tentativa de feminicídio. Os jurados resolveram que não se tratava de tentativa de feminicídio porque o autor do fato não teve intenção de matar a vítima.
Com isso, foi retirada a competência deste julgamento do tribunal do júri, uma vez que os jurados analisam apenas os crimes dolosos contra a vida. Neste caso, conforme o Código de Processo Penal, a responsabilidade por analisar as provas e determinar a sentença ficou a cargo da juíza Cristiane Busatto Zardo.
A magistrada declarou o réu culpado por lesão corporal e o condenou a seis meses de detenção. Como Santos já havia cumprido um ano e seis meses de prisão, a juíza considerou a pena já cumprida e extinguiu o processo.