
O investigado por um desaparecimento, que escapou da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa de Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, já havia sido flagrado há quatro anos por um caso de estelionato em Santa Catarina. Daquela vez, o crime também envolvia dólares e até uma falsa abordagem da Polícia Federal. Naquele episódio, ele chegou a procurar a polícia e relatou que a esposa e o cunhado tinham sido vítimas de sequestro. Quando os agentes descobriram que se tratava de um estelionatário e decidiram prendê-lo, o homem já havia sumido da delegacia. Após a nova fuga nessa segunda-feira (9), está sendo procurado outra vez.
O caso em Florianópolis aconteceu em agosto de 2016 e foi informado à polícia pelo próprio golpista. Dizendo ser empresário gaúcho, relatou à Polícia Civil que estava sendo extorquido após os familiares terem sido sequestrados. Chegou a mostrar aos agentes as mensagens que exigiam pagamento para que os dois familiares fossem libertados. Os policiais voltaram os esforços para encontrar as vítimas. Ao longo daquele dia, no entanto, passaram a desconfiar de alguns pontos da história. Acabariam por descobrir que se tratava de um caso de estelionato.
— Apesar da desconfiança sobre a história, nossa prioridade era a integridade de quem estava sendo feito refém. Ele passou o dia aqui na delegacia. Após os dois (esposa e cunhado) serem encontrados, descobrimos que tentaram aplicar golpe em um empresário, que também cometeu crimes para ter o dinheiro de volta — recorda o delegado Anselmo Cruz, da Divisão de Roubos e Antissequestro, da Diretoria Estadual de Investigações Criminais de Santa Catarina.
O estelionatário teria se oferecido a um empresário para trocar 110 mil dólares, não declarados à Receita Federal, por reais, com promessa de pagar 20% acima do câmbio. Os encontros aconteceram em Jurerê Internacional. A história envolvia a promessa de valores obtidos por meio da Operação Lava-Jato, que na versão do golpista estavam retidos no Paraguai. Para passar confiança às vítimas, alegava ter relações com órgãos federais e dizia ser assessor de um deputado. Em um dos encontros, a esposa do golpista estava junto e o cunhado teria se passado por motorista.
Quando obteve os dólares do empresário, em Florianópolis, o golpista pediu para fazer a entrega dos reais em outro local da capital catarinense. No trajeto, forjou abordagem da Polícia Federal. Um veículo com giroflex começou a persegui-los. O empresário desconfiou e rendeu a esposa e o cunhado do golpista, que escapou em uma Mercedes com o dinheiro.
— Como o empresário desconfiou, ele abandonou a família e conseguiu fugir. Depois, no desespero, achando que a esposa e o cunhado seriam mortos, acabou tendo de procurar a polícia. Quando a situação estava clara, depois que localizamos a família, ele já havia ido embora da delegacia. A esposa e o cunhado ficaram presos — conta o delegado.
Por que não publicamos os nomes dos suspeitos?
GaúchaZH não identifica o homem e a mulher investigados por envolvimento no desaparecimento de João Victor Friederich de Oliveira, 31 anos, em Novo Hamburgo, para preservar a identidade da filha de 16 anos, que teve a internação decretada pela Justiça. A preservação do nome de adolescentes infratores é determinada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Sobre o esquema descoberto na época, conforme o delegado do Estado vizinho, os alvos eram pessoas que tinham dólares não declarados e pretendiam obter o valor em reais, como no caso do empresário de Jurerê Internacional. O fato de ele ter sido localizado outra vez com alta quantia de dinheiro faz o policial desconfiar de que o esquema tenha continuado.
— Como as vítimas são pessoas que têm dinheiro em situação irregular, não vão procurar a polícia — analisa.
Placas falsas
Mais de um ano depois de ter a prisão decretada pelo estelionato, em dezembro de 2017, o mesmo homem foi detido a bordo de um táxi, enquanto transportava placas falsas da Câmara dos Deputados e do Poder Legislativo Federal em Ijuí, no noroeste do Rio Grande do Sul. Durante a abordagem, em frente ao posto da Polícia Rodoviária Federal, apresentou documentos falsos. Os agentes acabaram descobrindo o nome verdadeiro e que ele estava foragido.
Ainda segundo a PRF, o homem transportava as placas falsas e fingia ser assessor de um deputado. O mesmo tipo de placa foi encontrada no apartamento dele em Novo Hamburgo, na semana passada. Ele ficou preso até janeiro de de 2018, quando, por conta da demora processual, teve a prisão preventiva substituída por medidas cautelares. Passou a precisar comprovar a residência a cada 15 dias e se apresentar à Justiça a cada dois meses. O processo do caso ainda está em andamento.
A fuga
A Polícia Civil está tentando compreender como o investigado escapou da delegacia de Novo Hamburgo. O preso chegou a conversar com o advogado em uma sala fechada e depois levado para o corredor. Na sequência, os policiais pretendiam ouvi-lo sobre o paradeiro de Oliveira. Ele foi algemado por uma das mãos, em uma cadeira.
— Fugiu levando a algema em uma das mãos. Não temos cela na Delegacia de Homicídios, então os presos ficam algemados em cadeiras até o término do procedimento e depois são encaminhados para a DPPA, onde tem cela. Ele conseguiu quebrar um pedaço da cadeira e fugir — descreveu o delegado Márcio Niederauer, titular da DHPP de Novo Hamburgo.
Depois de se soltar, o preso desceu do segundo para o primeiro andar e fugiu. Ainda conforme o delegado, a polícia está analisando as imagens de câmeras para entender como o homem escapou. Uma das suspeitas é de que alguém pudesse estar aguardando pelo preso do lado de fora da DP. Polícia Civil e BM fizeram buscas ao longo da madrugada. A procura segue nessa terça-feira (10).
— A gente não descarta que ele tenha tido o auxílio de alguém — disse Niederauer.
A investigação e a prisão

Na tarde de segunda-feira (9), o homem foi flagrado em um estacionamento na área central de Novo Hamburgo com dinheiro de diferentes nacionalidades, seis armas e placas de veículos, entre outros itens. Ainda foram apreendidos uma Mercedes e um Corolla.
Ele foi preso em flagrante por porte ilegal de arma de fogo, por ameaça aos policiais e por ter se apresentado com nome falso. Um homem que estava com ele foi preso por porte ilegal de arma de fogo e uso de documento falso. O homem está foragido por conta de ter escapado durante o auto de prisão em flagrante. A polícia já solicitou a prisão preventiva ao Judiciário.
A detenção aconteceu durante a investigação do desaparecimento de João Victor Friederich de Oliveira, 31 anos, em um apartamento no bairro Rio Branco. O rapaz não é mais visto desde a madrugada de sexta-feira. Ele estava no apartamento onde residem o investigado, a esposa e filha deles, uma adolescente de 16 anos, namorada de Oliveira.
Imagens de câmeras do prédio flagraram o momento em que um corpo é transportado para dentro do porta-malas de um veículo por dois homens. Um deles foi identificado como o investigado. No mesmo local, a Brigada Militar apreendeu o equivalente a R$ 2,1 milhões (sendo 388 mil em dólares) e seis armas. A origem do dinheiro e das armas também é apurada.
Em seis pontos, o caso
- Na madrugada de sexta-feira, a Brigada Militar foi chamada até um prédio na Rua Marcílio Dias, em Novo Hamburgo, após moradores ouvirem disparos de arma de fogo. Em um apartamento, os policiais encontraram armas, reais e dólares (num total de R$ 2,1 milhões).
- Uma adolescente, de 16 anos, e a mãe dela, de 35 anos, foram detidas. Havia manchas de sangue no imóvel. À polícia, a garota alegou que brigou com o namorado, João Victor Friederich de Oliveira, 31 anos, e que acabou atirando na perna dele. Disse ainda que, depois disso, ele deixou o apartamento. Como o namorado não foi localizado, a polícia passou a investigar o desaparecimento dele.
- Pelas câmeras do prédio, a polícia descobriu que dois homens armados estiveram no imóvel. As imagens mostram alguém sendo transportado pelos dois até o porta-malas de uma Mercedes e a mulher tapando a câmera. A suspeita é que fosse o corpo de Oliveira. Ela ainda limpa o chão da garagem após a saída do veículo. A adolescente foi internada e a mãe teve a prisão preventiva decretada.
- No domingo, a mesma Mercedes foi encontrada carbonizada no interior do município de Portão. A suspeita é de que o corpo de Oliveira, ainda não encontrado, tenha sido descartado em outro local.
- Na segunda-feira, a equipe da Delegacia de Homicídios prendeu o pai da adolescente em um estacionamento de Novo Hamburgo. Segundo a polícia, ele se preparava para fugir. Foram apreendidas com ele mais armas e dinheiro. Um homem, que não seria o mesmo flagrado nas câmeras com ele, também foi preso.
- Por volta das 21h40min, após conversar com o advogado, o preso conseguiu escapar da Delegacia de Homicídios. Ele estava algemado em uma cadeira no corredor e ainda não havia sido ouvido. O homem danificou a cadeira na qual estava preso e fugiu com a algema presa em uma das mãos.
Os envolvidos no caso
O desaparecido — João Victor Friederich de Oliveira, 31 anos, dono de uma empresa de consórcios, namorava a adolescente de 16 anos. Está sumido desde a sexta-feira (6). A suspeita é de que tenha sido assassinado.
A namorada — Adolescente de 16 anos que morava com os pais no apartamento. Aos policiais, disse que atirou na perna do namorado e que isso justificaria o sangue no local. Foi apreendida e está internada em uma unidade da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase).
O foragido — Pai da adolescente, é suspeito de envolvimento no sumiço de Oliveira. Foi flagrado pelas câmeras do prédio entrando no apartamento armado na sexta-feira e depois colocando um corpo em uma Mercedes. Foi preso na segunda-feira, mas fugiu da delegacia.
A mulher — Esposa do foragido, a mulher de 35 anos estava no apartamento na madrugada do sumiço de Oliveira. Foi flagrada por imagens enquanto cobria uma das câmeras da garagem com cobertor. Está presa de forma preventiva.
O comparsa — Entrou no apartamento com o pai da adolescente na madrugada do desaparecimento, também armado, e ajudou a carregar o corpo. É investigado pela polícia.
O preso — Foi detido na segunda-feira com o pai da adolescente. Eles estavam com dinheiro, armas e dois veículos apreendidos em um estacionamento. Ele foi preso por porte ilegal e por apresentar documentos falsos. Não é o mesmo comparsa identificado nas imagens.