Ainda sonolenta, uma mulher de 44 anos deixou sua casa na zona leste de Porto Alegre. Entrou no carro, afivelou o cinto e partiu para a Zona Norte. Ao chegar ao destino, conferiu o relógio: 8h10min. A pequena distração foi suficiente para ser surpreendida por dois homens armados que se aproximaram do veículo caminhando. Exigiram o automóvel, o celular e a carteira. Apavorada, a mulher nem conseguiu descrever a fisionomia dos criminosos para a polícia.
Virou estatística, como se diz. Na verdade, seria a terceira vítima de roubo de veículos na manhã de 25 de setembro. Na Capital, até o final do dia, integraria a lista com outras 18 pessoas. GaúchaZH teve acesso à relação dos assaltos: não há horário, local nem sexo de vítima como preferência. Basta ter um veículo.
O primeiro crime do dia aconteceu às 7h20min e o último, às 22h45min. Pulverizados por diversos pontos da Capital, os assaltos aconteceram com mais frequência em dois extremos: nas zonas Sul e Norte. Dos 19 veículos, apenas um era motocicleta. Entre os carros, a maioria é de modelo popular, como Celta, Uno e Ka. Na lista, também há utilitários e picapes, que custam na faixa de R$ 70 mil a R$ 100 mil.
Em relação ao perfil das vítimas, a maioria é homem e tem mais de 40 anos. Foram abordados na porta de casa ou do trabalho de forma repentina. Procuradas pela reportagem, quase todas as vítimas optaram pelo silêncio. Em um dos casos, uma das mulheres assaltadas duvidou da veracidade da identificação do repórter. Imaginava se tratar de um dos assaltantes.
— Não vou lhe passar nenhuma informação. Não sei quem tu é (sic) — disse a mulher antes de desligar o telefone.
A média de um crime a cada 75 minutos
As ocorrências registradas neste dia correspondem a um roubo de veículo a cada 75 minutos. Para o delegado Adriano Nonnenmacher, titular da Delegacia de Furto e Roubo de Veículos (DRV) do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), o número está acima da média diária, que varia entre 12 e 13 registros. O policial entende que pode ter ocorrido situação pontual devido à atuação de ladrões naquela data.
Nonnenmacher salienta que Porto Alegre já registrou média diária de 30 a 35 roubos de carros, assumindo em 2015 o patamar da cidade com maior número de registros no país para cada 100 mil habitantes.
Táticas para inibir ações de ladrões
Para o responsável pelo Comando de Policiamento da Capital (CPC), tenente-coronel André Cordova, 19 casos em um dia são preocupantes:
— Está longe de ser ideal. Mas é inferior à média histórica que tivemos em vários meses.
Diminuir a incidência de roubo de veículos passa por mudanças no trabalho policial. Na Brigada Militar, as barreiras montadas nas ruas agora ficam menos tempo no mesmo local. A alteração é estratégia para fazer com que esses bloqueios sejam mais efetivos para flagrar criminosos em veículos roubados ou furtados. Com blitze fixas em um período menor, é possível também despistar até motoristas que compartilham esse tipo de informação em grupos de WhatsApp e outras redes sociais, alertando ladrões.
— De quatro a 10 barreiras, passamos de 48 a 60 barreiras por dia — salienta o comandante.
Além disso, a corporação também recorreu a estudos que mostram a radiografia do crime, desde os locais e horários com maior incidência aos pontos onde os veículos são levados.
Na Polícia Civil, há intensificação em grandes operações com foco em quadrilhas especializadas. Em dois anos e nove meses, foram 11 ofensivas que resultaram na prisão de 550 pessoas. O trabalho focado também revelou tendências dos criminosos. Segundo Nonnenmacher, há uma prevalência nos horários dos assaltos, que ocorrem geralmente das 18h à meia-noite.
Dos 19 veículos tomados por criminosos, 13 foram recuperados – ou 68,4% do total. Ainda resta encontrar a motocicleta e cinco carros (Oroch, Ka, Siena, Duster e Cerato). Nonnenmacher considera o índice de recuperação alto e dentro da média de 60% a 70% registrada no Estado.
Para o delegado, a situação é reflexo do trabalho conjunto entre as policiais e o uso da tecnologia OCR, que permite identificar carros roubados ou furtados por meio da leitura de placas.
Entenda
A escolha de 25 de setembro por ZH se deve ao fato de neste dia, uma terça-feira, tradicionalmente ser registrado o maior número de roubo de veículos em Porto Alegre. A opção pela capital gaúcha é por que a cidade registrou mais da metade desse tipo de crime no Rio Grande do Sul. Além do roubo de veículos, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou a quantidade de veículos furtados na data (sete) e os recuperados (10).
FIQUE ATENTO
- Ao ter o carro roubado, ligue para o 190, telefone de emergência da Brigada Militar. Por meio da ligação, segundo a corporação, é disparado alerta para os batalhões de Porto Alegre que podem começar as buscas ao criminosos.
- Em seguida, procure a delegacia mais próxima. Casos de roubo ou furto de veículo não podem ser registrados pela internet.
- Cuidado com golpes. Após os assaltos, muitas vítimas acabam compartilhando informações pessoais – desde o modelo e placa do veículo até telefone de contato – e são procuradas por golpistas. Em muitos casos, essas pessoas se passam como autores do assalto, mas, na verdade, não estão com o veículo.
- Não negocie com criminosos. Em muitos casos, as vítimas acabam entregando valores para os ladrões para ter o carro de volta. A orientação é não dar dinheiro para o “resgate do carro” e informar a BM e a Polícia Civil.