O comerciante de 36 anos preso por divulgar no WhatsApp a realização de uma blitz da Brigada Militar em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, deixou a prisão na tarde desta segunda-feira (14), após passar aproximadamente 18 horas na carceragem da Delegacia de Polícia de Pronto-Atendimento (DPPA) do município.
A liberdade provisória concedida pela Justiça foi a resposta a um pedido feito pelo advogado Jorge Tatim, responsável pela defesa do comerciante que não teve a identidade divulgada pela BM. Em outro recurso, o advogado pede que o caso seja arquivado por considerar a prisão ilegal:
— Essa conduta que está sendo atribuída não está prevista em lei. Então, a gente argumentou que a prisão é ilegal, porque não existe crime, então não pode existir punição para essa conduta — afirmou Tatim na manhã desta terça-feira (15).
Para reforçar o argumento, o advogado diz que existe um projeto de lei ainda em discussão no Congresso cuja proposta é proibir o uso de redes sociais e de outros aplicativos para alertar motoristas sobre a ocorrência de blitz de trânsito:
— O fato de existir um projeto de lei já demonstra que isso ainda não é um crime. O que está se fazendo é interpretar um artigo (de lei) que foi criado em uma época que nem existia telefone celular para dizer que é a mesma coisa que avisar de blitz por WhatsApp.
O comerciante foi preso em flagrante pelo crime previsto no artigo 165 do Código Penal, que estabelece que é crime atentar contra a segurança ou o funcionamento de serviço de água, luz, força ou calor, ou qualquer outro de utilidade pública. A pena prevista, em caso de condenação, é de um a cinco anos de reclusão e multa.
Sem divulgar o nome para não expô-lo, o advogado conta que o cliente estava trabalhando em sua carrocinha de cachorro-quente, no bairro São Jorge, quando foi abordado pelos policiais militares. Ele teria admitido aos PMs o erro, mas teria ficado surpreso com a prisão. O homem de 36 anos é casado, tem dois filhos e não tem antecedentes criminais.
— (A prisão) foi desnecessária e desproporcional. Desnecessária pelo contexto, ele estava trabalhando e foi preso como se tivesse cometido algo muito grave. E foi desproporcional por ter sido encaminhado até a delegacia por causa de um WhatsApp. É um absurdo — avaliou Tatim.
A Brigada Militar apreendeu o celular do comerciante como prova. No aparelho, encontrou uma fotografia com a frase "novamente barreira" e uma mensagem dizia "avisarei quando irem embora", ambas encaminhadas a pelo WhatsApp. A publicação chegou até um policial militar, que repassou para colegas em serviço, resultando na prisão na noite de domingo de (13).
Na tarde desta segunda-feira (14), o juiz liberou provisoriamente o comerciante sem cobrar pagamento de fiança ou estipular outra condição. O inquérito segue para análise do Ministério Público.
Caso inusitado
Em janeiro, uma jovem de 21 anos foi presa após divulgar a foto de uma blitz em um grupo no WhatsApp em Boa Vista, capital do Estado de Roraima. No Rio Grande do Sul, esse tipo de caso é pouco conhecido. A delegada Marjani Simch, responsável por autuar o comerciante de Novo Hamburgo, disse que foi a primeira vez que teve que lidar com uma situação dessas.
— Eu vi que em outros Estados o entendimento era pra autuar em flagrante. Por isso, optei por fazer o mesmo — disse a delegada.
O comandante da Brigada Militar de Novo Hamburgo, tenente-coronel Marcio Uberti Moreira, em entrevista ao Programa Gaúcha Atualidade, disse que as blitze são feitas regularmente na cidade para tentar reduzir os índices de criminalidade, principalmente os roubos de veículos.
Ele lembrou que, na noite de domingo, quando o comerciante foi detido, os policiais perceberam que após o início da blitz o movimento diminuiu significativamente. O comandante disse, ainda, que é hipocrisia divulgar os locais de blitze.
— Enquanto a sociedade for hipócrita nesse sentido de que desde que eu tenha vantagem não é crime, fica complicado. Nós tivemos, graças a essas barreiras, cerca de 20 prisões e quase 10 quilos de drogas apreendidos — disse o policial.