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A defesa dos soldados Samuel Curtinaz de Freitas e Ricardo Pedroso de Almeida, presos desde dezembro pela morte de dois homens, na zona norte de Porto Alegre, pediu mais uma vez que os dois sejam soltos. Os PMs respondem por duplo homicídio qualificado, por dificultarem a defesa das vítimas, porte ilegal de arma de uso restrito, receptação e fraude processual. O pedido foi encaminhado à 1ª Vara do Júri na quarta-feira (9), mesmo dia em que foi realizada a audiência para serem ouvidas testemunhas.
Juliano Andrade Ferreira e Cristiano Severo Lima, ambos de 30 anos, foram mortos a tiros na esquina da Avenida Sertório com a Farrapos, no bairro Navegantes, na madrugada de 18 de agosto do ano passado. Os policiais, que estavam em horário de folga, alegam que teriam sido vítimas de uma tentativa de assalto e teriam reagido, atirando nos dois.
A Polícia Civil concluiu que as mortes não ocorreram em confronto e que os policiais alteraram a cena do crime, modificando a posição dos veículos e enxertando armas no carro das vítimas. O Ministério Público denunciou a dupla, que responde a processo pelo crime — a Justiça aceitou a acusação e ambos viraram réus. Em inquérito na Brigada Militar, os dois também foram indiciados.
Responsável pela defesa dos policiais militares, o advogado Ricardo Cantergi argumenta que as imagens coletadas por câmeras de segurança na saída da boate onde estavam os réus naquela madrugada coincidem com a versão apresentada por eles. As câmeras mostram que às 5h33min os policias deixam a festa e às 5h37min saem do estacionamento do local, em um Corolla blindado. Uma outra câmera indica que a sequência de disparos contra o Golf, veículo onde estavam Ferreira e Lima, teria ocorrido às 5h40min.
— A imagem deles saindo da festa é muito tranquila. Estão brincando, rindo. Não é a imagem de alguém disposto a matar. Foram apenas três minutos entre o momento em que deixam a festa e o ocorrido. Isso demonstra que os meus clientes não perseguiram ninguém — afirma.
26 perfurações no carro das vítimas
Os policiais alegam que a dupla no Golf teria tentado assaltá-los. Em depoimento, relataram que um dos ocupantes do veículo teria gritado "encosta, encosta" e depois teria atirado na direção do Corolla. A perícia localizou 26 perfurações no Golf e apenas três marcas no veículo dos policiais, o que para a acusação indica que foram duas execuções.
— Alguém atirou contra a polícia e a polícia revidou. A má sorte dos dois é que tentaram levar o carro de PMs preparados. O que nos aborrece é que parece que os policiais eram criminosos e que as vítimas não fizeram absolutamente nada — sustenta Cantergi.
Na primeira audiência, foram ouvidas as testemunhas de acusação. A próxima ocorrerá em 1º de julho.
Vítimas não teriam usado armas, afirma MP
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Segundo a denúncia do MP, os policiais interceptaram as vítimas, que estavam no Golf, fazendo com que eles parassem e descessem do veículo. Depois, atiraram contra os dois. Cada policial utilizou duas armas para efetuar os disparos. A acusação aponta que o laudo da perícia mostrou que não havia resíduos nas mãos de Ferreira e Lima, que indicasse que eles também atiraram.
Alguém atirou contra a polícia e a polícia revidou. A má sorte dos dois é que tentaram levar o carro de PMs preparados. O que nos aborrece é que parece que os policiais eram criminosos e que as vítimas não fizeram absolutamente nada.
RICARDO CANTERGI
Advogado dos réus
"As vítimas não efetuaram nenhum disparo de arma de fogo, ao passo que os denunciados efetuaram mais de 30 disparos, fato extremamente descomunal", descreve a promotora Lúcia Helena Callegari. A acusação afirma ainda que os policiais teriam atirado contra o próprio carro, para forjar um confronto, e que teriam enxertado duas armas encontradas no Golf. Segundo a promotora, as imagens das câmeras nas proximidades de onde ocorreram as mortes demonstram que não houve tentativa de assalto e sim duas execuções.
As vítimas não efetuaram nenhum disparo de arma de fogo, ao passo que os denunciados efetuaram mais de 30 disparos, fato extremamente descomunal.
TRECHO DA DENÚNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Defesa contratou perícia particular
A defesa contratou um perito para preparar parecer técnico que contesta o laudo da perícia, que indicou que Ferreira e Lima não tinham vestígios de pólvora nas mãos. O advogado argumenta que o exame tem possibilidade de apresentar falso resultado.
Além das mortes, no processo os policiais também são acusados de terem alterado a cena do crime. O advogado sustenta que o veículo dos PMs só foi retirado do local porque havia neblina e risco de que um acidente ocorresse. Ele diz ainda que a medida só teria sido tomada depois que foi informado que não seria realizada perícia. Cantergi afirma ainda que os soldados seguiram trabalhando normalmente até serem presos, em dezembro, e que isso demonstra que ambos não apresentam risco às testemunhas.
— Eles foram presos quatro meses e um dia depois, se quisessem ameaçar testemunha já teriam feito. E nunca fizeram.
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