Mais de uma hora antes do início oficial do 3° Simpósio de Espiritualidade e Saúde – Reconciliação e Paz, as cadeiras do Salão de Atos da PUCRS já começavam a ser ocupadas por um público que lotaria o lugar, curioso sobre os ensinamentos do monge beneditino alemão Anselm Grün, a grande atração do evento promovido na noite desta segunda-feira pela Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre e pela Editora Vozes.
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Grün é um dos escritores mais populares da atualidade quando o assunto envolve espiritualidade e relações humanas, com 300 livros escritos e mais de 15 milhões de exemplares vendidos no mundo. Na Capital, o monge apontou regras para que se consiga uma reconciliação pessoal e social verdadeira. Entre elas, a aceitação de nossos lados sombrios, que compreendem sentimentos opostos como fé e não fé, disciplina e indisciplina, amor e ódio. Grün, que frequentemente visita o Brasil e elogiou a cordialidade do povo brasileiro, ressaltou que a reconciliação pessoal, do indivíduo com ele mesmo, é o primeiro caminho para um mundo mais pacífico e compreensível.
– Quem está dividido por dentro se divide dos outros. Reconciliar-se consigo e com a própria realidade, isso exige despir-se de ilusões e pensamentos equivocados sobre si mesmo – disse.
Fazer as pazes com os próprios traumas também foi outra recomendação do religioso alemão, que, neste ponto, citou descasos com a infância e situações de violência e as feridas espirituais que precisam ser tratadas e abraçadas por nós:
– Todos nós experimentamos feridas na nossa infância. É importante olhá-las, mesmo que tenhamos sido vítimas, mas não devemos permanecer vítimas.
O monge reforçou a importância do perdão no caminho para a paz e as reconciliações e também apontou passos a serem seguidos. O primeiro é reconhecer o que nos causou alguma dor.
– É uma purificação interior. É um ato de libertação. Quando não perdoo, continuo sob o poder, a influência daquela pessoal – disse o religioso, antes de pregar também o amor a quem nos ofende.
O seminário começou com um ato ecumênico que reuniu representantes de diferentes religiões em um abraço simbólico pela paz e seguiu com a palestra do ex-ministro da Justiça e do Supremo Tribunal Federal (STF) Nelson Jobim, que falou brevemente sobre a tendência de atribuir a culpa aos outros e não assumir as próprias responsabilidades, sobre ódios da atualidade, que têm, em grande parte, aproveitamento político.
– Que tenhamos divergências, mas que elas não se tornem ódio. É mais fácil dizer nós e eles do que dizer todos nós – disse.
Muitos na plateia eram estudiosos de temas ligados à espiritualidade, autoridades religiosas, como o arcebispo emérito de Porto Alegre, Dom Dadeus Grings, e acadêmicos de áreas como Pedagogia, Teologia, Psicologia e Educação. Entre as expectativas, a oportunidade de ver Grün frente a frente.
– O tema paz e reconciliação faz parte do dia a dia dos franciscanos. Não basta ter o termo paz, o processo da paz tem de passar pela reconciliação – comentou o frei da Ordem dos Frades Menores, da província do Rio Grande do Sul, Luis Fernando Tavares.
A dona de casa Melane Pereira de Moraes, 60 anos, participa de grupos de estudos sobre espiritualidade e procurou, no seminário, um complemento ao que pesquisa há tempos.
– Vim buscar um reforço para a caminhada que já faço – disse.
O evento, idealizado pelo médico cardiologista Fernando Lucchese, terminou com uma bênção do monge beneditino, relembrando o momento de tensão política do país e a necessidade de uma postura mais conciliadora da sociedade.
- Nenhum de nós está sempre reconciliado e sempre em paz, mas devemos nos reconciliar com nossa história e exercitar a conciliação e perceber que isso contribui para que esse sentimento exista na sociedade - ressaltou o alemão.
Para Fernando Lucchese, a plateia lotada, mesmo com um tempo chuvoso na Capital, demonstrou que o tema escolhido há oito meses para o seminário estava alinhado com os anseios da comunidade.
– Nós percebemos que a nossa sociedade estava vivendo um momento de conflito progressivo, mas não suspeitávamos que o evento culminaria num dia como hoje (segunda-feira) – comentou o médico, referindo-se à defesa de Dilma Rousseff no Senado e ao início das atividades da Força Nacional em Porto Alegre, dois fatos importantes, um na política nacional, e outro, na segurança pública do Estado