Três semanas atrás, a servidora pública Camila Melo, 30 anos, percebeu uma reação alérgica na pele e entrou em pânico. Deixou sua residência em Canoas e correu para a emergência do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre. Ela tinha medo de estar infectada pelo zika vírus. Para seu alívio, os médicos constataram que não era nada demais.
- Em uma situação normal, eu nunca ficaria preocupada com uma alergia - reconhece a paciente.
Cresce preocupação de gestantes sobre microcefalia e zika
O que levou Camila a se assustar foi a circunstância de estar grávida de um casal de gêmeos - Vítor e Helena - justamente em um momento conturbado para gerar uma criança. Na primavera, quando ela ainda curtia a fase inicial da gestação, explodiu no noticiário a informação de que um surto de zika registrado em vários Estados brasileiros, principalmente no Nordeste, estava associado ao nascimento de bebês com microcefalia, uma grave má-formação cerebral que causa danos mentais, visuais e auditivos. O ano fechou com cerca de 3 mil casos suspeitos no país.
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Ainda que até o momento não haja registro da circulação do vírus no Estado, a revelação teve impacto poderoso sobre gestantes gaúchas como Camila. Receosas do que possa acontecer caso sejam picadas pelo Aedes aegypti, que transmite o vírus quando está infectado, elas estão enfrentando uma gravidez marcada por tensão, nervosismo, sobressaltos, precauções redobradas e cancelamento de planos. Viraram peritas no comportamento do mosquito e nas formas de evitá-lo.
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Atualmente na 21ª semana de gestação, Camila aplica repelente no corpo de duas em duas horas, combate focos de água parada e se protege com um inseticida de tomada. No momento, está em Capão da Canoa, mas convenceu o marido a encurtar a permanência na praia, por receio de focos do inseto.
- Estou sempre tensa e atenta. Evito sair à rua ao entardecer, quando tem mais mosquito. Não é uma recomendação da médica, é mais da minha neura. Não uso roupa comprida, por causa do calor, mas fico preocupada, culpada com isso - conta.
A bióloga Grasiele Adamy, 32 anos, moradora de Passo Fundo, também tinha planos de ir à praia, para Florianópolis (SC), mas foi dissuadida pelo sogros, ambos ginecologistas. O receio era de que a capital catarinense, além de focos do Aedes, estivesse repleta de turistas de outras regiões do país, onde o zika circula.
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Grasiele, na 29ª semana de gestação de uma menina que vai se chamar Lívia, optou por passar cinco dias na altitude de Gramado, onde imaginava estar mais segura. Uma noite, durante um espetáculo de Natal ao redor do Lago Jacobina Rita Bier, descobriu-se dentro de um pesadelo: mosquitos por todos os lados e uma plateia formada por gente dos mais variados sotaques.
- Meu marido falou: "Nossa, aqui deve estar cheio de turista". Aí, me assustou. Eu estava com calça, camisa de manga comprida e meia. As únicas partes expostas eram o rosto e as mãos, cobertas de repelente, mas ele ficou me abanando o tempo todo. Esse foi o dia de maior preocupação. É muito tenso ser grávida neste momento, muito preocupante - afirma Grasiele.
A bióloga relata que a preocupação provocou alteração nos seus hábitos. Além de andar sempre com calça ou vestido longo e de ter providenciado um estoque de repelente (espalhados pela casa, pelo carro, na bolsa), ela deixou de ir com o marido à propriedade rural da família. Na verdade, nunca mais pôs os pés em uma praça. Evita qualquer lugar com zonas de grama:
- Não há pesquisa que certifique não existir risco, então a gente fica preocupada. Estou tentando não ler sobre o assunto, porque o nervosismo só aumenta.
Saúde
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Itamar Melo - de Capão da Canoa
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