

Em uma sexta-feira no início deste ano, numa casa de pedra calcária em Manhattan, "coisas relacionadas ao câncer, como o linfedema (falência do sistema linfático em determinada região)", eram o assunto da conversa, contou Sherry Kreek, que atualmente se submete a uma quimioterapia para tratar um câncer de mama.
- Nós estávamos falando sobre coisas bastante pessoais. Outras mulheres estavam ouvindo. Todo mundo conhece alguém - afirmou Sherry.
A conversa não estava acontecendo na sala de espera de algum oncologista, ou durante um almoço, mas no Sharon Dorram Color at Sally Hershberger, um aconchegante salão de beleza com seis cadeiras, onde Sherry, de 62 anos, é a gerente.
Três mulheres com cabelos supercurtos e que nunca tinham se visto até aquele momento haviam ido ao salão de Dorram, cuja lista de clientes inclui Christie Brinkley e Linda Evangelista, para tingir os cabelos pela primeira vez desde que eles voltaram a crescer depois do tratamento contra o câncer. Elas não estavam tímidas ao falar sobre o novo cabelo e sobre o que fariam com ele, sobre o quanto gostavam de suas perucas ou, menos ainda, sobre a doença que compartilhavam.
Há uma década, as mulheres que vinham ver Dorram, que na época trabalhava com John Frieda, depois da quimioterapia ou da radioterapia chegavam de maneira furtiva. Elas tiravam a peruca no banheiro ou agendavam horários no começo do dia, para não dividir o salão com clientes "saudáveis".
- Você se sente vulnerável. Você não quer entrar em uma sala com mulheres cheias de cabelo dizendo "eu gostei quando você fez isso da última vez". Dá vontade de mandar calarem a boca - afirmou Sherry, que conheceu Dorram no salão de John Frieda quando voltou a pintar o cabelo depois de sua primeira sessão de quimioterapia em 2003.
Agora, para muitas mulheres que perderam o cabelo durante o tratamento, pintá-los é fortalecedor - e fazer isso em uma sessão aberta e onde todas conversam é ainda melhor.
- Elas se sentem bem novamente - afirmou Alexis Antonellis, colorista que trabalha no salão de Oscar Blandi e que frequentemente atende clientes que querem pintar o cabelo após a quimioterapia. - Elas querem voltar a ser como eram. Ficam tão empolgadas ao se sentarem em uma cadeira e recuperarem sua vida. É muito legal. Você precisa ver o sorriso delas.
Mesmo Kreek, que usa uma incrível peruca loira até a altura dos ombros porque seu cabelo ainda não cresceu o bastante para ser pintado, se tornou menos defensiva:
- Eu costumava pedir para que eles lavassem minha peruca na minha cabeça. Agora, eu simplesmente a entrego.
Ela planeja pintar seu cabelo a tempo para as férias em Palm Beach, na Flórida.
- Eu sempre fui loira, desde criança. Nem sempre foi natural, mas esse cabelo acinzentado não tem a ver comigo - enfatiza.
É de se esperar que pacientes com câncer desconfiem de processos químicos, especialmente daqueles que já foram suspeitos de causar danos à saúde, como é o caso da tintura para cabelo. A Agência Internacional de Pesquisa sobre Câncer, parte da Organização Mundial da Saúde, disse que não há evidências da relação com essas substâncias e o câncer.
James Speyer, diretor médico do Instituto do Câncer do Centro Médico Langone da Universidade de Nova York, afirmou que encoraja as mulheres a pintarem o cabelo, caso isso as faça se sentirem melhor.
- A aparência é uma parte muito importante para qualquer mulher, e não há nada mais importante para ajudá-las a superar este período - afirma Speyer.
Permissão para inovar no salão
Amy Katz, de 48 anos, de Westport, Connecticut, cujo câncer de mama foi diagnosticado em 2008, notou que seu cabelo estava crescendo mais grisalho após o tratamento. A primeira pessoa para quem ela ligou foi sua oncologista.
- A gente fica pisando em ovos, então eu perguntei se eu podia pintar meu cabelo. Ele falou: "você pode pintar da cor que quiser".
John Barrett, que tem um famoso salão com Bergdorf Goodman, afirmou que o cabelo normalmente cresce mais enrolado e um pouquinho mais cinza.
- De forma geral, quando o cabelo volta a crescer, ele cresce bem diferente, mas depois de um ano ele volta à textura normal. Eu costumo recomendar que as pessoas esperem um pouco antes de escolherem a cor, mas sugiro uma cor mais clara - aconselha.
Kate King, atriz que também teve câncer, pintou o cabelo de uma tonalidade mais loira após a quimioterapia.
- Isso me deu forças para explorar esse aspecto da minha personalidade. De todas as mudanças que ocorreram, meu cabelo foi a que fez mais diferença - compara.
A atriz lembra que tinha tanto medo de perder o cabelo e estava muito assustada com o que via no espelho.
- Percebi que aquilo era uma benção. A última coisa que eu esperava era que o câncer me desse um novo visual - sintetiza.
O que ajuda
:: O uso de lenços e perucas ajuda a compor o visual. No mercado, existem também próteses capilares que permitem tomar banho, nadar e dormir sem precisar retirá-las.
:: A utilização de esmaltes é permitida (exceto para pacientes com câncer de mama), desde que a cutícula não seja retirada. Tinturas de cabelo também estão liberadas, desde que não tenham amônia.
:: A prática de caminhadas e exercícios específicos ajudam a manter o tônus muscular.
:: É importante admitir que o tratamento é uma fase difícil na qual a ajuda de amigos e familiares é importante. Apoie-se neles.
:: Fique atenta aos seus sentimentos e busque atividades que tragam prazer. Não se concentre apenas no tratamento médico.
:: É normal sentir revolta, tristeza e medo, mas, se essas sensações persistirem com intensidade por mais de 15 dias, converse com seu médico.