Na saleta envidraçada, decorada com homenagens caprichosamente emolduradas, João Dib, 88 anos, assistia à sessão da Câmara Municipal de Porto Alegre pela TV quando recebeu a reportagem de GaúchaZH. Após abrir a porta do apartamento, cumprimentar o fotógrafo e beijar a mão da repórter, justificou:
— Passei a metade da minha vida na Câmara, me sinto ligado às coisas que estão acontecendo na cidade.
Vereador por 10 legislaturas, além de prefeito na reta final do regime militar, Dib deixou a política em 2012. Resolveu não concorrer mais por causa da idade e da crescente dificuldade de locomoção — em razão do tiro que levou durante um assalto, em 1968, utiliza cadeira de rodas há mais de 20 anos.
O político continua indo à sede do Legislativo semanalmente, às quartas-feiras, para almoçar com a bancada do PP. É requisitado para debater algum assunto da cidade com frequência — volta e meia, vê na TV Câmara alguém falando seu nome —, e muita gente o procura para relatar problemas, como se ainda tivesse mandato.
— Se eu posso fazer, eu faço — diz Dib, tirando do bolso esquerdo da camisa branca da marca Lacoste um montinho com pelo menos uma dúzia de cartões de visita. — Nestes dias, liguei para o Sabino (Elizandro Sabino, secretário municipal de Infraestrutura e Mobilidade Urbana) para falar de dois buracos aqui perto. Mandaram arrumar.
Natural de Vacaria, Dib segue morando em Porto Alegre, no bairro Auxiliadora. Pela manhã, tem o hábito de ler a Zero Hora, o Correio do Povo e o Jornal do Comércio. Também dedica-se a fazer um pouco de ginástica, em casa mesmo. Sobre a mesa da sala de jantar — cuja bagunça indigna sua mulher —, há um amontoado de papeis e algumas bananas, fruta que come diariamente por ser fonte de potássio.
O ex-vereador também acompanha as rádios da cidade. De todas as pautas importantes do município atualmente, preocupa-se mais com o funcionalismo. Critica os projetos enviados pelo Executivo à Câmara neste ano, como o que reduz benefícios e gratificações dos servidores públicos.
— Acho que ele (o prefeito Nelson Marchezan) tem de ter mais tranquilidade. Tem de ouvir os servidores municipais — opina. — Os servidores ficam, o prefeito troca.
Dib recita seu lema, repetido incontáveis vezes na Câmara: "simplifica, meu filho, simplifica". Ele acredita que quando entrou no Legislativo, em 1971, tudo funcionava muito melhor com apenas 21 vereadores — hoje, são 36. Condena a quantidade de leis e de novos projetos.
— O vereador tem de entender que não é eleito para fazer mais leis. Tem de fiscalizar o cumprimento da lei, é fiscal em primeiro lugar. Em 41 anos de Câmara, fiz meia dúzia de projetos.
Entre as condecorações penduradas nas paredes da saleta, há a transcrição do discurso que fez na Câmara Municipal ao assumir seu mandato, ainda como suplente, em 1971: "Peço a Deus que me dê sabedoria e descortino, para que eu possa melhor conhecer os problemas desta cidade; peço a Deus que me dê força para lutar por suas soluções".
Acredita que a prece deu certo.
— Assumi dizendo que o problema de Porto Alegre era um somatório de pequenos problemas e prometi que não geraria nenhum a mais. Tudo é simplicidade, não consigo entender nada diferente.