Trinta anos após o fim da ditadura militar, generais e guerrilheiros continuam disputando espaço nas ruas de Porto Alegre. A nova trincheira foi aberta na Câmara Municipal, onde tramitam dois projetos de lei parecidos, mas de sentidos contrários.
O primeiro deles veio no começo do ano, pelas mãos do vereador Engenheiro Comassetto (PT), com a proposta de mudar o nome de logradouros da Capital que homenageiam figuras do regime militar. Dias depois, chegou a resposta, da vereadora Mônica Leal (PP): um projeto que proíbe batizar equipamentos públicos com o nome de "pessoas condenadas por subversão à ordem pública ou de pessoas que participaram de organização terrorista como o Comando de Libertação Nacional e a Vanguarda Popular Revolucionária".
O embate reedita a discussão que, no ano passado, levou à mudança do nome da Avenida Castelo Branco, agora chamada de Avenida da Legalidade e da Democracia. Castelo Branco foi o primeiro ditador do regime implantado em 1964, depois do golpe que apeou João Goulart da presidência.
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Para Mônica Leal, iniciativas como a de Comassetto estão inseridas em um esforço mais amplo, espalhado pelo país, de "apagar" fatos da memória nacional. Ela fez um levantamento que revela a existência, em diferentes Estados brasileiros, de projetos legislativos para rebatizar praças e ruas que lembram nomes da ditadura.
- Não se pode apagar a história do Brasil. Gostem ou não, essas pessoas fizeram parte da nossa história. O meu projeto é um contraponto ao projeto do vereador Comassetto, que visa fazer terra arrasada. Penso que, se é para tirar nomes de ruas e praças, tem de ser para os dois lados, por uma questão de coerência. Tem de se estender a todas as pessoas que participaram - afirma a vereadora.
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Entre os logradouros e equipamentos que seriam afetados por seu projeto, a vereadora cita o Memorial Luiz Carlos Prestes, a Praça Che Guevara (na Restinga) e a Rua Capitão Carlos Lamarca (na Agronomia).
O projeto de Comassetto, por sua vez, remete ao relatório final da Comissão Nacional da Verdade, que apurou violações ao direitos humanos praticadas durante o período iniciado em 1964. Pela proposta, devem ser mudados os nomes dos espaços públicos que fazem referência a qualquer um dos 377 nomes citados no relatório por práticas de tortura física, psicológica e sexual. Segundo o vereador, o levantamento dos logradouros que seriam atingidos ainda está sendo feito, mas ele menciona o monumento a Castelo Branco (no Parque Moinhos de Vento) e escola, posto de saúde e rua batizadas com o nome de Arthur da Costa e Silva, outro presidente da ditadura.
- Como é um projeto controverso, quero que seja discutido. É importante que a cidade possa participar. A essência da nossa proposta é retirar os nomes porque a homenagem a essas pessoas foi feita em um período em que não havia contraditório. Não significa apagar a história. Não se proíbe que, daqui a para a frente, se façam homenagens, porque a sociedade democrática é livre para propor. A diferença do meu projeto para o da vereadora Mônica é que o dela diz respeito a pessoas que foram homenageadas pelas comunidades, com respaldo de um princípio democrático diferente - afirma Comassetto.
Os dois projetos estão em análise nas comissões da Câmara, ainda sem previsão de data para votação.
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