Se os projetos dos vereadores Carlos Comassetto (PT) e Mônica Leal (PP) que proíbem homenagens a personagens relacionados ao regime militar e a opositores fossem aprovados hoje, pelo menos nove denominações de bens públicos seriam eliminadas das ruas de Porto Alegre: do lado petista, duas escolas, um loteamento e uma unidade básica de saúde chamadas Artur da Costa e Silva e uma escultura em homenagem ao ex-presidente Castelo Branco (no Parcão), e do progressista, a Praça Che Guevara (Restinga), a Rua Capitão Carlos Lamarca (Agronomia), o Memorial Luiz Carlos Prestes (Praia de Belas) e a Rua Carlos Marighella (Cascata).
Confira as entrevistas:
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Os assessores do vereador Comassetto têm pela frente uma pesquisa extensa porque o projeto do petista proíbe referências em bens públicos a qualquer um dos 377 nomes listados pela Comissão Nacional da Verdade (CNV) por crimes como tortura. Eles têm encontrado obstáculos na pesquisa, como os homônimos. É o caso da Travessa Alfredo Magalhães, no bairro Cavalhada, que pode ser tanto o capitão de mar e guerra que serviu no Centro de Informações da Marinha (Cenimar) entre 1970 e 1971 e participou de torturas quanto um antigo político português. Há ainda uma rua chamada Presidente Costa e Silva, mas a única que ZH encontrou não fica em Porto Alegre, e sim em Viamão. Já a ideia de batizar um bairro da Capital de Costa e Silva seria natimorta, caso o projeto do vereador seja aprovado.
Ex-comandante-geral da Brigada Militar e atualmente juiz do Tribunal de Justiça Militar do Estado, o coronel Paulo Roberto Mendes considera os projetos "um assunto ultrapassado". Para ele, é preciso discutir problemas mais importantes, como a corrupção e a criminalidade. Na opinião dele, fomentar "assuntos enterrados" como esse poderia incentivar cada novo governo a fazer uma revisão histórica a seu modo.
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- Assim, vamos ter que revirar a história a cada momento. Desde a vinda de Pedro Álvares Cabral, quem sabe, vamos ter que rever. Por que não discutem um projeto contra a corrupção, por exemplo? - argumentou.
Primeiro coordenador da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e ex-vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), hoje aposentado do serviço público e trabalhando com assessoria e palestras na área jurídica, Gilson Langaro Dipp é cauteloso quanto às ideias de sumir das ruas com os nomes de envolvidos na ditadura militar. Gaúcho de Passo Fundo, Dipp defende um pouco de ponderação. Segundo ele, a CNV foi ao limite de suas investigações porque "as condições políticas não eram favoráveis". Também citou os militares:
- Temos uma nova geração nas Forças Armadas, mas há um sentimento de proteção à instituição.
Em relação aos projetos que pipocam pelo Brasil, tanto em câmaras municipais quanto em assembleias legislativas, Dipp considera precipitado, e até de difícil aprovação, propor a eliminação geral das denominações ligadas a orquestrantes da ditadura, baseada, por exemplo, na lista de implicados nas apurações da CNV - como é o caso do texto de autoria do vereador Comassetto. Um formato melhor seria debater cada caso separadamente, conforme Dipp, com todas as justificativas pelas quais o nome em questão deve ser retirado da placa de uma rua, da fachada de uma escola ou outro espaço público:
- Os projetos têm que estar bem fundamentados. Se forem analisados caso a caso, com todas as justificativas, é um avanço para a democracia, com o cunho educativo desejado para as futuras gerações.
Dipp considera diferente a proposta da vereadora do PP. Para ele, os opositores da ditadura foram processados, condenados, não beneficiados pela Anistia ou mesmo mortos. Dipp questiona a inclusão de nomes como Che Guevara, que não têm relação com o Brasil e são admirados em vários países da América Latina.
- Me parece que essa segunda proposta é uma forma de rebater publicamente a outra. É um contraponto, mas feito de forma exagerada - analisou.