Familiares de vítimas da covid-19 participaram de uma audiência pública nesta segunda-feira (18) para colaborar com os trabalhos da CPI da Covid. Um representante de cada região do País foi convocado para ser porta-voz das mais de 600 mil vítimas fatais da doença no Brasil e das pessoas que perderam entes queridos durante a pandemia.
Das mais de 60 sessões já realizadas pela CPI, essa pode ser considerada uma das mais marcantes. Com relatos semelhantes, mas perfis diferentes, as vítimas diretas ou indiretas da covid-19 falaram da dor e das consequências da perda de familiares e amigos, além de explanarem um sentimento de descaso e de falta de empatia por parte de gestores públicos. Muitos também reclamaram sobre a demora para iniciar uma campanha de vacinação no País e da falta de vacinas registrada no início do ano.
Mayra Pires Lima, enfermeira de Manaus (AM), perdeu a irmã, vítima da doença, e assumiu a guarda dos quatro sobrinhos. Ela relatou a situação vivida pela sua família durante o colapso da saúde pública na cidade no início do ano, com falta de oxigênio e lotação das UTIs.
— Nós tivemos várias situações no Amazonas que poderiam ter sido resolvidas com um pouco de bondade e de bom senso dos gestores. A cidade inteira de Manaus ficou doente, a cidade virou um deserto. 99% das pessoas se contaminaram — disse Mayra, relatando a demora em conseguir um leito de UTI para sua irmã.
Com 19 anos, Giovanna Gomes Mendes da Silva perdeu a mãe e o pai durante a pandemia e agora precisa cuidar da irmã, de 10 anos de idade.
— Quando meus pais faleceram, a gente perdeu as pessoas que mais amava. Eu precisava da minha irmã e minha irmã precisava de mim, se apoiou em mim. Eu decidi que eu precisava ficar com a guarda dela. Hoje a gente tem mais de 600 mil vítimas e mais de 120 mil órfãos. O governo tem responsabilidade por essas vidas — relatou.
Kátia Shirlene Castilho dos Santos também perdeu pai e mãe pela doença e contou sobre a internação da mãe, beneficiária da Prevent Senior, que recebeu o chamado "kit covid", com medicamentos sem eficácia comprovada para a doença. A operadora de saúde é um dos alvos da CPI por conta do tratamento dado aos pacientes.
— Essas histórias foram encerradas por negligência e nós queremos justiça. O sangue dessas 600 mil vítimas escorre na mão de cada um que subestimou esse vírus — afirmou Kátia, que também fez um apelo para que as pessoas tomem a vacina contra a covid-19.
Do Rio Grande do Sul, Rosane Brandão contou sobre a morte do marido, João Alberto dos Santos Pedroso. Conhecido como Bola, ele era servidor da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel) e registrou os primeiros sintomas no dia 11 de abril. Rosane relatou que a última vez que viu o companheiro foi no dia 16 do mesmo mês, quando foi hospitalizado — Bola morreu 10 dias depois.
— O Bola teve sua a sua vida abreviada por uma política genocida. Nós esperamos uma vacina que chegou tardiamente e a conta-gotas para toda a população. A vacina não chegou para o Bola e não chegou para milhares de vítimas. Saúde pública depende de decisões políticas e ações políticas — cobrou Rosane.
Marcio Antônio do Nascimento Silva contou à CPI da Covid sobre a perda do filho para a covid-19, em abril de 2020, com 25 anos. O taxista participou da recolocação de cruzes em uma praia no Rio de Janeiro no ano passado – ato simbólico para lembrar as vítimas da pandemia - que foram arrancadas por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro.
— Era muita dor, muita tristeza. Eu falava: “meu filho morreu e você fica gritando e daí?”. O meu ato ali foi um ato de resistência — disse Silva sobre o embate que teve com o grupo, no dia da manifestação.
O jornalista Arquivaldo Bites Leão Leite relatou aos senadores que perdeu seis parentes para a covid-19, além de amigos e de outras pessoas próximas. Ele também contraiu o vírus há três meses e teve um AVC, convivendo hoje com sequelas após a doença.
— Cada amigo, cada parente que a gente perde, é um sofrimento. A morte do meu irmão caçula foi um marco — relatou Arquivaldo, afirmando que seu irmão morreu antes de receber a vacina.