A morte da vereadora Marielle Franco (PSOL) levou o governo a rever a abordagem que faria do primeiro mês da intervenção federal no Rio de Janeiro, nesta sexta-feira (16). Em vez da apresentação de um balanço – evento até então visto como pauta positiva nos corredores do Planalto –, encontros a portas fechadas foram realizados para definir estratégias frente à preocupação com o apoio popular à ação, criticada desde o seu anúncio por especialistas e pela oposição.
A intenção é blindar a atuação das Forças Armadas em solo carioca e evitar que o crime contra a parlamentar e seu motorista, Anderson Pedro Gomes, vire uma bandeira contra a presença militar e, consequentemente, contra o governo – que já enfrenta baixos níveis de popularidade.
Na primeira fala sobre o caso, o presidente Michel Temer aproveitou a menção à luta social de Marielle, lembrando de seu trabalho “pela paz e a tranquilidade”, para exaltar a presença militar no combate ao crime no Estado.
— É por isso que nós decretamos a intervenção, para acabar com esse banditismo desenfreado — disse.
A mesma linha foi seguida por um dos integrantes da tropa de choque de Temer, o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun. Ele citou avanços no Rio de Janeiro no último mês, destacando a apreensão de 40 fuzis e munição suficiente para “25 mil tiros”.
Ao ser questionado sobre as suspeitas de que o crime seria uma retaliação de milícias, incomodadas com o aparato militar em comunidades cariocas, considerou que a hipótese não está descartada. Para Marun, a morte da vereadora é uma evidência de que o governo “está no caminho certo”.
— Se esse assassinato tinha o objetivo de nos assustar ou nos tirar do rumo, esses bandidos se enganaram — afirmou.
A oposição questiona a efetividade da ação e o momento em que ela foi adotada pelo governo federal, pouco antes da derrota iminente na votação da reforma da Previdência e em ano de eleições. O líder da oposição na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), também reclama da falta de dados sobre a atuação no Rio.
— Não há planejamento e não há recursos. Não sabemos qual é a avaliação ou o diagnóstico dessa operação.
O parlamentar acusa o Planalto de ter realizado um ato eleitoreiro. O interventor federal, general Braga Netto, ainda não apresentou um plano de ação definindo as fases do trabalho dos agentes, que tem encerramento previsto para o final de 2018.
Destacado para acompanhar as investigações in loco, o titular do novo Ministério da Segurança Pública, Raul Jungmann, desembarcou nesta quinta-feira (15) no Rio de Janeiro com a missão de evitar o desgaste do governo e dos membros da operação. Recentemente, o ministro admitiu falta de dinheiro para grandes investimentos em ações contra a segurança.
Após se reunir com autoridades no Rio de Janeiro, ele comentou a hipótese de repassar a investigação do caso para a Polícia Federal, que havia sido levantada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Jungmann afirmou que o caso ficará a cargo da Polícia Civil do Estado, mas que as demais corporações irão cooperar com os trabalhos.
— A Polícia Federal irá participar no que for demandada. Vamos utilizar a inteligência de todas as polícias — pontuou, garantindo que não faltarão recursos para o trabalho de apuração.
O caso também será acompanhado pela Câmara dos Deputados. O presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), aceitou a solicitação de parlamentares do PSOL, correligionários de Marielle Franco, e determinou a instalação de uma Comissão para avaliar as apurações.
"Máfia das quentinhas"
Abalados pelos casos de corrupção, que levaram à cadeia o ex-governador Sergio Cabral, além de integrantes da Assembleia Legislativa e do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ), a população do Rio de Janeiro assistiu nos últimos dias à primeira operação contra crimes na esfera pública após a intervenção federal.
Uma operação coordenada pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual desarticulou um grupo criminoso que atuava na administração dos presídios do Rio de Janeiro. A Operação Pão Nosso desbaratou a chamada “máfia das quentinhas”, com a prisão de integrantes das polícias Militar e Civil do Estado.
O grupo é acusado de desviar R$ 44 milhões de recursos públicos no superfaturamento de pães que eram encaminhados para presídios.