Em 2016, enquanto articulava o impeachment de Dilma Rousseff, o então vice-presidente Michel Temer ventilava na imprensa a intenção de governar com uma equipe de "notáveis". Um ano depois, o agora presidente e sua entourage estão sob cerco da Lava-Jato. Dos três principais assessores de Temer, um foi preso pela Polícia Federal (PF) nesta terça-feira (23) pela manhã, outro foi filmado recebendo R$ 500 mil em propina e o terceiro confessou ter recebido R$ 1 milhão em caixa 2.
Tratam-se, respectivamente, de Tadeu Filippelli, Rocha Loures e José Yunes. Todos despachavam no terceiro andar do Palácio do Planalto, a poucos passos do gabinete presidencial. Embora não tivesse o status e a exposição de um ministro, o trio atendia o varejo das relações políticas, empresariais e jurídicas do governo. Sandro Mabel (PMDB-GO), que atuava junto ao grupo – embora jamais tivesse sido nomeado oficialmente –, deixou de dar expediente no Planalto em março, ciente de que seria alvejado pela delações da Odebrecht.
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A deterioração, contudo, não se restringe aos auxiliares de segundo escalão. Em um governo em que o próprio presidente é investigado por corrupção, organização criminosa e obstrução à Justiça, dois dos quatro ministros com sala no Planalto respondem a inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF): Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral). Na Esplanada há mais seis ministros na mesma situação. Outros três perderam os cargos por suspeita de irregularidades. Veja, a seguir, as relações tóxicas de Michel Temer no poder e o que pesa sobre sua equipe:
Os assessores encrencados
Rocha Loures (PMDB-PR)
À mercê de um pedido de prisão preventiva a ser julgado pelo STF, o deputado Rocha Loures é quem mais pode comprometer a situação de Michel Temer. Indicado pelo presidente para atender interesses do grupo JBS no governo, Loures foi filmado recebendo R$ 500 mil em propina. Ele devolveu a mala com o dinheiro à PF. Deputado em segundo mandato, Loures trabalhou com Temer de 2011 a 2017. Ganhou a confiança do presidente ao atuar recebendo políticos e empresários, anotando pedidos e encaminhando pendências. Em 2014, recebeu do chefe, então vice-presidente, doação oficial de R$ 200 mil a sua campanha a deputado. Loures ficou na suplência e voltou ao Planalto, onde despachava diariamente com Temer. Com a posse de Osmar Serraglio no Ministério da Justiça, assumiu o mandato de deputado em 8 de março, um dia após a fatídica conversa do presidente com Joesley Batista.
Tadeu Filippelli (PMDB-DF)
Presidente do PMDB-DF e articulador político nato, Filippelli é um dos escudeiros de Temer na interlocução com parlamentares e empresários. Reforçou a relação com o presidente em 2015, em momento de fragilidade do governo Dilma Rousseff, quando Temer assumiu a articulação política do Planalto. Sem mandato em função da derrota na eleição de 2014, quando fracassou a tentativa de se reeleger vice-governador do Distrito Federal na chapa do petista Agnelo Queiroz, Filippelli ganhou um cargo no palácio. Após o impeachment, Filippelli tornou-se assessor especial do presidente, cargo do qual foi exonerado depois de ser preso nesta terça-feira. Ele é um dos alvos da Operação Panatenaico, que apura fraude e desvio de dinheiro na reforma do estádio Mané Garrincha, com base na delação da Andrade Gutierrez. Suspeito de corrupção e lavagem de dinheiro, teria pedido e recebido propina do consórcio responsável pela obra.
José Yunes
Amigo pessoal e confidente de Michel Temer há mais de 50 anos, José Yunes chegou a ser cotado para ocupar um ministério com gabinete no Palácio do Planalto. Ao fim da montagem do governo, foi nomeado assessor especial da Presidência. Ficou apenas três meses no cargo. Pediu demissão em dezembro, após o ex-diretor da Odebrecht Cláudio Mello Filho afirmar ter usado o escritório do advogado para entregar R$ 1 milhão ao grupo de Temer no PMDB. Em fevereiro, o próprio Yunes admitiria à PF ter recebido o dinheiro, segundo ele, a pedido do ministro Eliseu Padilha e destinado às campanhas do partido. Yunes e Temer se conheceram nos anos 1960, colegas na faculdade de Direito do Largo São Francisco, em São Paulo. O advogado foi deputado junto com Temer, em 1988, e pouco antes de ganhar assento no Planalto presidia o diretório paulistano do PMDB. Embora tenha se afastado do cotidiano da política, manteve o hábito de dar conselhos e ajudar na concepção de estratégias políticas a Temer, com quem costumava jantar toda semana em restaurantes sofisticados de São Paulo.
Sandro Mabel (PMDB-GO)
Mais um assessor a ocupar sala no terceiro andar do Planalto, Sandro Mabel fazia parte, junto com Rocha Loures e Tadeu Filippelli, do grupo que ajudava nas negociações do governo com o Congresso. Jamais, contudo, foi nomeado oficialmente para o cargo. Nos bastidores, era chamado de "antena" do presidente na Câmara, onde exerceu quatro mandatos. Deixou o cargo de assessor especial da Presidência em março, após surgirem rumores de que seria citado nas delações da Odebrecht. Em abril, a Procuradoria-Geral da República remeteu petição para que ele fosse investigado na Justiça Federal de Goiás. Segundo delatores da empreiteira, ele teria recebido R$ 10 milhões para ajudar a Odebrecht e a Andrade Gutierrez a vencer a licitação da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, em Rondônia. Também próximo ao ex-deputado Eduardo Cunha, Mabel já havia sido citado no escândalo do mensalão, mas teve o processo de cassação derrubado em plenário. Á época, ele era acusado de oferecer R$ 30 mil por mês e R$ 1 milhão no fim do ano para que a então deputada Raquel Teixeira (PSDB-GO) mudasse de partido.
Os ministros
Eliseu Padilha (PMDB-RS)
Ministro da Casa Civil, é um dos nomes de maior confiança de Temer, próximo do presidente desde a década de 1990, quando se conheceram na Câmara. No governo Fernando Henrique, chegou ao Ministério dos Transportes por articulação de Temer. O mesmo ocorreu quando assumiu a Secretaria de Aviação Civil na gestão Dilma Rousseff. Articulador no impeachment, comanda a Casa Civil há um ano. Da lista de Fachin, responde a dois inquéritos no STF derivados da delação da Odebrecht, por suspeita de receber repasses ilegais da empreiteira.
Moreira Franco (PMDB-RJ)
Conselheiro de Temer e responsável pelo programa de concessões do governo, foi nomeado ministro da Secretaria-Geral da Presidência em fevereiro. O presidente recriou a pasta e garantiu foro privilegiado do amigo, que em abril passou a ser investigado no STF a partir da delação da Odebrecht. Moreira foi assessor especial de Fernando Henrique e ministro no governo Dilma por indicação de Temer. Nos período de baixa política, assumiu a Fundação Ulysses Guimarães, braço de estudos do PMDB, que era presidido por Temer. É sogro do presidente da Câmara, Rodrigo Mais (DEM-RJ)
Os caídos
Romero Jucá (PMDB-RR)
Atual líder do governo no Senado, durou apenas 11 dias à frente do Ministério do Planejamento. Foi demitido depois de ser gravado pelo ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado. Na conversa, realizada antes da votação do impeachment na Câmara, Jucá afirmou que era preciso "estancar a sangria" da Lava-Jato e defendeu um acordo para tirar Dilma Rousseff da Presidência, garantindo a sobrevivência política dos demais investigados. Como tem mandato de senador, continua como um dos principais conselheiros de Temer.
Geddel Vieira Lima (PMDB-BA)
Amigo de Temer e ex-colega de Câmara, era ministro da Secretaria de Governo, responsável pela articulação com o Congresso. Perdeu o cargo em novembro, depois de ter pressionado o então ministro da Cultura, Marcelo Calero, para que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) liberasse a construção de um edifício em Salvador – Geddel é proprietário de uma unidade no prédio. O caso também resultou na saída de Calero do governo. Geddel é alvo de mais de uma investigação na Lava-Jato.
Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN)
Aliado de longa data de Temer, com quem foi deputado federal, o ex-presidente da Câmara tornou-se ministro do Turismo no governo Dilma Rousseff por indicação do então vice-presidente. Entregou o cargo antes do impeachment e reassumiu a função após a queda da petista. Pediu demissão em junho do ano passado, ao ser citado na delação de Sérgio Machado, que afirmou ter pago R$ 1,55 milhão em propina ao peemedebista. Alvo de investigações na Lava-Jato, o peemedebista afastou-se de Brasília.
Assessores que restaram
Nara de Deus
Chefe de gabinete do presidente, Nara de Deus assessora Temer há 20 anos. A relação começou em 1997, quando ele presidiu a Câmara pela primeira vez. Discreta e eficiente, ficou na Câmara até 2011, indo com Temer para a Vice-Presidência. Com o impeachment de Dilma Rousseff, assumiu a chefia do gabinete mais importante do país.
Márcio Freitas
Jornalista, é secretário de Comunicação Social da Presidência. Faz a interlocução com jornalistas e responde pelas verbas de publicidade do governo. Antes, foi assessor de imprensa de Michel Temer por mais de uma década. Mineiro, é um dos mais fieis auxiliares do presidente. Foi investigado pela Comissão de Ética da Presidência por receber R$ 240 mil da Fundação Ulysses Guimarães com recursos do fundo partidário.
Gastão Toledo
Integrante de turma de amigos de Temer do meio jurídico paulista, é tributarista, com doutorado em Direito pela PUC-SP, onde o presidente lecionou. Nomeado como assessor especial da Presidência, recebeu de Temer a responsabilidade de coordenar, no âmbito do Planalto, as discussões da reforma tributária.
Gustavo Rocha
Atual chefe da Secretaria de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Gustavo Rocha é o principal articulador do Planalto junto ao STF e à Procuradoria-Geral da República. Também trabalha como advogado informal do Planalto. Ex-advogado de Eduardo Cunha, já representou Marcela Temer em litígio com a imprensa por causa da publicação de conteúdo hackeado do celular da primeira-dama.