Um dia após ser cassado, o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) voltou a trocar farpas com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Em entrevista coletiva na madrugada desta terça, Cunha já havia reclamado da diferença de tratamento em relação às denúncias que envolvem o colega de partido, que respondeu que "quem planta vento, colhe tempestade".
– Tem uma denúncia contra o presidente do Senado Federal há três anos e seis meses e não acontece nada – disse Cunha ainda na madrugada, ao afirmar que a denúncia contra ele foi aceita de maneira mais célere do que o normal pelo STF.
Cunha é réu em dois processos no Supremo e é alvo de investigação em outras sete frentes. Já Renan não é réu, mas é investigado em 12 inquéritos na Suprema Corte. Apesar de serem correligionários, eles fazem parte de alas diferentes dentro do PMDB.
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Ao ser questionado na tarde desta terça-feira sobre as declarações de Cunha, Renan brincou, citando verso da música Cálice, de Chico Buarque.
– Eu não quero de forma nenhuma falar sobre isso (cassação de Cunha), mas quem planta vento, colhe tempestade, isso é uma lei da natureza (...) Não sou especialista em Cunha, não gostaria nem de falar sobre isso. Afasta de mim esse cálice – disse.
Diante da resposta de Renan, Cunha divulgou, em sua página no Facebook, nota oficial reforçando os seus argumentos.
– Com relação à diferença de tratamento entre mim e o presidente do Senado (...), ressalto que na ação penal número 982 do Supremo Tribunal Federal, decorrente da denúncia aceita baseada apenas na palavra de delatores sobre sondas da Petrobras, os mesmos delatores, nas suas delações, acusam como beneficiários das supostas vantagens indevidas montando a US$ 6 milhões os senadores Renan Calheiros, Jader Barbalho, Delcídio do Amaral e Silas Rondeau. Entretanto, a ação penal que deveria ser indivisível, segundo o Código Penal, foi aberta apenas contra mim – diz o texto.
– No mais, com todo desejo de sucesso ao presidente do Senado no comando da Casa, e acreditando na sua inocência, espero que os ventos que nele chegam através de mais de uma dezena de delatores e inquéritos no STF, incluindo Sérgio Machado, não se transformem em tempestade. E que ele consiga manter o cálice afastado dele – conclui Cunha.
Futuro do Congresso
Em entrevista, Renan Calheiros afirmou que a agenda do Congresso vai melhorar com o afastamento de Cunha e a gestão do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Ele está otimista em relação às mudanças aprovadas nesta terça-feira, pela Comissão e Constituição e Justiça do Senado (CCJ), a respeito da cláusula de desempenho e fim das coligações.
– Com o Rodrigo Maia vamos ter condições de que essa reforma possa ser aprovada (também) na Câmara.
Para ele, a política é "a primeira das reformas" e deve ter prioridade na pauta de votação. Os senadores discutirão a matéria no plenário da Casa ainda nesta quarta-feira, e a expectativa de Renan é aprovar o texto em poucos dias. Já em relação à reforma da Previdência, o presidente do Senado não tem pressa. O governo tem sido pressionado pelo PSDB para que a reforma seja apreciada antes das eleições municipais, em outubro.
– Não acredito que a discussão (da reforma da Previdência) seja sobre a data, se será antes ou depois da eleição, acho que o governo está precisando definir um modelo de reforma consistente. É importante fazer a reforma, vamos nos dedicar, mas é errático defender a reforma como saída para todos os problemas econômicos. Tem que ter regra de transição e respeitar os direitos adquiridos", alegou.
Na pauta desta terça, Renan quer colocar em votação o projeto da securitização de ativos, que permite à União, Estados e municípios venderem ao mercado créditos que têm a receber dos contribuintes. Ele também quer colocar em análise um projeto de enfrentamento ao tráfico de pessoas, além de iniciar a discussão do projeto da reforma política.
* Zero Hora, com Estadão Conteúdo