A Eldorado Celulose, empresa do grupo J&F, que também é dono da JBS, pagou cerca de R$ 33 milhões em contratos de consultoria na área de energia para empresas ligadas a Lúcio Bolonha Funaro, que é apontado como operador de propinas do deputado Eduardo Cunha. A reportagem teve acesso a detalhes dos pagamentos. Eles foram feitos em parcelas mensais, ao longo do ano de 2013, para três empresas: Serra da Carioca Comercializadora de Energia, Araguaia Comercializadora de Energia e Viscaya Holding. O primeiro pagamento ocorreu em dezembro de 2012.
A Eldorado, por meio de nota, declarou estar investigando possíveis irregularidades. "Após processo de busca e apreensão realizado em 1º de julho de 2016, a Eldorado contratou o escritório de advocacia Veirano Advogados e a empresa de investigação Ernst & Young para apuração das alegações relacionadas ao processo de financiamento com FI-FGTS. Os trabalhos estão em andamento", diz.
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A apreensão mencionada pela Eldorado fez parte da Operação Sépsis, uma derivada da Operação Lava-Jato, a mesma em que Funaro foi preso – ele está detido em Brasília há quase dois meses. Sua ligação com Cunha foi apontada pela Procuradoria Geral da República (PGR).
Funaro foi acusado pelo ex-vice presidente da Caixa, Fábio Cleto, de ter montado um esquema para pagamentos de propinas para liberação de empréstimos do FI-FGTS, o fundo que usa recursos do FGTS para investir em projetos de infraestrutura. O esquema teria envolvimento do próprio Cunha. Entre as empresas citadas por Cleto, que teriam participado do esquema, está a Eldorado, que recebeu, em dezembro de 2012, R$ 940 milhões do FI-FGTS. Nessa mesma época, começaram os pagamentos de consultoria para Funaro, que nega as acusações feitas por Cleto.
Naquele 1º de julho, além da prisão de Funaro e das apreensões na Eldorado, a casa de Joesley Batista, presidente do conselho de administração da JBS e diretor-presidente da J&F, também foi alvo de buscas. Em nota enviada ao Estado há cerca de duas semanas, para uma outra reportagem, a J&F confirmou que Funaro havia prestado três serviços a empresas do grupo: consultoria no processo de solução de impasse societário com a família Bertin; comissionamento pela intermediação da venda do grupo Big Frango à JBS; e a compra de gado de empresas de Funaro, nas mesmas condições comerciais dos demais fornecedores do grupo.
A lista não incluiu serviços à Eldorado, nem consultoria em energia. Consultorias nessa área, segundo especialistas do setor ouvidos pela reportagem, costumam ser mais baratas.
– Um consultor top na área de energia receberia um décimo desse valor – disse um dos especialistas, que preferiu se manter no anonimato.
Das três empresas que receberam pagamentos da Eldorado, a Viscaya é conhecida no mercado e está registrada em nome de Funaro. As duas outras eram comercializadoras que estão em nome de Neiva Bolonha Funaro. Em tese, poderiam ter vendido energia para a Eldorado. Ocorre que nenhuma delas tinha autorização para operar na época.
O advogado de Funaro, Daniel Gerber, confirma que o cliente recebeu, da Eldorado, os R$ 33 milhões, mas informou ser em uma operação societária. "A consultoria foi no sentido de harmonizar os interesses de duas partes que estavam vinculadas a uma relação comercial de, aproximadamente, R$ 40 bilhões", disse, por e-mail.
E defendeu o valor pago a Funaro: "Por tal motivo, e pelo sucesso em tal atividade, os valores recebidos – vale destacar que as empresas em conflito, quando estruturaram o negócio no qual Lúcio foi intervir, haviam gasto R$ 400 milhões, aproximadamente, em consultoria de bancos estrangeiros. Desta maneira, a parcela de Lúcio por evitar um desastre entre as partes é absolutamente adequada ao volume financeiro da operação".
A assessoria de imprensa da Eldorado, ainda por meio de nota, declarou que "reafirma seu compromisso de atuação transparente, reitera que todas as suas atividades são realizadas de acordo com a legislação em vigor e permanece à disposição dos órgãos públicos para quaisquer esclarecimentos".
*Estadão Conteúdo