Para policiais militares que passam o dia enfrentando criminosos e acumulando dilemas pessoais, chega um momento em que é preciso pausar, desabafar e refletir.
Essa constatação óbvia embasou um projeto que vem proporcionando atendimentos psicológicos para o efetivo do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM), em Caxias do Sul. O serviço inédito e gratuito é prestado por acadêmicos do último ano do curso de Psicologia do Centro Universitário da Serra Gaúcha (FSG), do grupo Cruzeiro do Sul Educacional. A novidade surgiu de uma demanda constatada há tempos e estimulada pelo tenente-coronel Jorge Emerson Ribas, comandante do 12º BPM.
— Era uma carência. Tu vê o policial estressado, cansado. Nós precisamos estar bem para prestar um bom serviço — justifica o oficial.
São vários os motivos que levaram ao convênio com a FSG. Os policiais estão na rua lidando com situações tensas, mas também carregam questões que afetam qualquer pessoa como problemas familiares e financeiros. O dia a dia é carregado de tensão e, ao mesmo tempo, a sociedade exige que o PM mantenha-se firme.
O trabalho surge numa hora delicada para quem é agente de segurança no Brasil. Na última pesquisa do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, foi apontado que o suicídio entre esses servidores tem causado muito mais mortes do que confrontos com bandidos. No ano passado, 104 policiais militares e civis tiraram a própria vida, aumento de 42,5% em relação aos 73 casos comunicados em 2017. A proposta da FSG e do 12º BPM não é lidar com casos extremos, que exigem tratamento, mas sim se antecipar a esses problemas e promover um amparo que não existia em Caxias.
— A rotina é pesada e há muito tempo já sentíamos a necessidade de cuidar da saúde mental do pessoal. O bom é o que trabalho foi bem aceito no grupo — comenta Ribas.
Coordenados pela professora Joice Cadore Sonego, os formandos vão sempre na segunda-feira até o 12º BPM para fazer a escuta da tropa, em acolhimento individual e em grupo. Os atendimentos são agendados por meio das técnicas de enfermagem do batalhão.
"Não temos acompanhamento e tudo vai se somando"
Em nota divulgada pela assessoria de comunicação, a FSG salienta que diversos estudos científicos destacam a importância de os profissionais da psicologia estarem atentos à saúde mental dos policiais militares por causa do estresse, da ansiedade, da depressão e do transtorno do estresse pós-traumático, entre outras situações que podem gerar afastamento do trabalho ou levar a comportamentos suicidas. Em Caxias, a equipe tenta compreender como é a vivência dos servidores, especialmente por meio de grupos, para promover a saúde e a prevenção.
O 12º BPM diz que cinco PMs precisaram se afastar das atividades por problemas de saúde mental neste ano, mas por questões pessoais e sem relação direta com o trabalho. Conforme Ribas, a Brigada Militar (BM) mantém um serviço de atendimento psiquiátrico em Porto Alegre para os casos graves. Os pacientes são avaliados pelo setor biopsicossocial da corporação, que emite os pareceres geralmente com pedido de afastamento e transferência.
— Esse atendimento em Caxias é de suma importância e se vê que o comando está valorizando o policial que anda bem desassistido. Nós não temos acompanhamento e tudo vai se somando, chegando ao ponto de que vai acabar externando no serviço — ressalta Julio Francisco Haito, presidente da regional caxiense da Associação Beneficente Antônio Mendes Filho dos Servidores de Nível Médio da BM.