Durante 60 anos, onde quer que o agricultor Ivo Domingos fosse, a mulher Terezinha logo iria atrás. Foi assim que a família que o casal constituiu no interior de Garibaldi se acostumou a acompanhar a relação de muita cumplicidade entre os dois. Mas o filho único, Gilberto Domingos, 59 anos, só não esperava que seria assim até o último dia de vida. No último fim de semana, Ivo e Teresinha faleceram com um intervalo de 40 horas, após internação em quartos separados no Hospital Tacchini, em Bento Gonçalves.
A perda provocou não apenas dor, mas também incredulidade e a sensação de que os octogenários – o homem tinha 82 e a mulher 83 – não aceitariam seguir a vida separados.
Uma semana após a morte dos pais, Gilberto e a esposa Cândida, 58, com as filhas Aline, 34, Daniela, 28, e Jéssica, 23, ainda tentam absorver o que aconteceu e seguir a vida no pacato bairro Garibaldina, onde os idosos viviam em uma casa no mesmo terreno e compartilhavam a rotina com os mais novos. Ivo havia sido internado no Tacchini com diagnósticos de pneumonia e edema pulmonar no dia 24 de agosto, com quadro que a família sabia ser grave e era preparada pelos médicos para o pior. No último dia 14, foi a vez de Terezinha ir para o mesmo hospital, com feridas provocadas pela diabetes. Ivo faleceu na manhã do dia 16, sexta-feira. Na madrugada de domingo, foi a vez de Terezinha partir de forma ainda mais repentina, pois seu quadro sequer era considerado tão grave.
– Eu estava no cemitério fazendo o enterro do pai, sábado, quando o cuidador me ligou dizendo que a mãe estava mal. Ainda a vi bem quando cheguei, tomamos cafés juntos, trocamos beijos e não contei nada sobre o pai. Contaria quando ela voltasse pra casa. Mas no início da madrugada, voltaram a ligar dizendo que ela havia piorado. E quando cheguei, ela já tinha morrido – conta Gilberto.
Por ser filho único, Gilberto, que é motorista aposentado, comenta que sempre coube a ele estar junto para ajudar os pais, fosse nos parreirais ou em casa. E assim como o filho nunca os perdia de vista, o casal não vivia um sem o outro. Durante as seis décadas de convívio, não ficavam distantes por mais de dois dias, e isso só ocorria nas ocasiões em que Ivo ia pescar com os amigos.
– O pai sempre dependeu muito da minha mãe. Ela tinha que estar sempre grudada nele e a gente brincava que ele não faria nada sem ela. No fim da vida, passavam os dias juntos na sala, ele assistindo TV e ela lendo o jornal. Não podíamos imaginar que, quando morresse, ele a levaria embora também. Acho que foi isso que aconteceu – crê.
Cândida Domingos também acredita que a morte quase simultânea dos sogros não foi apenas coincidência:
– Eles passavam todo o tempo juntos, muitas vezes só os dois em casa. Eu penso que, conforme ele via que a esposa estava sofrendo (Terezinha sofria de demência há cinco anos) e não conseguia aceitar isso, em algum momento eles tiveram uma conversa sobre um não seguir sem o outro.
A ideia da partida combinada é uma espécie de conforto para a família, que tenta se reorganizar sem os nonnos. No feriado da última terça-feira, Gilberto assou o primeiro churrasco sem ter os pais para comer junto, como era costume aos domingos. À frente da casa, ele olha para o pessegueiro que o pai não o deixava podar e sabe que agora será responsabilidade dele. Aline, a neta mais velha, mora no Chile e lamenta que os dois filhos pequenos não terão o convívio com os bisavós. Mas para o resto de suas vidas, os Domingos sabem que têm uma linda história de amor para contar.