
Os 21 anos de espera castigaram as esperanças, mas não foram capazes de extingui-las da vida da aposentada Zeli Rodrigues Loch, 64 anos. Ela e a família nunca desistiram de procurar por Deloir Firmino Rodrigues, irmão de Zeli que estava desaparecido desde 1995.
– Não saber onde ele estava era uma carga que não saía de cima – desabafa ela, apontando para os próprios ombros.
Mas a agonia, enfim, foi cessada na última semana, com a ajuda de três moradoras da cidade de Matinhos, região litorânea do Paraná. Foram elas que se interessaram pela história de um pacato morador de rua que vivia há anos embaixo de uma ponte das redondezas e, depois de algumas tentativas, conseguiram descobrir seu nome completo. Com esta informação em mãos, encontraram uma postagem num site de busca de pessoas desaparecidas e fizeram contato com Maribel Chimello, filha de Zeli e sobrinha de Deloir. Ela o marido, Gilmar Chimello, foram até o Paraná na última quarta-feira.
– Eu desci lá embaixo (da ponte) e ele me conheceu na hora, me disse: "olha quem tá aí, o Gilmar" – comentou o familiar do desaparecido.
O homem sumiu quando tinha 36 anos, deixando esposa e três filhos pequenos, no bairro Santa Fé. Zeli conta que o irmão trabalhava em gráfica, mas começou a apresentar sintomas de esquizofrenia e chegou a ser internado na Clínica Professor Paulo Guedes. Ele ficou apenas duas semanas por lá e, poucos dias depois de sair, foi embora de Caxias do Sul. A família registrou ocorrência na polícia, procurou ajuda de outros órgãos, mas não teve mais notícias dele desde então. Hoje, Deloir não sabe dizer por que foi embora e acaba oscilando entre momentos de lucidez e de fantasia enquanto fala. Quando perguntado sobre como viveu estes 21 anos longe de casa, ele lembra da solidão.
Zeli diz que nunca perdeu as esperanças em encontrar o irmão porque sabia que ele não era dependente químico. Quando fiou cara a cara com ele novamente, na última quarta, quase não o reconheceu por baixo da barba e da touca.
– Reconheci os olhos e o nariz. Quando ele tirou a touca, eu avancei nele. Na hora, lembrei da minha mãe (que faleceu há 10 anos, antes de poder reencontrar o filho), e pensei: "nós conseguimos" – revela Zeli emocionada.
Assim que chegou na residência da irmã, no bairro São José, Deloir ganhou banho demorado, cama quentinha e refeições caprichadas. O recém-chegado morador divide o tempo livre entre receber os que querem reencontrá-lo depois de tanto tempo (além de Zeli, ele tem outros sete irmãos vivos e três filhos), e a leitura, hobby que manteve enquanto vivia na rua. Agora a família quer providenciar novos documentos a ele e garantir um futuro tranquilo, prolongando o final feliz desta história.
– Fico pensando nas pessoas que ajudaram ele (no Paraná). Está cheio de mendigo no meu portão, eu ajudo, mas jamais abri a porta de casa para eles, nunca tive esta humildade. Estas pessoas acolheram ele e quiseram ajudar. Que lição elas me deram! – agradece Zeli.