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A prova de que o Natal é mágico encontra-se em fatos singelos, como quando uma barba por fazer é capaz de transformar a vida de um homem. Os fios brancos que cresciam no rosto desde os 35 anos renderam a Claudiomiro da Silva, hoje com 55, o convite para ser Papai Noel em Farroupilha, onde mora há mais de 40 anos. A aceitação da comunidade ao interpretar o personagem ainda viria a incentivá-lo a levar o cuidado com as crianças para o campo profissional.
Da Silva foi por 15 anos gerente de obras em uma multinacional da construção civil. Viajava seguidamente a trabalho e, no retorno de uma das viagens, com a barba crescida, fez o idealizador de uma trupe de Natal encontrar o Papai Noel que procurava.
Criada em 2013 pela família de Edson Paese, a Trupe do Papai Noel Kirê Cosmaker já planejava aumentar a representatividade das suas atuações ao incluir um bom velhinho negro ao grupo.
— Desde 2018 pensamos na ideia de diversidade e inclusão. Até então só tínhamos referência de Papai Noel branco, então o Claudiomiro, que é amigo da nossa família, apareceu com a barba por fazer, branca e natural. Foi escolhido na hora — contou Paese.
Com as vestimentas inspiradas em São Nicolau, o Papai Noel negro de Farroupilha fez sua estreia em 2018 e foi uma unanimidade entre os farroupilhenses, que voltaram a ter Da Silva no personagem em 2019 e 2022, após o fim das restrições impostas pela pandemia.
— Ele tem carisma e jeito com as crianças e, nessas ações, elas te comovem na sua inocência e pureza. Então, ele viu a oportunidade de fazer algo a mais por elas sendo conselheiro tutelar — contou o responsável por fazer de Claudiomiro um verdadeiro Papai Noel.
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“Represento as crianças negras”
Natural de Montenegro, Da Silva mora há 20 anos no interior em uma comunidade alemã. No convívio com os vizinhos, é a leveza das relações que preenche a rotina vivida na localidade de Desvio Blauth. Na Oktoberfest, inclusive, foi vestido de alemão após perder uma aposta. E a certeza de que ninguém se importaria com isso, independente da sua cor, deu ainda mais confiança para viver o bom velhinho em dezembro.
— Acho que foi um choque para alguns, mas representei as crianças negras naquele momento. E a cada ano reforçamos a aceitação. Esse ano foi mágico, ouvir os sonhos delas e incentivar que todos são possíveis de alcançar — definiu ele.
Desde que foi convidado a participar, em 2018, Da Silva, que também é músico, não desapegou mais da barba longa. Gasta até R$ 300 mensais para mantê-la sempre aparada e digna do chefe do Natal. Segundo ele, a estética é uma herança do pai que, com 102 anos, mantém cabelo e barba brancos.
— No primeiro instante não levei a sério, mas não cortei mais também a pedido dos meus filhos. Mantenho e é caro, dou um trato seguidamente. Com 35 anos eu tinha vergonha porque já estava com a barba branca então mantinha ela sempre bem aparada. Com 50 anos me descuidei e aconteceu isso — brincou.
No dia 10 de dezembro, Da Silva recebeu das mãos do prefeito Fabiano Feltrin a chave do município durante a abertura do Natal. Atualmente é o Papai Noel oficial de Farroupilha e participa de outras aparições junto dos cerca de 20 integrantes da trupe em que faz parte.
O Natal o inspirou e, desde que começou a ver as crianças mais de perto, procurou outra forma de ajudá-las, também em forma de escuta. Estudante de Direito ele foi, em 2019, o segundo mais votado para o cargo de conselheiro tutelar de Farroupilha, com 540 votos.
— É uma missão. Cuidar dos direitos da criança e do adolescente é muito difícil, tem que amar. Cuidar dos direitos dos filhos dos outros é desafiador, mas é gratificante porque mostramos o caminho certo para os pais. E me encontrei com isso, parece que já trabalho há muito tempo como conselheiro tutelar — contou.
O Papai Noel de Farroupilha entra em férias do trabalho voluntário na próxima semana, assim que o Natal terminar e as atenções estiverem voltadas às festas de Revéillon. Até o ano que vem, ao invés de trabalhar em uma fábrica de brinquedos no Polo Norte, cuidará para manter inviolável o direito das crianças em sonhar em ser o que elas quiserem.