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Jogar o lixo de forma correta não é rotina para parte dos moradores de Caxias do Sul. Um mapeamento efetuado pela Companhia de Desenvolvimento de Caxias do Sul (Codeca) e Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Semma) mostra que 689 toneladas de produtos já foram recolhidos neste ano em mais de 1,3 mil pontos da cidade. O fato não gera apenas gastos aos cofres municipais, o que já é alarmante, mas é crime ambiental. O estudo preocupa o poder público e, por conta disso, a Codeca criou um departamento de meio ambiente para tratar do assunto no mês passado. Junto com a iniciativa, um convênio foi selado com a Semma. A intenção é investir no aprimoramento da coleta de lixo ilegal e, mais do que isso, pretende prevenir a formação de novos cenários de caos ambiental como os já presentes e que podem ser facilmente verificados em trajetos de Caxias.
Dos cerca de 1,3 mil locais mapeados, 130 são lixões localizados em grandes áreas. As zonas norte e sudeste de Caxias concentram a maior quantidade de materiais jogados aleatoriamente. Em apenas um dos locais, no bairro Nossa Senhora do Rosário, foram retiradas 73 toneladas de lixo neste ano, segundo o diretor administrativo da Codeca, Luis Felipe Burtet. A maioria dos objetos é de restos de construção civil e móveis usados. Além disso, sacolas com lixo orgânico e até fraldas são encontrados largados em terrenos.
Diversas situações motivam um cidadão a fazer descarte irregular. A principal é por não querer pagar uma empresa responsável, que faça a destinação correta. Nesses casos se aplicam pessoas que, por exemplo, fizeram uma reforma na casa. Os restos de materiais acabam sendo jogados em terrenos afastados da região central da cidade. Ou, os próprios contratados para efetuar o serviço não destinam o material corretamente.
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— Decorre principalmente de pessoas que não querem fazer o descarte correto por ter um custo muitas vezes elevado. Mas também há a questão da cultura das pessoas. Muitas, simplesmente, passam de carro e jogam sacolas. Temos diversas situações de flagrante (confira o vídeo abaixo). Já vimos veículos parando e jogando quilos e quilos em via pública. São (resíduos) principalmente de construção civil, indústria e pessoas em situação de vulnerabilidade social que acabam descartando móveis e utensílios em áreas públicas e particulares— diz.
Burtet explica que, em áreas públicas, a Codeca faz o recolhimento, ao contrário de propriedades particulares.
— Nesse caso, a Semma faz os trâmites legais para que o proprietário, além de promover o recolhimento, coleta e destinação dos resíduos, faça um procedimento administrativo para apuração de infração ambiental — diz.
Quantidade equivale a dois dias de coleta regular
As quase 700 toneladas de lixo foram recolhidas pela Codeca de janeiro a outubro deste ano por uma equipe que efetua o serviço manualmente com auxílio de caminhão e caçamba.
— É o equivalente a dois dias envolvendo área rural e zona urbana. Recolhemos em torno de 350 toneladas por dia em Caxias — cita.
Com o convênio, a Codeca poderá fazer essa coleta mecanizada. A equipe foi abastecida com escavadeiras, novos caminhões-caçamba e ferramentas para chegar a locais de difícil acesso.
Entre os locais que exigem mais atenção do poder público para limpeza estão o limite dos bairros Santa Catarina e Cidade Nova e Nossa Senhora das Graças. A região dos bairros Pedancino, Santa Fé e Pioneiro também apresentaram grande quantidade de áreas mapeadas. Um dos exemplos de locais procurados pelo infrator criminal é a estrada de chão que acessa o loteamento Vinhedos, pela Rota do Sol. No trecho de cerca de 1 km é fácil visualizar dezenas de pontos com lixo acumulado.
— O convênio serve para criar uma frente de trabalho diferenciada, onde a Codeca e a Semma serão responsáveis pela identificação e mapeamento desses pontos de descarte irregular. A Codeca faz um auto de constatação, que é encaminhado aos órgãos competentes informando o local onde foi identificado, tipo de resíduo e características e encaminha para a Semma, para que faça eventual autuação ambiental ou advertência — salienta.
Faz parte do convênio a compra, por meio de licitação, de equipamentos de drone que serão utilizados para visualizar as áreas por cima.
— O descarte irregular de resíduos é crime e pode acontecer desde advertência até detenção simples por crime ambiental — completa.
Rio Tega em meio ao lixo no Reolon
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Quem mora na Rua Adi de Oliveira Souza, no loteamento Reolon, convive diariamente com o problema. Exemplo disso é a moradora Alessandra Padilha, 42. Ela reside bem em frente ao ponto onde pessoas jogam todo tipo de objeto.
— Animal morto, resto de construção, de tudo... Eu mesma junto e retiro alguns entulhos. Se a Codeca limpar hoje pode vir daqui a dois dias, vai estar cheio de novo. E são moradores que colocam. Tem pessoas que vem do bairro Mariani até aqui colocar à noite. Tem gente que contrata para limpar pátios e eles vem aqui jogar tudo com carrinho de mão. Ainda por cima acham que quem joga são os moradores mais próximos. É complicado — conta
Alessandra, filhos e netos apenas atravessam a rua e já encontram o Rio Tega. Atualmente, as águas de um rio que já foi destino de muitos caxienses para se refrescar no passado, está suja e poluída.
— Eu digo para as crianças que querem tomar banho no rio nem chegar perto. Olha a quantidade de lixo que jogaram nele — lamenta, ao mostrar o cenário lembrando que costumava tomar banho de rio na infância no mesmo lugar.
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Prática expõe população ao risco
Uma das responsáveis pelo mapeamento efetuado pela Codeca, que é atualizado a cada nova informação, é a engenheira ambiental Natalia Dapont. Ela explica que o descarte irregular interfere na saúde pública.
— Reflete na qualidade do solo, da água, do ar e expõe a população a substâncias tóxicas e até patogênicas. Ocasiona em contaminação do solo e do ambiente ao redor. Contamina os recursos hídricos mesmo estando distante porque a água da chuva leva substâncias a todos os lugares. Existe ainda o fator poluição do ar. Para se ter uma ideia, os aterros sanitários têm regras a cumprir sobre poluição de emissão de gases. Também sabemos que o resíduo pode trazer moscas e ratos, que transmitem doenças a moradores — cita.
Em Caxias, a lei complementar nº 376 de 2010 traz definições sobre responsabilidade de coleta e transporte como sendo do gerador do lixo.
— Não são somente empresas que fazem o recolhimento, cada envolvido será responsável. Somos responsáveis pelos resíduos que geramos. Na lei, são determinadas punições e infrações, multas e penalidades que são definidas conforme o dano — diz.
De acordo com informações da Semma, a fiscalização da pasta baseia-se nos artigos 36 e 96 da lei. Em casos de áreas particulares, onde não é possível identificar o infrator, o proprietário do imóvel é notificado para que providencie a limpeza e comprove o fato à secretaria. Já se o infrator for flagrado realizando o descarte, é lavrado um auto de infração. A lei completa pode ser acessada no site da Câmara de Vereadores aqui.
Confira as imagens de flagras que foram encaminhadas à reportagem: