O edital de processo seletivo para escolha de uma entidade que irá administrar a UPA Central, o antigo Postão, de Caxias do Sul, é questionado na Justiça. O departamento jurídico do Instituto Brasileiro de Saúde e Ensino, Pesquisa e Extensão para o Desenvolvimento Humano (Ibsaúde), um dos concorrentes do certame, encaminhou, na última sexta-feira, ação judicial para impedir o avanço da licitação.
Um dos pontos questionados é a pontuação, que poderia beneficiar outras instituições, já que atribui 20 pontos às concorrentes que contém Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social na Área de Educação (Cebas). Segundo o instituto, o certificado “não serve para demonstrar qualquer experiência técnica de uma organização social proponente a administração e gestão de qualquer unidade de saúde”.
Leia mais
Prefeitura de Caxias lança edital para gestão compartilhada do Postão
Prefeitura de Caxias do Sul gastará cerca de R$ 8,5 milhões para transformar Postão em UPA
UPA Central não deve abrir antes do inverno em Caxias do Sul
Fechamento do Postão de Caxias já impacta em movimentação de UPA Zona Norte
Nos bastidores da prefeitura, chama a atenção dos funcionários pelo menos quatro itens do processo: a sessão reservada para análise das propostas, que pode ferir a transparência na seleção, a qualificação das interessadas que não mencionam a prestação de contas anterior a dois anos, a terceirização, que não foi aceita pelo Conselho Municipal de Saúde, e que cria risco de demandas trabalhistas e previdenciárias, e a seleção dos médicos, uma vez que a prefeitura exige que faça concurso seletivo, mas se for frustrado poderia empregar médicos por meio de contratos de prestação de serviço.
Em relação à pontuação, o Ibsaúde já havia encaminhado recurso administrativo, no dia 14 de julho, para solicitar que o edital revisse a obrigatoriedade do certificado ou reduzisse a pontuação. O pedido foi indeferido no dia 26 de julho pela Procuradoria-Geral do Município (PGM). O instituto decidiu impugnar a licitação, pois entende que a “exigência configurou concretamente uma restrição quantitativa à possibilidade de diversas entidades obterem sucesso no processo seletivo, ferindo-se o princípio da isonomia e da impessoalidade”.
Itens contestados por servidores municipais de Caxias
Funcionários da prefeitura de Caxias procuraram a reportagem do Pioneiro para apontar itens que, segundo eles, podem provocar problemas ao município. Eles têm a identidade preservada.
Apresentação dos envelopes
Abertas e rubricadas por todos os interessados, as propostas técnicas constantes no primeiro envelope, a Comissão Especial de Seleção e a Comissão de Licitações, suspenderão a sessão pública e analisarão as propostas em sessão reservada. Após o julgamento e classificação das propostas técnicas e, não havendo ou resolvidos os recursos interpostos, será marcado prosseguimento da sessão para que sejam abertas e rubricadas por todos os interessados as propostas de preço constantes no segundo envelope, somente das Organizações Sociais que não tenham sido desclassificadas no julgamento das propostas técnicas.
Para funcionários da prefeitura, a prática não é usual e pode comprometer a transparência e lisura do processo.
Condições de participação
Podem integrar o procedimento seletivo simplificado, as entidades privadas, sem fins lucrativos já qualificadas como Organização Social por meio de três decretos disponíveis no site caxias.rs.gov.br. O edital aceita a qualificação de empresas de dois anos atrás e não fala sobre a prestação de contas de períodos anteriores.
– O edital exige que só podem participar as entidades pré-qualificadas, só que a análise dessa qualificação é a data dos decretos de 2017. Muita coisa pode se alterar nesse período. Por exemplo, nos editais do Fiesporte e Financiarte que beneficiam projetos bem menores é exigido que esteja em dia com a prestação de contas – aponta um servidor.
Referente aos itens 16.11 e 16.11.1
É vedada a prática da “quarteirização” ou de contratação, pela contratada, de empresas fornecedoras de mão de obra de profissionais da saúde. Se o procedimento público para a contratação de empregados profissionais na área da saúde restar frustrado, deserto, ou insuficiente, para qualquer das categorias, a contratada poderá contratar de forma direta e individual, profissionais liberais constituídos como pessoa jurídica desde que:
a) seja comprovada a realização inexitosa do certame público e;
b) seja comprovada a coerência dos preços com a prática do mercado, para as respectivas categorias profissionais.
Para esse item, um servidor alerta:
– A prefeitura exige que faça concurso seletivo, mas se for frustrado poderia contratar o médico por empresa. O problema está no risco de demandas trabalhistas e previdenciárias, caso se entenda que as normas trabalhistas foram burladas. A entidade tem somente 45 dias para fazer um edital de seleção e depois contratar médicos. A terceirização envolve muitos riscos quando se tem os requisitos de uma relação de trabalho. E nesse caso terá todos os requisitos: habitualidade, porque cumprem escala, subordinação, continuidade, ou seja, existem os riscos de o município ter de pagar a conta duas vezes.
A terceirização
A administração proposta para a unidade, chamada de gestão compartilhada pela prefeitura, foi reprovada pelo Conselho Municipal da Saúde (CMS) para o Postão no fim de 2017, quando o PA ainda estava aberto A prefeitura lançou o edital para a UPA Central sem esperar por um aval do CMS. A alegação do prefeito Daniel Guerra (PRB) leva em conta uma decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que apontou que ações da prefeitura de Porto Alegre não precisam estar ligadas às conclusões do Conselho da Saúde. Considerando a perspectiva de jurisprudência, o prefeito argumenta que a anuência dos conselheiros não é necessária também em Caxias.
Contrapontos
O que diz a prefeitura sobre os itens questionados
“A licitação é procedimento, ou seja, uma série pré-ordenada de atos voltados a um resultado final. A sequência dos atos que a compõem encontra-se descrita no art. 43 da lei n.º 8.666/93. Como é sabido, a administração tem o dever de observar fielmente a sequência e os requisitos exigidos na prática de cada ato, sob pena de ilegalidade.”
O que diz a Procuradoria-Geral do Município
A procuradora-geral do município, Cássia Kuhn afirma que o pedido administrativo foi indeferido porque o edital respeitou os parâmetros legais para a contratação dos serviços. Afirma que o município ainda não foi notificado sobre o pedido judicial para suspender a licitação. Adianta que a prefeitura irá recorrer caso a Justiça conceda liminar favorável ao cancelamento do certame.
Leia também
Homem é atropelado em estrada do interior de Caxias
Jovem de 20 anos é vítima de tentativa de homicídio no bairro Vila Leon em Caxias