Especialistas das redes pública e privada participam nesta sexta-feira, em Bento Gonçalves, do congresso Câncer de Mama em Pacientes Jovens, promovido pela Liga de Combate ao Câncer de Bento Gonçalves. Em mulheres com até 40 anos, os índices já são expressivos e podem chegar a 7% dos casos.
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O tema está despertando a preocupação dos especialistas pois, além de ser mais agressivo, o tumor é mais difícil de detectar. O mastologista e reconstrutor de mamas Maximiliano Cassilha Kneubil, 37 anos, abre o evento de hoje, que contará ainda com a participação do vice-presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia, José Luiz Perini. Nesta entrevista, Maximiliano fala, entre outros assuntos, do comportamento da mulher jovem quando descobre o diagnóstico. Confira:
Pioneiro: Há estatísticas que mostrem um aumento do câncer de mama em mulheres com menos de 40 anos? Quais?
Maximiliano Cassilha Kneubil: A definição de câncer de mama em mulheres jovens é controversa. Alguns autores definem fazer a investigação antes dos 35 anos, enquanto o rastreamento do câncer mamário preconizado pela Sociedade Brasileira de Mastologia é exame anual em mulheres acima dos 40. O câncer de mama é incomum em mulheres jovens, constituindo-se em 5% a 7% dos casos de acordo com estudos populacionais, sendo observado uma maior frequência de diagnósticos nos últimos anos. Segundo levantamentos do Instituto do Câncer de São Paulo e da Universidade Federal de Goiás, houve um crescimento expressivo no Brasil no número de casos em todas as faixas etárias. Entretanto, esse crescimento é mais preocupante em pacientes com menos de 40 anos por ser mais agressivo e difícil de detectar. Há uma causa específica que justifique esses índices? Existem diversos fatores de risco relacionados ao câncer de mama: idade, hereditariedade, hábitos de vida, medicamentos (reposição hormonal), obesidade e alterações genéticas. Infelizmente, não há estudos avaliando a prevalência em nossa região de mutações genéticas relacionadas ao câncer de mama. Nem mesmo sabemos qual a quantidade de agrotóxicos ingerida nas frutas e verduras ou a de hormônios encontrada em carnes e frangos.
O câncer de mama em mulheres jovens pode ser da categoria mais agressiva e menos propenso a responder ao tratamento?
Nesta faixa etária, geralmente, as características biológicas são mais agressivas e é maior a taxa de recorrência pós-cirúrgica. As pacientes se apresentam ao diagnóstico com tumores mais avançados. Em contrapartida, têm excelentes respostas com a quimioterapia neoadjuvante, realizada antes da cirurgia. Em alguns subtipos tumorais, a taxa de resposta patológica completa chega até 60%, ou seja, em 60% dessas pacientes, o tumor não é mais encontrado na mama no momento da cirurgia após o término da quimioterapia, principalmente, se esta for associada a terapias-alvo como o Trastuzumabe e o Pertuzumabe (medicamentos).
Há uma dificuldade maior em detectar o câncer em mulheres jovens, devido ao tecido mamário?
Sim. Além dessas pacientes não se encontrarem na faixa de rastreamento populacional para o câncer de mama, apresentam mamas densas, o que diminui a exatidão na leitura e interpretação da mamografia.
Existe prevenção para a doença em mulheres jovens ou somente a detecção precoce e o tratamento podem melhorar as chances de sobrevida?
Não existe um método de rastreamento efetivo nessa faixa etária que tenha impacto na mortalidade. O diagnóstico precoce e o tratamento imediato são as ferramentas fundamentais para diminuição da mortalidade. No entanto, faltam ações de rastreamento e de conscientização da população. Outro fator é a falsa percepção de que mulheres jovens não possuem risco de desenvolver câncer, desvalorizando sinais e sintomas iniciais. Tenho uma paciente de 28 anos com câncer de mama que, recentemente, terminou a quimioterapia neoadjuvante. Ela apresentava uma lesão ulcerada em mamilo há mais de um ano, procurou diversos profissionais, sendo tratada sempre como tendo um eczema, um processo inflamatório benigno, quando, na verdade, era doença de Paget, uma das possíveis apresentações clínicas do câncer de mama.
É mais difícil lidar com o comportamento de uma mulher jovem ao diagnóstico?
Com certeza. O diagnóstico em mulheres jovens traz grandes desafios pois elas se encontram na fase reprodutiva, constituindo família e iniciando a carreira profissional. Muitas vezes têm filhos pequenos, algumas estão amamentando ou até são gestantes e a maioria delas apresentam tumores em estágios avançados. Nos últimos três meses, contabilizei 14 pacientes com câncer de mama com idade inferior a 40 anos, sendo quatro com menos de 30. Dessas, duas estavam amamentando. Em todos os casos, a própria paciente percebeu o nódulo durante autoexame e, apenas quatro, tinham antecedente familiar. Todas apresentaram um câncer mais avançado. Felizmente, a maioria teve excelente resposta à quimioterapia.
Quais os efeitos que as quimioterapias deixam nessa mulheres jovens?
Ela leva à menopausa em 20% dos casos. Como muitas ainda não apresentam a prole constituída, deve ser oferecida uma avaliação com um médico especialista em reprodução humana, podendo ser coletados e congelados óvulos. Além disso, devem ser avaliadas por um oncogeneticista para possíveis mutações como nos genes BRCA 1 e 2, que além de aumentar a probabilidade de uma recidiva na mesma mama após o tratamento, aumentam o risco na mama contralateral. Nestas pacientes, orientamos a mastectomia bilateral e reconstrução com próteses, além da retirada dos ovários, pois apresentam uma probabilidade de 30 a 50% de ter um câncer de ovário durante a vida.
Quais as dicas para lidar com a doença?
O papel do ginecologista é fundamental pois é a porta de entrada destas pacientes. Se o câncer for diagnosticado, o ponto chave é assumir uma postura otimista em relação ao tratamento. A medicina avançou muito com terapias-alvo e, mesmo nesta faixa etária, a chance de cura é elevada. Outro ponto fundamental é se cercar de uma equipe multidisciplinar competente. Câncer de mama não é mais sinônimo de mutilação e perda de autoestima. Muitas podem se beneficiar com a reconstrução por meio de próteses.