Eu não gosto de inverno. Eu detesto o inverno, na verdade. Mas... Sempre tem um mas na vida da gente. Somos instáveis, mudamos de ideia, queremos algo agora, depois não mais. Depende do dia, do lugar, do humor. É assim com o clima. É assim com o inverno. Eu detesto o inverno, o cinza, a neblina, a chuva fraca e constante que molha até a minha alma e me deprime. Caxias tem neblina, frio, chuva. Um dia, dois, três seguidos. Nessas épocas, olho para o céu procurando estrelas, um prenúncio de que talvez o dia seguinte esteja iluminado pelo sol. Espero por ele. Abro sorrisos quando as nuvens somem e permitem que ele apareça pra mim.
Mas, e sempre tem um mas, nós humanos somos realmente bons em insatisfação. Andava eu pelas ruas de Londres num abril da vida. Acordava cedo, dormia tarde, com sede de pints em pubs, cultura, pontos turísticos, ruas, ônibus vermelhos, tube. E de neblina. Pois é. Eu já estava lá há quase uma semana e o sol me fazia companhia. O céu azul coloria a alegria que inundava as minhas fotos. Me permitia conhecer a cidade a pé, como eu gosto. Mas faltava a neblina. Aquela que eu nunca quero ver.
Mas que está presente enquanto eu escrevo esse texto. O dia está cinza aqui em Caxias. Eu já reclamei da chuva fraca, da temperatura de um dígito, já pensei que um dia o inverno acaba, afinal eu o detesto, não? Mas, e sempre tem um mas, coloquei Radiohead pra tocar, "música pra ouvir andando de carro em dia de neblina", já disse Vitor Ramil. Thom Yorke canta a triste No Surprises. Provoco a depressão, porque sei que as surpresas, ao contrário do que diz a música, acontecem. No dia de embarcar de volta ao Brasil, no Hyde Park, Londres se exibiu pra mim como costuma ser: fria, cinza, úmida. E eu fiquei feliz, apesar de sentir frio. O cinza me fez bem; e a vida, uma surpresa.
Crônicas de inverno
Paula Valduga: faltava a neblina, aquela que eu nunca quero ver
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