Aconteceu no ano de 1865, no mês de agosto, em Rio Grande (a primeira cidade fundada na Província, em 1787), na época com 14 mil almas. Estava de passagem por ali o Conde D´Eu e seu séquito, rumo ao encontro do imperador Dom Pedro II, já aquartelado em Caçapava com suas forças somadas aos Voluntários da Pátria, a fim de combaterem o exército paraguaio de Solano López, que invadira terras brasileiras e já tomara São Borja e Uruguaiana.
O Conde D´Eu, francês da nobre Casa de Orléans, havia recém voltado da Europa, onde estivera em viagem de núpcias com sua esposa, a Princesa Isabel, filha de Dom Pedro II. Ao chegar ao Brasil, descobriu que eclodira a Guerra do Paraguai (seu celular estivera fora de área a viagem toda e ele se recusara a acessar a internet para saber das notícias) e não tardou em ir se juntar ao sogro no Sul do país para ajudar a comandar in loco as tropas brasileiras combatentes. De barco e a cavalo, a viagem do Rio de Janeiro até Caçapava levou duas semanas.
No caminho, o séquito do Príncipe Consorte ia sendo recebido com pompas e gala nas localidades por que passava, sendo o Conde D´Eu hospedado nas luxuosas residências dos principais próceres de cada lugar. Assim também se deu em Rio Grande, onde foi recebido pelo distinto senhor Eufrásio Lopes de Araújo e sua família. No jantar, a esposa do anfitrião fez questão de que o Conde provasse o "vinho da terra", uma vez que a Província do Rio Grande do Sul era a única do país, na época, que vinha produzindo vinho, a partir de cepas importadas dos Estados Unidos (os imigrantes italianos só começariam a chegar no Sul dali a dez anos).
O Conde provou, mas não gostou, relatando assim a experiência em seu diário de viagem: "É de cor vermelho-clara e tem um sabor que não é propriamente desagradável, mas que é acre e se não parece com o de nenhum vinho europeu". Zero para o vinho gaúcho de 1865. Mas muita coisa mudou no cenário vitivinícola da região, passado um século e meio. Pena é que não seja mais possível convidar o Conde D´Eu para um jantar hoje na Serra Gaúcha, regado aos melhores rótulos das vinícolas da região. O que ele escreveu é imutável e traça o retrato de uma época. Felizmente, há coisas que mudam para melhor (quem procurar com afinco, acaba achando, nem que seja o vinho).
Opinião
Marcos Kirst: Zero para o vinho gaúcho de 1865
Mas muita coisa mudou no cenário vitivinícola da região, passado um século e meio
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