Ela é a sombra do técnico, segue seus passos e está atenta às orientações na beira do quadra. Patrícia dos Reis de Souza, 39 anos, é intérprete da seleção brasileira feminina de basquete surdo. Com 12 anos de atuação com a Língua Brasileira de Sinais, a professora começou a trabalhar como tradutora nos cultos da igreja. Em 2020, a profissional abraçou também o projeto do basquete feminino. Natural de Caxias do Sul, ela relata como é estar nos jogos.
— A Libras é o meio de comunicação delas com o técnico. Tudo que ele fala, eu preciso traduzir para as meninas. Tudo que elas falam, eu passo para ele. Sou a voz dos surdos naquele momento. A mesma intensidade que um fala, temos que transportar para Libras — explica a intérprete oficial da seleção.
É a primeira vez que Patrícia trabalha com o esporte. Para estar na beira da quadra como braço direito do treinador para se comunicar com as atletas, a intérprete precisou conhecer a modalidade.
— Eu dominava o vôlei, mas o basquete tive que estudar regras, as propostas dos jogo, como funciona para saber como funciona e até que ponto posso agir — disse a profissional.
Conforme Patrícia, o combinado durante os jogos é que as atletas olhem sempre para o técnico. Ela se posiciona sempre perto, como uma sombra para ter uma comunicação rápida. A expressão facial e corporal é outro ponto destacado. Mesmo quando técnico fala em um tom mais brando, a orientação precisa ser expressada de maneira clara.
— Quando ele está em um tom de cobrança, mais sério, que elas têm que ser mais ágeis, fazemos os classificadores do corpo, do rosto e movimentos para diferenciar de uma cobrança ou incentivo. Nossa estrutura facial e corporal, tudo ajuda e auxilia no jogo — descreve.
Em meio aos jogos, Patrícia reflete sobre a visibilidade que a Surdolimpíada trouxe para temas importantes, como a inclusão. Neste ano, a lei que reconheceu a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como meio legal de comunicação e expressão dos surdos completou 20 anos. No entanto, a intérprete afirma que ainda se tem um caminho longo a ser percorrido.
— É muito recente, tem um caminho distante. As pessoas creem que a inclusão é um meio mais viável, mas a sociedade não está preparada para recebê-los, as portas começaram a se abrir vagarosamente. A visibilidade da Surdolimpíada está sendo muito importante e positiva para eles por causa disso. Eles não são deficientes, são só surdos — diz Patrícia.
BASQUETE VIROU PAIXÃO
Patrícia foi tomada pela paixão do esporte, em especial o basquete. É a primeira vez que o Brasil tem um time feminino surdo nos Jogos. Ao falar das meninas, a intérprete expressa uma grande alegria.
— É muito emocionante, nunca se teve basquete feminino surdo no Brasil desde 1924, quando os Jogos iniciaram. Nós somos a primeira seleção, as primeiras meninas e os primeiros nomes representando o nosso país — comenta a professora.
Ela deseja seguir trabalhando com esporte. Patrícia também aproveitou o momento para pedir mais apoio. Como as atletas precisam custear as despesas de treinos com recursos próprios, Patrícia chegou a acolher algumas jovens em sua casa para treinar.
— Pretendo continuar com elas, ajudar sempre e as novas meninas que chegarem também. Fiz até uma tatuagem em homenagem às jogadoras. Temos meninas de vários estados. Elas desembolsam tudo, não temos auxilio de verba. Teve um treino que elas dormiram na minha casa, encheu a casa, pois não tem esse apoio e algumas não conseguiram vir pela falta de recursos — finalizou.