Aos 90 anos e cheia de vitalidade, dona Emma Nilza Citton Faccio gosta de aproveitar a luz que entra pela janela da cozinha para bordar. Prefere a claridade do dia a lâmpada, talvez seja resquício do tempo em apenas o lampião iluminava a casa.
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Enquanto manuseia linha e agulha, exercita um conhecimento adquirido no início da adolescência, em Antônio Prado, onde vive.
- Aprendi com minha mãe, que era costureira, e no colégio, porque a gente tinha aula de trabalhos manuais duas vezes por semana. Ainda me lembro o nome da minha profe, dona Norma - conta, enquanto prepara um enxoval para crianças, uma de suas especialidades.
Mais do que linhas, desenhos e frases soltas, a atividade de bordar - normalmente restrita ao ambiente doméstico - ajuda a construir identidades, na medida que deixa rastros de existência que se contrapõe à invisibilidade da atividade caseira.
Com essa premissa, psicopedagoga e pesquisadora Neusa Maria Roveda Stimamiglio idealizou o segundo livro sobre o assunto, no livro Bordando Sonhos: contando histórias, que será lançado na próxima quinta-feira, no Centro Cultural Casa Grezzana, em Antônio Prado. Na mesma data, será aberta exposição homônima, com os trabalhos usados no livro.
São as mãos de dona Emma que ilustram a capa da publicação, como forma de homenageá-la por uma vida dedicada a preservar um costume dos antepassados. Em três capítulos, cujos nomes fazem referência a um tipo de ponto, a obra resgata acontecimentos históricos dos 140 anos de colonização italiana no Rio Grande do Sul, com explicações sucintas e fundamentas em pesquisas para embasar cada uma das 81 imagens bordadas e fotografadas.
No Ponto-Atrás é abordado o processo imigratório, a adaptação à nova região e as necessidades imediatas de sobrevivência. Há bordados desde a partida de navio até a construção e adorno das casas com lambrequins.
No Ponto Corrente a autora fala sobre a ocupação do território rio-grandense, com a convivência entre os imigrantes e descendentes com outros grupos étnicos. Nas imagens bordadas, aparecem o chimarrão, a polenta, o bigolaro (utensílio para fazer a massa), os filós e o dialeto vêneto, entre outras referências.
O último capítulo, Ponto Margarida, faz reverência ao trabalho feminino, realizado dentro de casa, que ajudou a preservar o patrimônio cultural, mesmo sendo pouco aparente fora do âmbito doméstico. Estão representados desde o preparo de pães em forma de pombinha, o tear, a costura e a confecção do enxoval.
- O diferencial é que o livro não conta uma história, mas muitas histórias. Quando falamos de pontos, cores e mãos estamos falando, também, de subjetividades. São marcas que elas deixam do saber fazer - afirma Neusa.
Patrimônio
Livro reconta a imigração italiana por meio de desenhos feitos com linha
"Bordando Sonhos: contando histórias" será lançado na próxima quinta, em Antônio Prado
Tríssia Ordovás Sartori
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