Eu ainda não tinha lido nada de Joe Hill, mas recentemente, numa visita à livraria, meu interesse foi atraído pela sinopse de Nosferatu (Editora Arqueiro, R$ 49,90). Até já havia visto outros livros dele nas livrarias (Estrada da Noite, O Pacto), mas sempre acabava deixando para outra vez. Finalmente essa vez chegou, e garanto que a espera valeu a pena: Nosferatu envolve desde a primeira das 624 páginas, numa prosa criativa e carregada de tensão. Hill tem um estilo todo próprio mas que, ao mesmo tempo, senti que reconhecia. Quando ainda estava na metade da leitura, fui pesquisar mais sobre o autor e percebi de onde vinha essa impressão - ele é filho de outro escritor que está entre os meus preferidos, Stephen King.
Provavelmente Joe adotou o "Hill" (abreviação de seu segundo nome, "Hillstrom") como nome artístico para não despertar ligações imediatas com o pai; mesmo assim, é impossível não reparar que ele tem a mesma prosa envolvente do autor de Carrie e Cemitério Maldito, até porque segue o mesmo gênero. Como nos livros de King, Nosferatu consegue mesclar o terror, o suspense e o fantástico, apresentando personagens e situações tão bem delineados que, por mais impossíveis que sejam no "mundo real", nos fazem aceita-los como verossímeis.
Outro eco de King é que a protagonista da história começa a trama como criança - ok, muitos autores fazem isso, porém é impossível não ver em Vic McQueen uma centelha de Danny Torrance, de O Iluminado, ou Jack Sawyer, de O Talismã. Uma diferença é que, nos dois casos citados, os protagonistas continuam crianças até o fim, crescendo apenas nos livros-continuação, lançados muitos anos depois (Doutor Sono e A Casa Negra, respectivamente); em Nosferatu, acompanhamos a experiência de Victoria com o estranho/maravilhoso/fantástico desde seus oito anos até a fase adulta, quando se tem o desfecho.
Mas vamos à trama do livro de Joe Hill, que vale por si só. O leitor provavelmente já viu o antigo filme mudo homônimo, ou pelo menos já ouviu falar que é uma espécie de versão de Drácula. No caso de Nosferatu, o romance de Hill, não há vampiros, ao menos não no sentido convencional. Isso porque se temos Vic como a "mocinha" da história (embora como adolescente e adulta tenha certas atitudes não muito certinhas), temos também um "vilão", Charles Talent Manx.
Enquanto Vic descobre, ainda pequena, que se pedalar rapidamente em sua bicicleta consegue atravessar uma ponte que não existe mais e chegar a qualquer lugar para encontrar coisas perdidas, Manx usa seu próprio veículo, um Rolls-Royce Phantom, para levar as crianças que sequestra a um mundo que criou, a Terra do Natal - lugar não tão maravilhoso como sugere seu nome singelo. Ao longo da leitura, é possível perceber que o título do livro tem, sim, sua razão de ser.
Um dia, os caminhos de Vic e Manx vão se cruzar. As consequências, num primeiro momento, não parecem tão ruins quanto poderiam ser. No entanto, o encontro vai deixar marcas profundas, até o ótimo (e de certa forma imprevisível) desfecho. Realmente, vale a pena encarar as dezenas de capítulos, e aposto que quem gosta do gênero vai perder horas de sono debruçado sobre o livro - não por medo, e sim para tentar chegar ao final o quanto antes.
Agora, já posso dizer que tenho outro escritor preferido na minha lista, e que A Estrada da Noite estará entre as minhas próximas leituras.
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Curiosidade I: em certo ponto de Nosferatu, Manx diz que já cruzou por aí com os True Knot, numa referência de Joe a um dos recentes livros do pai, Doutor Sono.
Curiosidade II: não é à toa que a personagem Vic gosta de andar de moto com o pai (e, mais adiante, aparece outra moto na história) - o autor também é fã delas, tanto que aparece com uma na foto da orelha do livro.
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Mudando de assunto: para quem gostou dos livros 1808, 1822 e 1891, de Laurentino Gomes, uma boa notícia é que o autor desses bestsellers sobre a história do Brasil está trabalhando em uma nova trilogia. O tema, agora, será a escravidão, e o primeiro livro está previsto para 2019.
Livros, livros, livros...
Maristela Deves: 'Nosferatu' mostra que Joe Hill puxou o pai
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