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Um grupo de pesquisadores de Passo Fundo, no norte do RS, criou uma forma de agilizar o diagnóstico de Transtorno de Espectro Autista (TEA) em crianças de dois anos e meio a 12 anos de idade. Esse é o primeiro estudo censitário sobre a condição já realizado no Brasil.
O método leva o nome de MiniTEA e foi desenvolvido em parceria da Universidade de Passo Fundo (UPF), Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) e governo do RS.
Ele funciona através de um questionário de 48 perguntas de "sim" e "não". A diferença é o alto grau de assertividade, que permite ou descartar a possibilidade de autismo ou mostrar se a criança precisa passar por avaliação multiprofissional para investigar mais a fundo.
A ideia do método não é dar o diagnóstico em si, mas garantir uma primeira triagem rápida e eficaz para que crianças com TEA possam ser diagnosticadas e mais cedo possível e, assim, iniciar o tratamento.
— Uma vantagem do MiniTEA é que ele é capaz de excluir 60% das crianças que se pensou terem autismo. Isso ajuda a tirar quem não precisa estar na fila para ser avaliado e dar espaço para quem precisa — disse o médico neurologista Cassiano Forcellini, um dos líderes da pesquisa.
A iniciativa é importante porque, ainda hoje, a busca pela confirmação ou descarte de um caso de autismo costuma ser um processo lento. É preciso que diversos profissionais da saúde avaliem o paciente até a conclusão e a demora tem impacto direto na vida de crianças com o transtorno.
— Por ser multidisciplinar, o caminho até o diagnóstico é demorado e tem muita fila de espera. Isso acaba atrasando (o resultado) e fazendo com que várias crianças percam tempo de tratamento, que poderia ajudá-las no desenvolvimento — explica Marlon Moraes, o presidente da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de Passo Fundo.
Método identificou um caso de autismo a cada 30 crianças em município de 2,6 mil habitantes
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Depois do período de desenvolvimento do MiniTEA, os pesquisadores colocaram o método à prova em 2024. Através de uma parceria com o município de Coxilha, a cerca de 20 quilômetros de Passo Fundo, as equipes avaliaram todas as 474 crianças de dois anos e meio a 12 anos do município de 2,6 mil habitantes.
O questionário foi aplicado aos pais ou responsáveis e identificou um caso de autismo a cada 30 crianças. Até mesmo aquelas que já tinham o diagnóstico foram avaliadas, para identificar a efetividade do método.
O Vicente foi uma dessas crianças. A mãe, a profissional de educação física Sandra Cossati, já sabia que o filho tinha o Transtorno do Espectro Autista, mas as questões ajudaram a identificar características que até então passavam despercebidas.
— Depois desse questionário, você consegue intervir muito mais fácil, né? E naqueles pontos que mais precisa — relata.
Até então não existiam dados brasileiros sobre a frequência de autismo, o que torna este o primeiro estudo censitário sobre o tema, uma vez que analisou todas as crianças de um município.
Método já é usado na rede de saúde do RS
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No ano passado, o governo gaúcho solicitou que o programa TEAcolhe, voltado ao atendimento de pessoas no transtorno, usasse a MiniTEA para triar crianças com autismo. A iniciativa também usa o MChat, ferramenta internacional voltada ao mesmo fim.
— E vários serviços de outros estados do Brasil estão interessados. Eles nos escrevem e a gente explica como funciona — disse Batista.
Fora dos protocolos governamentais ou artigos científicos, famílias e profissionais celebram a nova ferramenta. Na Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Professora Olga Caetano Dias, que só atende alunos com autismo em Passo Fundo, a diretora Fabiane Placedino entende que a triagem ajuda a antecipar diagnósticos e, assim, dar mais qualidade de vida às crianças com TEA.
— O diagnóstico precoce faz muita diferença. Quando bem trabalhado, uma pessoa nível 1 (de autismo) pode levar uma vida normal. O nível 2 você consegue "trazer" para o nível 1 através de terapias, atendimentos e estruturação, assim como o nível 3 — afirmou.
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Foi esse o caso do Isaque, 4 anos. Segundo a mãe, Pamela Mendes, as terapias desde cedo ajudaram na evolução do menino, que a cada dia avança mais na aprendizagem.
— Os médicos falam muito em intervenção precoce e a gente sabe que isso salva a vida de uma criança autista. Então é primordial que, qualquer comportamento que não pareça adequado para a idade, se procure um profissional da saúde. O diagnóstico precoce pode salvar uma criança — disse.