Mesmo com a notória falta de afinidade entre o novo governo federal e a agropecuária empresarial, os interesses do país devem se sobrepor a eventuais noções distintas de mundo e, portanto, é preciso ter visão institucional e trabalhar para construir pontes que estabeleçam uma relação respeitosa e produtiva. Foi proveitosa, nesse sentido, a passagem do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, pela Expodireto Cotrijal, em Não-Me-Toque.
Ficou certa frustração pela ausência de anúncios de medidas concretas para amenizar os efeitos da nova estiagem
Canais de diálogo são necessários. E o titular da pasta, deve-se lembrar, não é estranho ao campo. Pelo contrário. Fávaro, senador por Mato Grosso pelo PSD, é empresário rural e já presidiu a Associação dos Produtores de Soja (Aprossoja-MT) de seu Estado, por exemplo. Mesmo assim, foi apoiador de primeira hora na campanha do petista Luiz Inácio Lula da Silva.
No encontro privado com lideranças do agronegócio gaúcho e no pronunciamento na abertura da feira, Fávaro calibrou o discurso de acordo com o que os interlocutores gostariam de ouvir. Entre outros pontos, disse que o governo federal não compactuaria com a invasão de áreas produtivas pelo MST em um momento em que a questão agrária volta a preocupar por ações de trabalhadores rurais sem-terra. Mas se foi aprovado pelo tom conciliador, ficou certa frustração pela ausência de anúncios de medidas concretas para amenizar os efeitos da nova estiagem que assola o Rio Grande do Sul e de preparação para enfrentar melhor outros períodos de pouca chuva que fatalmente virão.
A Emater divulgou ontem, também na Expodireto, o mais recente levantamento sobre as perdas nas lavouras. As projeções indicam uma quebra de 31% na soja e de 40% no milho em relação à estimativa inicial. Mesmo assim, como a falta de umidade não foi tão grave quanto no ciclo anterior e algumas regiões sofreram menos, a safra de grãos de verão deve ser 24% superior à anterior. Não se pode perder de vista, no entanto, que os agricultores gaúchos sentem as agruras da terceira estiagem em um intervalo de quatro anos. Isso significa uma perda significativa de produção e de renda para os produtores no período. São dificuldades que se acumulam, com reflexos no endividamento.
Traz certo desapontamento a inexistência de confirmações de atendimento de demandas como prorrogação de pagamento de empréstimos relacionados à safra, transferência de milho subsidiado para o Estado e reativação de outras linhas de crédito. O milho é componente essencial na cadeia de aves e suínos.
A cultura plantada para silagem também teve perdas elevadas, o que vai se refletir na produção de leite. São situações que, logo ali, podem também se transformar em preços mais salgados para os consumidores em um período de pressão inflacionária dos alimentos. É preciso ter uma solução para estes problemas urgentes, bem como saber quais são as tais medidas estruturantes sempre citadas e pouco implementadas para mitigar os efeitos de estiagens nos próximos anos. É promissor que o ministro se posicione como um parceiro dos produtores rurais, mas os agricultores esperam bem mais do que acenos e palavras.