Em meio a tantos acontecimentos inusitados na economia e na política, a negociação sobre a venda da Embraer não vem recebendo o destaque merecido. Preocupante, pois se trata, em vários critérios, da mais importante empresa brasileira, e os argumentos pró e contra deveriam ser expostos com transparência e debatidos, até porque a decisão de venda ou perda de controle, se efetivada, será irreversível.
A empresa é líder mundial em sua área (aeronaves de médio porte e para agricultura). Mesmo com dólar abaixo de R$ 2, não só sobreviveu, mas ampliou as exportações, enquanto boa parte do parque industrial definhava. Cresceu graças a esforços, ou até teimosia, de empreendedores, fundamentalmente militares e engenheiros. Rara integração entre universidade e empresa, entre Estado e mercado, entre segurança e expansão comercial. Os argumentos a favor da venda, francamente, não convencem. O mais usado sustenta que o setor de aeronaves passa por inovações tecnológicas e, sem a integração com empresas líderes, a tendência é de defasagem. Mas a Embraer até hoje se antecipou ao mercado e superou desafios, de modo que seus técnicos não veem nada intransponível pela frente. Ademais, há possibilidades intermediárias de negociação e parceria que permitem manter o controle das decisões. Não é o caso, como se noticia, de vender a empresa (e junto sua competente área comercial), mas mantendo cláusulas vinculadas à segurança nacional. A ingenuidade não permite ir tão longe em área estratégica: como um acionista majoritário, ou mesmo com 49% das ações, será impedido de acesso a informações? Por isso, não é apenas uma questão de preço, como se tratasse de vendas de ações em bolsa. O que está em jogo vai além do aspecto financeiro, envolve externalidades e valores intangíveis, matérias que transcendem o sistema de preços convencional.
Um segundo argumento cita a compra da Bombardier pela Airbus como tendência do setor. Mas o caso é diferente, pois a empresa canadense tinha mais a ganhar com o negócio, pois havia muito perdera competitividade – justamente para a própria Embraer. Aqui, ao contrário, a Boeing não só é a maior interessada, como não aceita parceria: quer o controle. A Embraer é exemplo sempre lembrado de um Brasil que dá certo. Será que nem esse será mais possível?