Como pode a previsão de crescimento da economia americana fazer as bolsas caírem? Não deveria ser o contrário? Eis a pergunta mais ouvida pelos economistas nos últimos dias. Para responder, é bom começar dizendo que, frequentemente, em economia as consequências dos fatos são só "boas" ou "ruins"; como na medicina, os remédios têm contraindicação. E, mais que nesta, a ideologia também pesa, de modo que o que é positivo para um pode não ser para outro, o que complica mais a discussão.
No caso, a explicação é simples: a previsão de crescimento do PIB dos EUA não justifica mais juros baixos e há cautela com uma possível inflação. Com juros mais altos, as aplicações em bolsas serão carreadas para os títulos americanos, os mais seguros do mundo. O mercado, então, antecipa-se e os compra agora; as bolsas despencam. Aparenta paradoxo, pois se a previsão fosse de aprofundamento da crise, também seria possível que a bolsa caísse, pois os especuladores têm aversão ao risco.
As consequências para o Brasil também têm duplo sentido. De um lado, a economia americana crescer significa exportação maior, pois se trata do maior parceiro comercial do país depois da China. Com isso, o preço das commodities também tende a subir, o que nos beneficia. Mas os especuladores em papéis e ações no Brasil tenderão a migrar para os EUA, de modo que tal evasão de dólares poderá não compensar o que se ganhará com exportações maiores.
Também é bom lembrar que o crescimento dos países líderes (não só EUA, mas na Europa e na Ásia sinalizam aquecimento) vem acompanhado de mais protecionismo, o que limita as exportações. Em Davos, apesar da retórica liberal para emoldurar belos argumentos, a União Europeia reafirmou a proteção a seu setor primário, emperrando o acordo com o Mercosul. Os EUA disseram estar abertos a investimentos externos (não é novidade), mas não a importações de bens com similares nacionais. E já avisou que pretende taxar o alumínio e o aço chinês, o que, por tabela, atinge o Brasil. Abre-se o mercado malaio para bovinos, mas a China avisa que continuará com barreiras para carnes, milho, soja e açúcar, já limitados na Europa. Até a Turquia quer comprar gado vivo para proteger seus frigoríficos.
Assim, como as consequências sempre impõem dilemas, os riscos das escolhas são inevitáveis.