Éramos felizes e não quisemos acreditar. Entre 1985 e 2016, o Brasil experimentou o seu mais longo período de estabilidade política. Nesse intervalo de 31 anos, promulgou sua Constituição mais democrática e progressista, garantiu a observância das Forças Armadas a funções constitucionais, realizou sete eleições presidenciais competitivas, que promoveram efetiva alternância governamental, e implementou legislação e políticas públicas que fomentaram estabilidade monetária, regras para responsabilidade fiscal, combate à corrupção, universalização do sistema único de saúde, políticas de ação afirmativa, ampliação do acesso ao Ensino Superior e redução da pobreza. Então, abrimos a caixa de Pandora.
Não nos iludamos, não há mocinhos nesta novela.
As eleições presidenciais serão o grande nó de 2018. Na encruzilhada, uma placa com a pergunta: "Lula será candidato?". Se for, provavelmente vença, e no dia seguinte metade do eleitorado reviverá Carlos Lacerda: Lula não pode ser candidato; se for, não pode vencer; se vencer, não pode tomar posse; se tomar posse, não pode governar; se governar, deve ser destituído. Se, por outro lado, o Judiciário impedir a candidatura de Lula, a outra metade do eleitorado, mais cedo ou mais tarde, cobrará o preço de sua orfandade política. Apertem os cintos e permaneçam em seus assentos, porque vamos continuar em zona de turbulência, por muito tempo. Olhando para o Congresso, as coisas não parecem melhores e, escondido pela fragmentação partidária, tudo indica um Legislativo medíocre e mais conservador. Saudade de quando eram apenas 300, os picaretas.
Em 2018, instituições judiciais continuarão a flertar com o despotismo esclarecido. James Madison, um dos pais da Constituição norte-americana, afirmou que, se os indivíduos fossem anjos, não seriam necessárias instituições públicas; mas que, se as autoridades que dirigem as instituições fossem anjos, não seriam necessários limites sobre elas. A moral da história é a seguinte: não devemos contar com santos e por isto precisamos de limites e responsabilização dos agentes públicos. A crise atual trouxe à tona dois dos principais problemas da República de 1988, a corrupção e o desequilíbrio de poderes, por conta de um sistema de controles que, a despeito de uma hipertrofia de leis, normas e regulamentos, revela-se pouco eficiente. Contudo, não será rasgando leis e violando prerrogativas constitucionais que iremos corrigir esse problema. Até porque, como advertiu Madison, os homens que fazem isto nunca são anjos. Não nos iludamos, não há mocinhos nesta novela.
O mundo moderno foi construído com base em dois pilares: a revolução industrial promoveu empregos em massa; Estados garantiram o monopólio da lei e ordem sobre territórios nacionais. Hoje, inovações tecnológicas introduzem algoritmos onde antes havia humanos; empregos desaparecem, deixando em seu lugar ondas migratórias, xenofobia e ódios. Violência, drogas e globalização financeira fragilizam instituições estatais. Mais intolerância e menos regras, este é o novo nome do jogo. Não sejamos Polianas, tudo deve piorar.