Permanecem vivos nas memórias dos gaúchos os momentos de euforia pelo surgimento do polo naval da zona sul do Estado, entre 2007 e 2013, e a frustração com o declínio que se seguiu nos anos posteriores. No auge, festejava-se a bonança, os mais de 12 mil empregos gerados e a profusão de negócios que surgiam a reboque dos estaleiros nas áreas de comércio, serviços, construção civil e indústria de transformação. Parecia alvorecer uma era de prosperidade econômica para a região, em especial Rio Grande, impulsionada pela grande necessidade de plataformas e outras embarcações pela Petrobras para a exploração do pré-sal. Depois, lamentava-se pelas demissões em massa e o desgosto pelos investimentos e planos fracassados, resultado dos atrasos para a entrega das encomenda da estatal conjugados com o estouro da Operação Lava-Jato, que atingiu em cheio o setor.
O mais importante, para afastar o risco de novas decepções, é demonstrar aprendizado para evitar os erros do passado
Pouco mais de uma década após o começo do naufrágio do polo naval gaúcho, emerge uma nova esperança. Foi formalizado nesta segunda-feira, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o contrato para a construção de parte de quatro navios no Estaleiro Rio Grande, operado pela Ecovix. São embarcações da classe handy, utilizadas para transportar derivados de petróleo. Em um segundo momento, serão finalizadas em Niterói (RJ), pela Mac Laren. As empresas formaram um consórcio que venceu licitação da Transpetro, subsidiária da Petrobras, no ano passado. O valor do contrato é de R$ 1,6 bilhão.
A expectativa é da criação de mil empregos em Rio Grande nos próximos três anos. É bem abaixo do período áureo do polo naval no passado recente. Ainda assim, a retomada solenizada ontem merece celebração. É uma nova oportunidade para a cadeia produtiva da construção naval se consolidar na Zona Sul, a partir da busca por mais contratos. No horizonte, está uma nova concorrência da estatal para oito navios de transporte de gás, como parte do programa de ampliação e renovação de frota da Transpetro. Dessa forma, ressurge a chance de reaquecimento de toda a economia regional.
Mas o mais importante, para afastar o risco de novas decepções, é demonstrar aprendizado para evitar que os erros do passado se repitam. Políticas como as que exigiam alto nível de conteúdo local, por exemplo, pareciam ter méritos, por incentivar a produção doméstica de bens e serviços para o setor, mas a realidade mostrou que o país não estava preparado para atender a tamanha demanda. Uma retomada gradual e mais modesta, com a garantia das entregas no tempo previsto, é mais prudente do que se lançar em contratos ambiciosos, mas arriscados, para a construção de grandes navios e plataformas. Frustrações semelhantes à de Rio Grande ocorreram em outros Estados, e o surto de surgimento de estaleiros deu lugar a uma grande decepção, quebradeiras e milhares de trabalhadores demitidos.
Retomar a indústria naval no país é uma obsessão do governo Lula. A curva de aprendizado não é uma necessidade apenas quanto à competitividade dos estaleiros. Espera-se que, agora, também existam melhores mecanismos de controle para impedir malfeitos como os que ajudaram a pôr a pique o setor há pouco mais de uma década.