Ao mesmo tempo em que se mostra compromissado com a seriedade fiscal, o governo Michel Temer continua transmitindo sinais contraditórios, a ponto de, muitas vezes, passar a ideia de estar mais preocupado em ampliar as receitas com novos tributos do que em suprimir ou conter despesas. O mesmo presidente interino que propôs ao Congresso um teto para os gastos acabou apoiando um generoso reajuste salarial para uma elite de servidores já com ganhos relativamente elevados, além de avalizar o acordo para aliviar a dívida dos Estados, ainda que em alguns casos essa concessão fosse indispensável. Outro sinal preocupante é a previsão para o próximo ano de um déficit fiscal de R$ 139 bilhões, ainda elevado, embora inferior à estimativa de R$ 170,5 bilhões até dezembro. E, mesmo diante das negativas oficiais, ainda paira o risco do aumento de impostos, o que é inadmissível sob o ponto de vista dos contribuintes.
O caráter provisório do governo, na dependência do desfecho do impeachment, e os sinais evidentes de deterioração herdados da gestão anterior nas finanças públicas dificultam maior margem de ação. Além disso, muitos esforços ao seu alcance pelo lado das receitas têm efeito quase irrisório. Alternativas como a legalização dos jogos de azar, por exemplo, são pouco significativas, enquanto o eventual aumento na Cide – a contribuição sobre combustíveis – deve significar um reforço limitado a R$ 5 bilhões. Mesmo as concessões e privatizações – que precisam ser aceleradas em áreas para as quais o poder público não consegue mais assegurar eficiência – renderiam no máximo uns R$ 30 bilhões. Sinal de que é preciso insistir em diferentes frentes até que o setor público volte finalmente a operar com as contas em equilíbrio.
O simples fato de o atual governo se conformar com uma estimativa de déficit no próximo ano não muito distante da atual, confirmando o quarto período consecutivo de rombo, é uma sinalização negativa para o mercado, que precisa de um horizonte definido para investir. O país não pode ficar inerte diante da constatação de que equívocos de gestão legaram uma herança pesada. É difícil, mas não impossível, romper esse círculo vicioso de recessão e queda na arrecadação.
Diante de uma crise econômica das dimensões atuais, é preciso que o governo, mesmo na condição de interinidade, demonstre coerência no combate ao déficit. As saídas dependem de eficiência gerencial, incluindo disposição para enfrentar as brechas para gastos e aprofundar as reformas estruturais.