O "não" da lógica equivale ao "zero" da matemática.
Ambos são imprescindíveis.
Tanto um como outro consomem seu objeto.
Uma narração precedida do "não" desaparece, ou seja, a narração passa a ser uma afirmação de não ocorrência.
De forma similar, qualquer número que for divido por zero tem como resultado zero.
(Ao dividir 10 por 2 o resultado é 5, sempre haverá um número positivo)
O "zero" se comporta mal: reduz qualquer número a si mesmo, ou seja, nada.
O "não" também se comporta mal: impede soluções e não constrói o futuro.
O "não", na política, se comporta como na lógica quando o interlocutor não formula alternativas substitutiva ao que o "não" destruiu.
Parece que, hoje, vivemos esse impasse.
O governo enviou proposta de orçamento com déficit de R$ 30 bilhões.
O Parlamento reage e diz "não": é o governo que tem que oferecer a fórmula de superação do déficit.
O governo recua.
Elabora "pacote" de medidas: (1) corte nos descontos de PIS/Cofins da indústria química; (2) restrições para a remuneração de aconistas (juros sobre o capital próprio); (3) redução dos benefícios a exportadores (Reintegra); (4) despesas com inovações deixam de ser descontadas do imposto de renda e passam a ser deduzidas dos repasses do Sistema S (Sesi, Senac etc.); (5) redução de 30% dos repasses das empresas ao Sistema S que serão transferidos para a Previdência; e, (6) a cobrança de 0,2% sobre a movimentação financeira para a sustentação da Previdência (CPMF).
Afirma que tal "pacote" resolveria o déficit.
As propostas 1, 2 e 3 aumentam a arrecadação ao reduzir vantagens.
As empresas e exportadores, titulares dos benefícios, dizem "não".
Quanto ao Sistema S: a proposta 4 desloca a redução do Imposto de Renda para receitas do sistema; e, a proposta 5 transfere para Previdência 30% dos repasses ao Sistema. Não há aumento de tributação, mas realocação.
As entidades patronais (CNI, Fiesp, etc.), destinatárias desses recursos, dizem "não".
Quanto à CPMF, todos dizem "não".
Nenhum formula alternativas objetivas.
Satisfazem-se com o "não".
Todos vociferam e o país afunda.
O diálogo não se dá.
E o governo inflama o conflito, pois acusa todos de golpe.
Todos esperam um milagre.
Esquecem-se que "o milagre tem direito a impor condições" (JL Borges).
A publicação do artigo foi antecipada para hoje devido à série Visões do Rio Grande