Quando Ali Qashmar voltou ao seu povoado, no sul do Líbano, a pé e aproveitando a retirada dos soldados israelenses que combateram o Hezbollah, descobriu que sua casa havia sido praticamente destruída.
"Viemos respirar o ar fresco da nossa terra e do nosso povoado" e nos deparamos com uma "destruição total", lamentou o homem, de 74 anos, que se viu forçado a deixar sua casa quando começaram os confrontos entre Israel e Hezbollah, em outubro de 2023.
O povoado foi "abandonado e completamente destruído", explicou. "Não há nenhum lado onde possamos nos refugiar", acrescentou.
O panorama é o mesmo encontrado pelos habitantes de todos os povoados dos quais o Exército israelense se retirou nesta terça-feira (18), no âmbito do acordo de cessar-fogo com o movimento islamista Hezbollah, segundo jornalistas da AFP.
Ao amanhecer, formaram-se longas filas de veículos em torno destas localidades próximas da fronteira com Israel, à espera de que o Exército libanês os autorizasse a entrar.
As forças armadas libanesas mobilizaram unidades militares em onze povoados.
Mesmo assim, foram muitas as famílias que continuaram seu trajeto a pé.
"É minha casa, era um edifício de três andares, vivia aqui com meus filhos. Tudo ficou" por terra, comentou, atônito, Qashmar, apontando para as ruínas do que um dia foi sua casa.
Ao redor da sua ficavam "as casas dos [seus] irmãos", conta. "Todas destruídas".
Da janela, ele via o povoado israelense de Misgav Am, onde nenhuma atividade militar israelense foi registrada nesta terça-feira.
- "Não se aproximem" -
Israel se manteve presente em cinco posições desta região, embora, segundo o acordo de trégua, que entrou em vigor em 27 de novembro, seus efetivos deveriam deixá-la totalmente.
No entanto, Mohamad Mueise não parecia preocupado com a presença de tropas israelenses perto de sua aldeia. "Voltaremos, queiram ou não", afirmou.
Antes da volta dos moradores, o Exército libanês abriu rodovias e alertou os habitantes sobre os riscos causados por meses de hostilidades, desencadeadas após o Hezbollah abrir uma frente contra Israel em apoio ao aliado, o Hamas, movimento islamista palestino que governa a Faixa de Gaza.
"Não se aproximem, não toquem, avisem imediatamente", dizem os cartazes que o exército colocou nas rodovias.
No povoado de Aadaïssé, os moradores também afirmaram que lhes custava reconhecer alguns locais e que até as terras cultiváveis foram danificadas.
Depois do cessar-fogo, as tropas israelenses dinamitaram quase todas as residências na área de fronteira.
Segundo um relatório do Banco Mundial, publicado em meados de novembro, os confrontos entre o Hezbollah e Israel danificaram 100 mil casas, das quais cerca de 18% foram totalmente destruídas.
Mais de 4 mil pessoas morreram no Líbano desde outubro de 2023 por causa da violência, segundo o Ministério da Saúde. Do lado israelense, dezenas de soldados e civis morreram, informaram as autoridades.
Os familiares de centenas de combatentes do Hezbollah mortos no sul, durante o conflito, seguem esperando poder recuperar seus corpos ou seus restos mortais, ainda sob os escombros. Fotógrafos da AFP viram várias ambulâncias chegando às aldeias fronteiriças.
Samira Jomaa chegou a Kfar Kila bem cedo nesta terça, juntamente com outros moradores. Alguns levavam fotos dos familiares mortos e também bandeiras do Hezbollah.
"Vim buscar meu irmão", que estava no povoado "com seus camaradas", explicou a mulher, emocionada. "Não tivemos notícias dele [...] Estamos certos de que morreram como mártires".
* AFP