Montréal - Apresentando Bruckner ao povo em dezembro, o maestro de baixa estatura chegou a um centro cultural na periferia da cidade, habitada por muitos operários. A sala lembrava a atmosfera de um auditório de escola de ensino médio, mas um pouco mais sofisticado, com acústica seca e paredes de concreto. Mas os 400 lugares estavam repletos de famílias, casais e grupos de amigos idosos.
O maestro, Yannick Nézet-Séguin, pegou um microfone e falou com as pessoas da plateia, alternando perfeitamente entre francês e inglês e explicando-lhes a respeito das cadeiras do palco que estavam vazias para a suíte de Bach que abriria o programa. Na sinfonia de Bruckner, ele prometeu, "vocês vão ver todas as cadeiras ocupadas".
E assim foi. Após apresentações bem formatadas da Suíte No. 2 Bach e da Sexta Sinfonia de Bruckner, a orquestra foi aplaudida de pé.
Os ouvintes estavam claramente se deliciando com a presença de seu compatriota Nézet-Séguin, no comando do conjunto que ele regeu por 12 anos, a Orquestra Metropolitana de Montréal.
As circunstâncias em dezembro estavam muito diferentes das que Nézet-Séguin iria experimentar em 17 de janeiro. O palco, então, seria o Carnegie Hall; os músicos, integrantes da célebre Orquestra da Filadélfia, que ele assumiu como diretor musical no último semestre, depois de uma das fases mais difíceis da orquestra desde que foi fundada, em 1900.
Além da Orquestra da Filadélfia, ele é diretor musical da Filarmônica de Roterdã, na Holanda, e Principal Maestro Convidado da Orquestra Filarmônica de Londres.
Grandes orquestras de todo o mundo o convidam. Igualmente à vontade no fosso (que é o lugar da orquestra nos teatros de ópera), ele tem um longo relacionamento com a Ópera Metropolitana de Nova York, onde tem se falado nele como possível sucessor de James Levine no cargo de diretor musical.
Ao comentar tal especulação, Nézet-Séguin disse que consegue se ver como diretor musical de uma grande casa de ópera algum dia.
- Ainda é muito cedo - acrescentou - Tenho apenas 37 anos. As coisas têm estado maravilhosas e preciso viver o momento atual.
Fã de calças jeans skinny e blusas apertadas com decote em V, com uma tatuagem de tartaruga no ombro direito, feita durante férias no Taiti, Nézet-Séguin tem os recursos técnicos e os conhecimentos musicais de um maestro bem estabelecido. Ele também dispõe de uma quantidade quase sobrenatural de energia - do tipo que leva a virar as páginas de uma partitura de modo retumbante; do tipo que continua entusiasmado mesmo após longas horas de ensaios, fotografias, sessões de entrevistas e reuniões com agentes da indústria da música.
Ele fez uma estreia empolgante no Carnegie Hall com a Orquestra da Filadélfia em outubro. No dia seguinte, já estava de volta a Filadélfia, ensaiando, dando sugestões para o compositor de uma obra prestes a estrear, fazendo um trabalho detalhado com a Quarta Sinfonia de Brahms, pulando do próprio banco.
- Eu deveria ficar colado nessa coisa - disse ele.
Às vezes parece que Nézet-Séguin não está exatamente conduzindo a música, mas moldando os seus gestos para acompanhá-la. Seus movimentos são grandiosos, estendendo-se desde a parte superior do seu tronco. Muitas vezes, seus ombros curvados parecem os de um puma prestes a atacar. A parte superior do corpo de Nézet-Séguin, que tem apenas 1,67 metro de altura, é forte, graças à musculação. A soprano Joyce DiDonato chegou a chamá-lo de "Super Mouse, o Ratinho Possante".
Ele é hábil e preciso no comando de forças intensas e tem uma grande sensibilidade para clímax e finais, fazendo-os parecer inevitáveis e ainda assim envolventes. Possui uma capacidade incomum de fazer com que as orquestras rendam e se flexibilizem. Também trabalha bem com cantores.
- Ele consegue ao mesmo tempo acomodar uma cantora e sustentar a perspectiva que tem como regente da peça - disse DiDonato, que cantou a parte de Donna Elvira em uma gravação recente de "Don Giovanni", de Mozart, regida por Nézet-Séguin para a Deutsche Grammophon - Ele trouxe confiança e segurança.
Parece uma escalada vertiginosa para um ex-menino cantor que fez a sua estreia como regente na Europa apenas em 2004, e sua estreia em Nova York no Mostly Mozart, em 2009.
Porém, antes de chamar a atenção internacional, Nézet-Séguin desfrutou de um aprendizado fecundo no Canadá, regendo em lugares como Winnipeg, Manitoba; Kitchener, Ontário; e Victoria, na Colúmbia Britânica. Acima de tudo, ele foi moldado pelo mundo extraordinariamente fértil da música clássica em sua província natal, Québec. Passar tempo com ele, sua família e seus amigos em Montréal, onde ele mora, deixou clara a influência poderosa de suas raízes e de sua longa relação com a Orquestra Metropolitana, fundada em 1981 em prol dos músicos quebequenses. É com essa orquestra que ele "calça os chinelos", nas palavras de Lise Beauchamp, oboísta principal da orquestra há 20 anos - Aqui nós somos uma família - disse ela.
Agora que a carreira de Nézet-Séguin está em um nível internacional, muitas pessoas lhe perguntam se pretende se mudar. Ele sempre diz que não - Vocês querem que eu vá embora? - disparou ele quando a diretoria da orquestra lhe perguntou a mesma coisa certa vez.
A cultura de música clássica extraordinariamente rica do Québec resulta em parte de investimentos generosos do governo nas artes e em uma forte tradição católica romana, que cria uma grande demanda de corais de igreja e organistas. A província, lar de oito milhões de pessoas, tem 12 orquestras, sete conservatórios (além de programas universitários de música) e altos índices de vendas de discos de música clássica.
- Aqui no Québec, costumamos dizer que somos próximos da Europa e da mentalidade francesa - disse Nézet-Séguin. Ao mesmo tempo, os quebequenses não estão presos a "esse fardo de gerações de história", acrescentou. Duas culturas e duas línguas criam uma "efervescência", bem como uma "energia subjacente que você sempre tem que provar a si mesmo para se certificar de que você existe".
- Isso é muito produtivo e muito criativo - disse ele.
Nézet-Séguin faz parte de uma pequena onda de regentes quebequenses de destaque na cena internacional, incluindo Bernard Labadie, fundador do Les Violons du Roy na Cidade do Québec; Jacques Lacombe, diretor musical da Orquestra Sinfônica de Nova Jersey, e Jean-Marie Zeitouni, diretor musical da Orquestra Sinfônica de Columbus, em Ohio.
- É fato que estamos vivendo uma era dourada - disse por e-mail André Gremillet, diretor da Orquestra Sinfônica de Melbourne na Austrália. Nativo do Québec, Gremillet, enquanto foi presidente e executivo-chefe da Sinfônica de Nova Jersey, contratou Lacombe como diretor musical em 2010. Nézet-Séguin foi o terceiro de três filhos, nascido em 1975, em Montréal. Seus pais eram docentes universitários. Ele começou a ter aulas de piano aos cinco anos, absorvendo rapidamente o repertório, e aos nove, juntou-se ao ilustre Choeur Polyphonique de Montréal.
Aos 10 anos, comunicou seu desejo de ser regente - Seus colegas faziam de conta que tocavam violino com um galho de árvore, e ele fazia de conta de regia com uma vareta - disse a mãe de Nézet-Séguin, Claudine Nézet, hoje sua assistente pessoal. Aos 12 anos, ele começou seus estudos formais de música no Conservatório do Québec. Começou regendo o coro nos ensaios um ano depois e se tornou o maestro do grupo aos 18 anos. Além disso, fundou a sua própria orquestra e coro, La Chapelle de Montréal.
A primeira grande nomeação de Nézet-Séguin chegou em 2000, quando ele se tornou diretor musical da Orquestra Metropolitana. As circunstâncias eram ruins, mas ele parece ter se desviado de quaisquer máculas. Seu antecessor, Joseph Rescigno, um regente conhecido de Nova York, tinha chamado Nézet-Séguin para ser maestro convidado. Abruptamente, o presidente da orquestra - o ex-ministro Jean-Pierre Goyer - anunciou que Rescigno seria substituído por Nézet-Séguin.
Posteriormente, Rescigno entrou com um processo na justiça, alegando ter sido forçado a sair da orquestra, o que teria violado o seu contrato, e foi indenizado por danos. Em uma entrevista, Rescigno disse não achar que Nézet-Séguin estava ciente do que estava acontecendo quando foi contratado. Nézet-Séguin disse que sua nomeação "foi uma surpresa completa". Goyer morreu em 2011.
Outra surpresa, segundo ele, foi a direção musical da Orquestra de Filadélfia, que veio 18 meses após a sua estreia com a orquestra, em dezembro de 2008, regendo a Sexta Sinfonia de Tchaikovsky. Em seu primeiro ensaio à frente da orquestra, ele disse em claro e bom som aos músicos da Filadélfia que tinha ouvido repetidamente a gravação que Eugene Ormandy tinha feito com eles. Tratava-se do tipo de referência à tradição musical característico de Nézet-Séguin.
- Senti desde o primeiro momento que já nos conhecíamos de vidas passadas - disse Nézet-Séguin.
A orquestra estava desorientada, mantida provisoriamente por Charles Dutoit, que havia sido por muitos anos diretor musical da Orquestra Sinfônica de Montréal. A Orquestra da Filadélfia saiu de um processo de falência no ano passado, tendo sido a primeira grande orquestra americana a passar por tal situação.
Nézet-Séguin disse que seu objetivo principal na Filadélfia era conquistar a cidade novamente, transformar o orgulho que a cidade tem de sua orquestra em um orgulho muito mais proativo, uma verdadeira paixão por ela, um sentimento de propriedade.
Naquela última apresentação no Carnegie Hall, quando a orquestra executou o Réquiem de Verdi em outubro, Nézet-Séguin ficou com a mão levantada por aproximadamente 20 segundos após o acorde final expirar, antes de abaixar os braços. Parecia atordoado com a ovação.
Nézet-Séguin foi também recebido com aplausos das pessoas mais próximas a ele no camarim lotado. Os assistentes abriram garrafas de vinho espumante. Nézet-Séguin abraçou seu companheiro, Tourville, olhou-o nos olhos e disse - Oui?
- Oui - respondeu Tourville.
Com ares de coroação, a orquestra e os executivos do Carnegie Hall fizeram um brinde a Nézet-Séguin.
- Meu mais profundo desejo era de que a apresentação desse certo aqui - disse ele - e deu.
The New York Times
Jovem maestro conquista a elite do mundo das orquestras
O canadense Yannick Nézet-Séguin, de 37 anos, recebe o respeito dos veteranos e o entusiasmo do público e da crítica
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