É cedo para afirmar, com precisão, por que criminosos queimaram cinco ônibus e um lotação na noite de terça-feira. Mas aos poucos surgem indícios de que as ordens para a onda de terror que se espalhou pela Zona Sul e assustou a Capital partiram de alguma cadeia. O primeiro a afirmar isso foi o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati. A cúpula da segurança diz que, até agora, nada liga os atentados ao sistema prisional, mas, caso a informação de Fortunati se confirme, não será surpresa. Os presídios foram privatizados pelas facções. São os criminosos presos pela polícia, condenados pela Justiça e custodiados pelo Estado que mandam nas prisões.
Como foram as 10 horas da ação organizada de criminosos
Detentos planejam e arregimentam comparsas para realizar assaltos a carros-fortes e a bancos. Usam celulares para se comunicar com seus comparsas - aparelhos comprados de servidores públicos corruptos ou levados por familiares ou advogados.
É de dentro da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), que de "alta segurança" tem só o nome, que traficantes determinam a execução de rivais nas ruas.
A Pasc sequer preserva a integridade dos presos, como ficou claro na morte do traficante Teréu, asfixiado diante de câmeras de vídeo no refeitório da instituição. Agentes penitenciários de plantão foram incapazes de impedir o assassinato.
Ataque a ônibus foi orquestrado de dentro de presídios, afirma Fortunati
Nas galerias da Penitenciária Estadual do Jacuí, também em Charqueadas, e do Presídio Central, definido como a "pior prisão do país", PMs, promotores ou juízes não entram - o acesso só ocorre mediante autorização dos chefes das facção ou quando os apenados estão no pátio. Lá dentro, os bandidos vendem e consomem drogas, autorizam a entrada de presos, aplicam punições.
Para quem duvida, recomendo o documentário Central, dirigido pela cineasta Tatiana Sager e codirigido pelo jornalista do Diário Gaúcho Renato Dornelles, que em breve estará em cartaz.
Renato Dornelles: Rio, São Paulo e Santa Catarina são 'logo aqui'
É este o contexto no Rio Grande do Sul. A insegurança no mais meridional dos estados brasileiros é provocada pelos que estão encarcerados. Constrange a incompetência de sucessivos governos ao lidar com o assunto.
Contratar mais PMs ajuda, mas não resolve. Mais segurança nas ruas depende da "desprivatização" das cadeias, da reforma e da construção de penitenciárias, da expulsão de servidores corruptos, da erradicação dos celulares das prisões. Enquanto isso não for feito, estaremos secando gelo - e perdendo vidas.
*Diário Gaúcho