O ataque à redação da revista francesa Charlie Hebdo pode trazer violentos reflexos, como novos ataques, retaliações e intolerância religiosa. O atentado aconteceu na quarta-feira, em Paris, e deixou 12 mortos e 11 feridos.
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Conheça o perfil dos responsáveis pelo ataque
Confira quatro possíveis reflexos do ataque:
1. Mais força ao jihadismo e ao Estado Islâmico
Grupo Estado Islâmico espalha temor pelo mundo
Foto: Reprodução / AFP / ISIL
Duas bandeiras jihadistas foram encontradas pelos investigadores no veículo abandonado na quarta-feira, em Paris, pelos autores do ataque. O atentado confirmou o temor de que os jihadistas poderiam atingir o coração da Europa e, em particular, um país em guerra contra os grupos extremistas do Oriente Médio e do Sahel. Conforme especialistas, os assassinatos de chargistas cujos desenhos indignaram muitos muçulmanos servirão de propaganda aos movimentos jihadistas e facilitarão o recrutamento de novos combatentes.
- Este ataque foi cometido para provocar uma onda de choque no cenário internacional. Sua execução espetacular quer demonstrar a influência dos movimentos jihadistas na Europa - afirma Lina Khatib, diretora do centro Carnegie para o Oriente Médio.
Vídeo mostra terroristas executando policial na saída da sede:
Lina ainda acrescenta que o objetivo do ataque também foi deixar uma mensagem aos Estados, em particular aos integrantes da coalizão internacional, "para que vejam que são vulneráveis". Por isso, segundo a especialista, os criminosos escolheram uma zona central em Paris, que é muito simbólica.
Nas redes sociais, simpatizantes da Al-Qaeda e, sobretudo, do Estado Islâmico comemoraram o ataque. A Rádio do Estado Islâmico chegou a chamar de "heróis" os autores do ataque.
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Seja um ataque motivado exclusivamente pela questão das caricaturas ou um atentado destinado a punir os países em guerra contra os jihadistas, o ocorrido será um catalizador para atrair novos simpatizantes à causa jihadista, segundo Max Abrahms, um especialista americano em terrorismo.
- Este ataque será considerado um sucesso. E quanto mais os grupos terroristas dão a impressão de sair ganhando, mais fácil é recrutar pessoas - explica.
2. Risco de novos ataques no Ocidente
Nesta quinta-feira, policial morreu em troca de tiros ao sul de Paris
Foto: Thomas Samson / AFP
O atentado a Charlie Hebdo não foi reivindicado, mas confirma o risco de atentados no Ocidente em meio à ascensão do grupo Estado Islâmico no Iraque e na Síria e ao lançamento de uma coalizão internacional com forte participação ocidental para combatê-lo. Tendo esta guerra como pano de fundo, os serviços de inteligência ocidentais alertaram contra o risco dos jihadistas que voltam aos seus países de origem na Europa.
A França está particularmente exposta, já que participa dos ataques aéreos no Iraque contra o Estado Islâmico e mobilizou um dispositivo militar de grande porte em cinco países do Sahel contra diversos grupos islamitas. Nos últimos meses, tanto o EI quanto a Al-Qaeda na Península Arábica (AQPA) convocaram em várias ocasiões seus partidários a atacar a França.
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A revista da AQPA, Inspire, encorajou seus simpatizantes a atacar na França, e inscreveu na lista de pessoas a serem eliminadas o redator-chefe da Charlie Hebdo, Stéphane Charbonnier, conhecido como Charb, executado no atentado de quarta-feira.
- O Estado Islâmico e outros grupos considerarão o ataque como um êxito que deve ser repetido - adverte Abrahms.
Confira imagens do local do atentado:
3. Aumento da islãmofobia e da xenofobia
Franceses lotam a Praça da República, em Paris, em homenagem às vítimas do ataque
Foto: DOMINIQUE FAGET / AFP
Atribuído a islamitas, o ataque a Charlie Hebdo pode gerar mais hostilidade em relação aos muçulmanos na Europa, conforme o ex-embaixador da França e diplomata da União Europeia Marc Pierin. O Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Zeid Al Hussein, expressou preocupação com as manifestações contra imigrantes, que já são crescentes na Europa.
Na França, que conta com uma expressiva comunidade muçulmana e luta contra grupos islamitas no Sahel e a organização jihadista Estado Islâmico no Iraque, há um intenso debate sobre o Islã e a imigração. Nesse contexto, o livro do polêmico Eric Zemmour, O suicídio francês, que considera que a imigração é uma das causas dos problemas da França, esteve no topo da lista de livros mais vendidos no país no ano passado.
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- Nunca se falou tanto do Islã nos meios de comunicação e nunca se estigmatizou tanto o Islã na Europa. Para aqueles que realizam atentados deste tipo, são imagens contra imagens, mortos contra mortos, olho por olho - explicou Hasni Abidi, um pesquisador argelino radicado em Genebra.
Mais da metade dos alemães (57%) considera o Islã uma ameaça, e 61% estimam que esta religião é incompatível com o mundo ocidental, segundo uma pesquisa publicada nesta quinta-feira. Na Suécia, os recentes incêndios em três mesquitas indicam islãmofobia, apesar de um deles aparentar se tratar de acidente.
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O jornal saudita Al Sharq afirmou que "o atentado coloca em dificuldade os muçulmanos, já que os grupos extremistas europeus vão usar o incidente para avivar a islamofobia". Já o jornal argelino El Watan teme que os muçulmanos franceses sofram agressões, como as que aconteceu depois do 11 de setembro nos Estados Unidos.
4. Aumento da segurança em empresas jornalísticas
Revista era alvo constante de ameaças desde 2006
Foto: BERTRAND GUAY / AFP
Outro reflexo do atentado a Charlie Hebdo é o aumento da segurança em empresas jornalísticas, a exemplo do que aconteceu na Dinamarca e na Espanha. No jornal dinamarquês Jyllands-Posten, que publicou charges de Maomé, a segurança foi reforçada após o atentado na França. Já na Espanha, a sede do grupo de comunicação espanhol Prisa chegou a ser esvaziada.
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Nesta quinta-feira, o Jyllands-Posten optou por não reproduzir nenhum desenho da revista francesa Charlie Hebdo, por segurança. Apesar da escolha do periódico dinamarquês, o dirigente para a América Larina da Associação Mundial de Jornais e Editores de Notícias (WAN-Ifra), Rodrigo Bonilla, afirmou que não devem ocorrer censuras aos meios de comunicação por causa do atentado.
- As pessoas não vão se calar, vão dizer as coisas mais do que nunca, vão continuar denunciando, criticando.
*Zero Hora, com agências