![Ronaldo Bernardi / Agencia RBS Ronaldo Bernardi / Agencia RBS](http://www.rbsdirect.com.br/imagesrc/15873796.jpg?w=700)
Com 113 mil processos em tramitação, o Rio Grande do Sul desponta como campeão nacional das ações judiciais no campo da saúde. Mais da metade dos processos envolvendo remédios ou tratamento médico, no país, tramita em território gaúcho. Mas a judicialização pode, também, garantir a sobrevivência de crianças.
zh.doc: judicialização da saúde vira jogo de interesses
É o caso de Miguel Arcanjo da Silva, de um ano e meio, salvo graças a uma ação judicial. O sorridente Miguelzinho, que mora em Guaíba, nasceu com problemas nos pulmões, no sangue e na estrutura óssea. Ficou um ano e três meses no Hospital de Clínicas de Porto Alegre e não tinha como retornar para casa sem a adaptação completa da moradia para atender aos seus problemas respiratórios.
A saída foi recorrer à Defensoria Pública, que ingressou na Justiça com uma "ação ordinária de obrigação de fazer". Graças ao pedido de ajuda formulado judicialmente, o bebê - que veio ao mundo aos seis meses da gestação, com doenças graves e apenas 770 gramas de peso - ganhou leite especial, medicamentos e um quarto dotado de aparelhos para auxiliar na respiração.
- O guri tinha convulsões, dificuldade de respirar. Se não fosse a Defensoria, o hospital e a própria prefeitura, a gente não teria como salvar a vida dele - diz a tia e tutora de Miguel, a papeleira Margarete da Silva.
Ela, o marido e Miguelzinho moram em uma das vilas mais pobres de Guaíba, ao lado de um valão. As sobras do que a sociedade descarta são, para eles, um tesouro a ser peneirado.
Margarete é madrinha de várias crianças da vila, a Nova Guaíba. E essas, por sua vez, adotaram Miguelzinho como mascote.
Apesar da necessidade permanente de usar sondas e medicamentos, ele parece não se dar conta dos problemas. Engatinha por tudo, caminha com apoio, sempre a sorrir.
Miguel ainda depende dos aparelhos, mas as perspectivas são boas. É provável que os pulmões desenvolvam capacidade de atuação sem ajuda de aparelhos. Outros problemas, como o das pernas, talvez tenham de ser corrigidos mediante cirurgias.
Para todos os casos, a Defensoria Pública garante estar pronta a acionar a Justiça, se necessário. O defensor público Augusto Pacheco Ribeiro diz que a necessidade de salvar Miguel foi quase um consenso, que incluiu a própria prefeitura, ré na ação.
- Era um caso de vida ou morte, e o objetivo foi cumprido. É o tipo da situação irrefutável. Acho que chegamos na hora certa - diz, aliviado.
Para a defensora Paula Pinto de Souza, do Núcleo de Defesa da Saúde da Defensoria Pública do RS, casos como o de Miguelzinho reafirmam a necessidade de recorrer à Justiça diante da burocracia do Estado.
Valor da cirurgia ficou cinco vezes menos
Pode uma cirurgia custar cinco vezes mais do que outra, de resultado igual? Pode, conforme descobriu a prefeitura de Charqueadas.
João Pedro Gomes, morador do município, ingressou na Justiça para obter tratamento para uma fratura que o deixou com o pé direito torto e infeccionado, com rigidez de movimentos, a chamada artrite séptica. O sofrimento durava seis meses quando ele contratou uma advogada para cuidar do caso.
Após o exame custeado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), um ortopedista encaminhou o paciente a um especialista, na Capital. O profissional acertou que faria a operação de forma particular, a um preço final de R$ 114.784, incluindo cirurgia e internação. Desses, R$ 89 mil seriam de honorários. A Justiça aceitou o orçamento e determinou que os R$ 114,7 mil fossem custeados pela prefeitura.
Inconformados, administra-dores municipais recorreram da decisão. O médico Jaime Guedes da Silveira, consultor da prefeitura, atestou em laudo que a cirurgia não era urgente e, além disso, não poderia custar tanto. Ele acompanhou o paciente até a Capital e realizou novas tomadas de preço.
O resultado surpreendeu. No primeiro hospital, a operação foi orçada em R$ 20 mil. Na Santa Casa de Misericórdia, com outra técnica, o orçamento foi de R$ 18.874, cinco vezes menos do que o inicial. A Justiça acatou a explicação, e a prefeitura custeou o tratamento na Santa Casa. Gomes foi operado e voltou a andar.
Saiba mais
MP investiga mais de 70 cirurgias feitas com autorização judicial em Pelotas