
A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) foi sede, na quarta-feira (24), de um encontro que pretende ser a base de medidas duras e definitivas contra o racismo e a violência no esporte. Dirigentes de entidades, profissionais da Seleção, de clubes, da imprensa e de outros setores da sociedade debateram ideias, entre elas a possível perda de pontos por parte de clubes que tiverem envolvidos em episódios de preconceito.
Entre os mediadores do evento estava Fabiano Machado da Rosa, advogado especialista em compliance antidiscriminatório. Ele escreveu para GZH um texto a partir da experiência. Leia a seguir.
No último dia 24 de agosto, a Confederação Brasileira de Futebol deu um passo histórico que mudará, nos próximos anos, a cara da maior paixão brasileira gerando impactos para além dos gramados para vida de milhões de pessoas no nosso país. Já já eu conto que passo foi esse.
Se você é gremista, tenho certeza de que seu coração já explodiu de alegria com as façanhas do magnífico Everaldo – eternizado com honra na estrela dourada da bandeira do Tricolor gaúcho –, vibrou com Tarcísio Flecha Negra e seus 226 (sim 226!) incríveis gols marcados ou celebrou a genialidade de Ronaldinho Gaúcho, por duas vezes o melhor jogador do mundo. Se, ao contrário, seu coração pulsa em vermelho no ritmo do Internacional, já ouviu passagens épicas do lendário Escurinho, quase "enfartou" com o cruzamento de Valdomiro para o gol de Figueroa, que deu o primeiro título brasileiro ao Colorado, ou foi ao delírio com Tinga no gol de cabeça que deu o título da Libertadores da América de 2006.
O que une as histórias desses ídolos absolutos do futebol, louvados por torcidas inflamadas, heróis de títulos que até hoje nos tiram lágrimas dos olhos, é que na vida fora dos campos, alguns diriam na vida real, são homens negros em um país machucado pela ferida do racismo. São homens negros que vivem o paradoxo de serem idolatrados em campo no mesmo momento em que recebem insultos racistas em forma de cantos, ofensas e... até mesmo bananas jogados ao campo. Não há mais como tolerar como natural um futebol de ídolos negros violentados na alma pela violência cruel e injusta do racismo.
Nesse ano, o Observatório da Discriminação Racial no Futebol, em parceria com o Museu da UFRGS, publicou o 8º Relatório Anual da Discriminação no Futebol mostrando em forma de dados a realidade do racismo nos nossos gramados. Foram reportados 158 registros de casos de discriminação e preconceito nos esportes, com aumento de 97,5% em relação ao não anterior. Os casos foram registrados nos campos, nas redes sociais e, até mesmo, em programas esportivos de rádio e televisão mostrando a estruturalidades do problema.
Voltando ao dia histórico, a CBF promoveu um seminário internacional para combater o racismo e a violência nos estádios envolvendo federações, clubes, órgãos públicos e sociedade civil. Um grupo de trabalho foi criado para apresentar propostas de novas regras, ações educacionais de prevenção, estratégias de comunicação e punição para deliberação da CBF. Por exemplo, a proposta de que casos de racismo possam ter como punição a perda de pontos nos campeonatos das quatro séries já em 2023.
Precisamos passar do tempo das explicações tidas por mal-entendidos para a era das consequências geradas pela prática do crime de racismo contra atletas, torcidas, dirigentes, arbitragem e imprensa. Futebol não pode ser gramado para ódios, preconceitos e discriminações. Futebol precisa ser sobre paixão, amor pelo clube, alegria, festa, superação e vitórias.
Um nova história começa a ser escrita por todas as pessoas que vivem o futebol mais vitorioso do mundo: vamos levantar a taça da diversidade, inclusão e respeito nos gramados do Brasil!