Por Adriane Kiperman
Diretora editorial da edtech para o Ensino Superior e profissional +A Educação
Gustavo Hoffman
Especialista em gestão de instituições educacionais e fellow da Universidade de Harvard
A pesquisa O Ensino Híbrido como Catalizador do Processo de Aprendizagem Ativa, publicada no periódico científico International Journal on Active Learning, foi realizada de Norte a Sul do Brasil com alunos de Ensino Superior, comparando o aprendizado nas modalidades presencial e híbrido. A conclusão: no modelo híbrido (50% presencial e 50% online), os alunos aprenderam 9% a mais. Qual será o futuro nesse cenário?
Do ponto de vista regulatório, só há duas modalidades de ensino no Brasil: presencial (com possibilidade de 40% a distância) e EAD (com limitação ao presencial de 30% das aulas). Mas no Brasil o EAD sofre grande estigma sobre a qualidade de seu ensino porque, em geral, os cursos são formatados com videoaulas, raro espaço para tirar dúvidas e pouco conhecimento de metodologias para engajamento dos alunos. Com isso, a percepção de qualidade se atrela à presença física.
Outra peculiaridade é que, aqui, o online é atrativo por representar uma economia de investimento para as instituições de Ensino Superior (IESs) e os alunos. Os cursos EAD custam menos de 50% dos presenciais, com opções de graduação com parcelas mensais de só dois dígitos. Esse cenário é muito diferente no México, por exemplo, onde os valores das mensalidades dos cursos híbridos equivalem a 95% do presencial e os de EAD, a 90%.
A crise econômica que o Brasil enfrenta, a diminuição das bolsas do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e a pandemia representam uma quebra de paradigmas, impondo desafios para as IESs. Quem tinha resistência de experimentar a aula online percebeu que funciona e, agora, não dá mais para voltar atrás.
Neste momento, fica evidente que o modelo tradicional expositivo, massivamente usado no Brasil, não atende às expectativas. Para um futuro próximo, as duas modalidades regulamentadas vigentes deverão se combinar organicamente, e o que precisa ser combatido são os modelos que não funcionam. As metodologias ativas, que colocam o aluno como ponto central do processo, impulsionando seu desenvolvimento e autonomia, devem ganhar espaço.
Nesse contexto, o híbrido se diferencia. O método peer instruction, por exemplo, possibilita que o professor promova debates e estimule o senso crítico com competências alinhadas ao cenário real do mercado de trabalho. A metodologia pode ser aplicada por um clique em salas virtuais via Zoom ou Google Meet e permite dinamizar os momentos de exposição teórica.
Outros recursos inovadores de imersão, como realidade virtual e aumentada, 3D e vídeos interativos colocam o aluno na posição ativa de aprendizado. Essas ferramentas permitem melhora expressiva no engajamento, o que pode ser comprovado ao comparar grau de reprovação, nível de aprendizagem e satisfação. É a metodologia aliada à tecnologia que promove a mudança.
Devido à preocupação com as alterações nas carreiras, as universidades mundo afora repensam o modelo para o novo ingressante no mercado. Segundo a National University of Singapore, cada egresso das universidades hoje performará em cerca de seis profissões diferentes durante a carreira. Em 2030, 85% das profissões atuais não existirão mais, de acordo com o Institute For the Future. Isso não quer dizer que, por exemplo, Engenharia e Direito vão acabar, mas que 76% do que faz um advogado poderá ser substituído por máquinas, em 2026, assim como 96% das atividades de um engenheiro químico, de acordo com o estudo do Laboratório de Aprendizagem de Máquina em Finanças e Organizações (LAMFO), da Universidade de Brasília (UNB).
Como não se sabe quais serão as competências do engenheiro ou do advogado do futuro, precisamos preparar todos os profissionais para essas novas exigências. O aluno precisa ser exposto a problemas factíveis do mundo real e desenvolver a capacidade de resolvê-los. O Massachusetts Institute of Technology (MIT), que investe nessa dinâmica, é reconhecido como um dos melhores formadores de profissionais em tecnologia.
Em breve, as microcertificações voltadas para o mercado de trabalho (nanodegrees) serão a bola da vez e as graduações longas e tradicionais serão trocadas por aprendizados contínuos. Na área de TI isso já é realidade, e algumas certificações valem mais do que a graduação para o mercado de trabalho.
A educação nunca vai acabar. Mas, em breve, o sistema não será mais o mesmo.
As universidades brasileiras estão engatinhando nessa seara e, por isso, novos players e as próprias empresas, por meio de universidades corporativas, têm investido no lifelong learning. Mas deveria ser o contrário: as realidades do mundo corporativo deveriam ser levadas para as instituições de ensino. Isso demostra a fragilidade e a dificuldade que o setor de educação tem de se adequar às inovações.
Hoje há um gap entre mundo real e mundo acadêmico, mas há boas notícias. Em cinco anos, as IESs devem estar mais inseridas no mundo corporativo, impulsionadas pela Resolução do CNE nº 07/2018, que prevê que ao menos 10% da carga horária dos cursos de graduação seja ofertada no formato de extensão, conectadas com a sociedade. A premissa de ampliar o ensino híbrido e de incluir soft skills na grade curricular também contribui para incrementar competências para o setor produtivo.
Ressalte-se que 80% das competências profissionais do século 21, listadas pelo Fórum Econômico Mundial, são soft skills, como capacidade de resolução de problemas, criatividade, comunicação, empatia e liderança. São características que independem das mudanças das profissões.
A educação nunca vai acabar. Mas, em breve, o sistema não será mais o mesmo. O cenário ideal impõe às instituições de ensino tomar a liderança desse movimento e se tornar a força motriz do futuro. Quem não estiver atento e não investir em inovação ficará para trás.