O projeto também quer aumentar a concentração do composto que ajuda a prevenir o câncer. Foto: Heather Ainsworth/NYTNS
Lá está ele, uma belezura verde na banca da feira, aquele dínamo nutricional saboroso que conhecemos pelo nome de brócolis.
Há também a versão amarga e borrachuda que começa a amarelar nas pontas - ou escurecer por causa da longa viagem do campo para o supermercado.
Thomas Bjorkman, cientista da Universidade Cornell, examinou a segunda versão como se fosse um médico, impassível, mas com um pouco de dó.
- Está macio, quase murcho - sentencia ele, cutucando um dos pés. O cheiro forte é por causa dos compostos sulfúricos. Em uma escala de 0 a 10, sendo 10 o nível máximo de frescor- Para esse eu daria 2, no máximo 3. -
Apesar de todas as maravilhas da versão fresca, na maior parte dos EUA ela só é encontrada durante as semanas mais frias no início e no final da temporada de plantio, o que não é, nem de longe, tempo suficiente para se tornar presença obrigatória nos mercados e cozinhas do país.
A verdura odeia muito calor e é por isso que 90% de todo o volume que é vendido internamente sai da Califórnia, estado banhado pela névoa. Ali os pés até que são bonitos, mas quem mora nos outros estados para onde ela tem que ser transportada de caminhão - são quatro ou cinco dias até a Costa Leste, mais o tempo de espera de armazenamento - não tem muita vontade de saboreá-la, mesmo sendo tão elogiada pelos especialistas. E com razão.
Entretanto, Bjorkman e sua equipe querem mudar isso - e criaram uma nova versão que se adapta a verões quentes e úmidos como os de Nova York, da Carolina do Sul e Iowa e que, além de tudo, é fácil e barata de cultivar em grandes quantidades.
Pensa que eles pararam por aí? A nova opção é crocante, levemente adocicada e supermacia quando consumida fresca, o que poderia elevar os brócolis à elite da categoria. Imagine uma salada com raspas do talo, como Bjorkman sugere, ou um tempurá ultracrocrante sem nem ter que aferventá-los.
- Se você já provou brócolis frescos, sabe que é uma coisa completamente diferente - e se o objetivo é elevar seu consumo, então precisamos aumentar a oferta a um preço atraente - diz ele.
Os novos brócolis são parte da iniciativa maluca dos cientistas de Cornell, que pretendem refazer a maioria dos hortifrúti. O objetivo é mudar a atitude em relação a esses produtos aumentando seu apelo e utilização na culinária, ao mesmo tempo mantendo - ou até aumentando - seu valor nutricional. Recentemente, o laboratório de Cornell conseguiu criar uma pimenta habanero saborosa, mas sem ardor, vagens sem os fios fibrosos e maçãs suculentas que não escurecem depois de descascadas, um incentivo e tanto para as tias do refeitório que sofrem com a quantidade encalhada da fruta - já que os alunos só comem se ela estiver picada.
O Eastern Broccoli Project, desenvolvido na Estação Experimental Agrícola da universidade que fica na cidadezinha de Finger Lakes, também quer aumentar a concentração de glucorafanina, o composto que ajuda a prevenir o câncer.
Nessa cruzada, Bjorkman, de 50 anos, é uma mistura de inventor maluco e vendedor persistente que foi a Washington. Enquanto desenvolvia as novas plantas, viajou à capital federal para pedir que os políticos investissem em pesquisa. Além disso, falou com produtores, comerciantes e economistas para garantir que o novo produto tivesse mercado de massa, primeiro na Costa Leste e depois no resto do país.
Depois de dois anos de experimentos de sucesso com as maiores empresas de sementes, os brócolis de tempo quente estão prontos para o cultivo, embora possa levar mais tempo até que sejam comercializados em grande escala.
Embora Bjorkman seja vegetariano e defensor agrícola ferrenho, seus Brócolis Perfeitos desafiam a ideias que os puristas têm do alimento. Os críticos até são a favor do aspecto científico, que envolve formas tradicionais de biotecnologia - como placas de Petri para combinar brócolis com nabos e outras plantas que não têm muita coisa em comum - e a seleção de genes que podem diminuir os custos de produção e aumentar o apelo ao consumidor.
O problema está em sua parceria com empresas como a Monsanto, cujas propriedades incluem a abóbora e o milho modificados geneticamente. Nem a empresa nem o cientista dizem que pretendem seguir o mesmo caminho para criar brócolis melhores e mais atraentes.
- É mais um exemplo do controle da Monsanto sobre o fornecimento de alimentos e leva a uma pergunta crucial e perfeitamente legítima: será que uma única corporação tem o direito de controlar coisas de que as pessoas dependem?- afirma Marion Nestle, professora de Nutrição na Universidade de Nova York e autora do livro "Food Politics".
A Monsanto foi uma das primeiras a comprar a ideia da nova verdura, unindo-se a Bjorkman para fazer plantios de teste de algumas variedades e agora já começou a vender as sementes para os produtores na Geórgia. A empresa se diz consciente em relação às preocupações sobre a consolidação do setor e fez questão de disponibilizar as sementes também para pequenos produtores e membros do público em geral, iniciativa aprovada por Bjorkman.
- Para dar certo, é preciso trabalhar com o ramo consolidado de sementes, mas não exclusivamente. É preciso disponibilizar a nova versão a todos - explica Bjorkman.
Sabendo que o comércio inteligente é essencial para o sucesso da empreitada, Bjorkman criou o projeto para incluir todos os aspectos do cultivo e comercialização, o que lhe garantiu US$3,2 milhões do Departamento Norte-Americano de Agricultura em 2010, além de US$1,7 milhão de contribuição de parceiros comerciais. (Um de seus principais objetivos é convencer os agricultores a promover os brócolis como um produto regional e fazer uma distribuição rápida.) Ele chegou a pedir a um chef local, Jack Woolfrey, que criasse receitas para mostrar as vantagens de cozimento da nova verdura.
O conhecimento de Bjorkman em fisiologia vegetal também ajudou a solucionar um enigma agrícola: a Califórnia também tem dias quentes no verão; por que então é tão difícil cultivar a versão padrão da Carolina do Sul?
- O problema são as noites aqui no Leste. Elas são muito mais quentes que as da Califórnia. E eu descobri que os brócolis sabem contar o tempo. Oito ou 10 horas de calor, tudo bem, mas mais de 24 horas acima dos 15° C, as plantas decidem se suicidar em vez de desabrochar - e o resultado é que o produtor termina com um punhado de folhas apenas. -
(Outra informação útil: mesmo depois que os pés são cortados para consumo, continuam respirando normalmente, com as mitocôndrias de suas células funcionando 10 vezes mais rápido que as da cenoura. O calor que isso gera acelera sua degeneração, principalmente quando os pés são arrumados em pilhas grandes. O fenômeno também ajuda a explicar por que os brócolis ressecam na geladeira se não estiverem cobertos por plástico.)
Os agricultores da Costa Leste talvez não se beneficiem tanto do plantio quanto os colegas da Califórnia, mas podem compensar essa diferença (sem ter que cobrar mais) evitando custos de transporte, que Bjorkman conta como outro benefício da versão nova: cada hectare cultivado no Leste representa um consumo menor de combustível, gerando menos gases estufa.
O próximo alvo de sua equipe é o consumidor. Vários grupos de testes (cerca de 150 pessoas) vão receber os brócolis da Califórnia e a opção nova para comparações visuais e de sabor. E em uma jogada bolada pelo especialista de Marketing de Cornell, Miguel I. Gómez, eles vão avaliar o preço da verdura, usando seu próprio dinheiro.
Será que o público aposta no frescor dos brócolis locais?
- Prefiro não ter que adivinhar. Quero só saber quanto eles estão dispostos a pagar - diz Bjorkman sobre seus planos.