O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou na segunda-feira (3), que precisa ampliar a receita do governo em R$ 110 bilhões a R$ 150 bilhões para viabilizar as metas do arcabouço fiscal, a nova regra divulgada na semana passada em substituição ao teto de gastos. Segundo ele, o projeto pode ser enviado ao Congresso apenas na próxima semana.
Para ampliar a arrecadação, o governo vai apresentar inicialmente três medidas para reforçar os cofres: taxação de apostas eletrônicas, com objetivo de arrecadar de R$ 12 bilhões a R$ 15 bilhões por ano; taxação de e-commerces que driblam as regras da Receita Federal, não pagando impostos (o que o ministro chamou de "contrabando", com perdas estimadas de R$ 7 bilhões a R$ 8 bilhões), e não permitir que subvenção a Estados para investimento seja equiparada a custeio — medida que pode render de R$ 85 bilhões a R$ 90 bilhões.
— Ente R$ 110 e 150 bilhões você zera o déficit no ano que vem — afirmou Haddad à GloboNews.
Segundo ele, não é preciso "aumentar nem criar imposto para atingir esse objetivo".
— Basta cobrar de quem não paga — disse.
A proposta da nova regra fiscal apresentada pelo governo prevê zerar o rombo das contas públicas em 2024 e passar a ter superávits primários (receitas maiores que despesas, sem contar o pagamento dos juros da dívida) a partir de 2025.
Apesar de as equipes técnicas dos ministérios da Fazenda, Planejamento e Orçamento e Casa Civil terem trabalhado durante todo o fim de semana na formatação do texto final da proposta de novo arcabouço fiscal, ele pode ser enviado ao Congresso apenas na próxima semana, segundo Haddad.
O ministro garantiu que a proposta chegará aos parlamentares com medidas para a recuperação das receitas federais.
— As equipes estão por conta disso desde sexta-feira, trabalharam no fim de semana. Como não tem sessão do Congresso nesta semana, vão aproveitar esses dias para calibrar a proposta. Se ficar pronto antes, enviamos até quarta-feira. Se não, mandamos na segunda-feira da semana que vem — afirmou ele.
"Jabutis tributários"
A caçada do ministro aos "jabutis tributários" para aumentar em até R$ 150 bilhões a arrecadação do governo envolve o fechamento de brechas na legislação usadas pelas empresas e pessoas físicas para pagar menos imposto e um esforço concentrado na defesa das grandes causas no Judiciário que podem reforçar o caixa do governo em caso de vitória da União.
Entre as medidas, o governo considera propor uma mudança na tributação dos fundos exclusivos usados pelos super-ricos para aplicar o seu dinheiro. Nos governos passados, já houve três tentativas frustradas de mudar essa tributação. A Receita Federal é a maior defensora dessa mudança.
Haddad afirmou que o governo já sabia desde seu início que teria de enfrentar "jabutis tributários", que vem trazendo "efeitos desastrosos" à economia brasileira. Segundo ele, o governo tem sofrido problemas de natureza tributária, e além das derrotas da Receita no Supremo Tribunal Federal (STF) — a exemplo da exclusão ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins —, há também normas que geram questionamento antes mesmo do Supremo se manifestar.
O ministro listou que, dos R$ 100 bilhões perdidos com a exclusão de ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins, R$ 30 bilhões já foram recuperados com medida provisória publicada pelo governo no início do ano. Haddad afirmou que um segundo conjunto de medidas será feito e deve recuperar as perdas com Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Outras medidas para correção de distorções foram elencadas pelo ministro, como a arrecadação com tributação sobre jogos de apostas, que deve gerar uma receita de R$ 12 bilhões, ante estimativa preliminar de R$ 6 bilhões.
— Não é justo não tributar atividade que muitas pessoas nem concordam que exista no Brasil — acrescentou.
O combate ao "contrabando oficial" também foi citado por Haddad, em referência ao "comércio eletrônico que escamoteia, que se faz passar de remessa de pessoa para pessoa".
O ministro argumenta que a reforma tributária deve trazer para dentro do sistema quem hoje consegue sonegar.
De acordo com Haddad, a reforma está prevista para ser votada na Câmara até julho e no Senado até outubro. O ministro defende que o objetivo do texto é sanear um sistema tributário altamente desorganizado, no qual a receita vem sofrendo com reveses multimilionários e não um aumento de alíquota ou criação de novos tributos.
Segundo ele, há outras seis medidas saneadoras que podem entrar em discussão após a reforma.
— O arcabouço sugere que dilua um pouco no tempo — disse.
— O mais importante é dar um sinal do rumo do que fazer tudo agora e descompensar algo na economia. Se o rumo estiver claro e a autoridade monetária harmonizar com a fiscal, a sociedade brasileira vai crescer mais, pagar menos juros e o Estado estará menos endividado.
Carga tributária
Haddad disse também não ver espaço para o discurso de que será necessário aumentar brutalmente a carga tributária, em resposta à entrevista do ex-presidente do Banco Central, Affonso Celso Pastore.
— Ninguém está pensando nisso, não há espaço nem para discutir isso politicamente — disse.
— Corrigir distorções do sistema tributário deveria ser saudado por um liberal. Um liberal deveria aplaudir acabar com o patrimonialismo — afirmou o ministro.
Haddad ainda citou a MP do Carf:
— Brasil é o único país do mundo em que o processo administrativo é contra a Receita, isso é um escândalo. Por que os liberais defendem o que está acontecendo no Carf, no subfaturamento de exportações e paraísos fiscais dentro e fora do Brasil?