O texto-base da reforma tributária do Imposto de Renda (IR), aprovado em acordo de última hora, na quarta-feira (1º), pela Câmara dos Deputados, mantém o descontentamento entre as entidades do setor produtivo gaúcho. Apesar de admitirem avanços sobre a proposta original do governo federal, a elevação da carga de impostos, especialmente, para as empresas e o aumento da complexidade do sistema continuam no alvo das críticas mais contundentes de algumas das principais lideranças setoriais do Estado.
Presidente da Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul), Anderson Cardoso concentra a insatisfação na revogação da isenção da tributação sobre lucros e dividendos, que estabelece uma nova alíquota de 20% (um destaque reduziu esse percentual para 15%) e encerra a dedutibilidade dos juros sobre capital próprio.
— São medidas que aumentam a carga tributária e ampliam a complexidade do sistema. Perdemos a oportunidade de promover uma grande reforma tributária — lamenta.
Sobre a tributação dos lucros e dividendos, ele lembra que a regra, extinta na década de 1990 a pedido da própria Receita Federal, costumava ser chamada de “distribuição disfarçada de lucros”. Segundo Cardoso, a Federasul continua atenta ao tema e, após a votação dos destaques, prevista para esta quinta-feira (2), deverá se manifestar sobre a íntegra da matéria.
Para o presidente da Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado do Rio Grande do Sul (Fecomércio-RS), Luiz Carlos Bohn, a proposta aprovada sequer deveria ser chamada de reforma tributária. Isso porque a considera apenas um “ajuste de alíquotas” na pessoa física. Segundo ele, com muito pouco ganho, nas rendas de até R$ 6 mil, e “aumento imenso” na tributação de pessoas jurídicas (empresas).
— O país precisa de investimentos, inclusive de fora. Que tipo de incentivo terão empresas que já pagaram imposto sobre todos os seus lucros na fonte, agora, tendo de arcar com outra carga na distribuição para os acionistas? — questiona.
Existe a elevação de carga brutal para os próximos anos e isso, com certeza, vai penalizar os futuros salários. Perdemos todos
LUIZ CARLOS BOHN
PRESIDENTE DA FECOMÉRCIO-RS
Bohn acrescenta que a incidência de 20% sobre o lucro distribuído é inadequada para momento econômico atual. E os efeitos, afirma, não ficarão restritos aos empresários.
— Existe a elevação de carga brutal para os próximos anos e isso, com certeza, vai penalizar os futuros salários. Perdemos todos — critica.
O presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), Gilberto Petry, que também é vice-presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), acompanha a tramitação de perto. A entidade, que já se manifestou contrária ao aumento de impostos, deverá comentar o tema somente após a conclusão da votação dos destaques do projeto, prevista para a noite desta quinta-feira.
Menos pior
Na comparação com o texto original, apresentado pelo governo federal em julho, o substitutivo do relator Celso Sabino (PSDB-PA), aprovado por 398 votos a 77, ainda sem os destaques, traz alguns avanços para pessoas jurídicas. É o que dizem lideranças de entidades ligadas ao setor contábil.
— O texto original era voraz em termos arrecadatórios. Agora, já há avanços e está mais próximo de acontecer resume o diretor legislativo da Federação Nacional das Empresas de Serviços Contábeis (Fenacon), Diogo Chamun.
— O texto original era voraz em termos arrecadatórios. Agora, já há avanços e está mais próximo de acontecer
DIOGO CHAMUN
diretor legislativo da Fenacon
Entre as melhorias, ele aponta a tributação dos dividendos, por exemplo. Prevista, inicialmente, para todas empresas, com exceção da distribuição de lucros até R$ 20 mil nas pequenas e médias do Simples Nacional, o imposto da distribuição dos lucros foi isentado para as pessoas jurídicas com faturamento de até R$ 4,8 milhões.
— Beneficia as menores, onde se confunde o que é imposto da empresa ou dos sócios. É bom, diante do cenário, porque o projeto original foi muito pesado e já estamos tão anestesiados que conseguimos encontrar coisas positivas — argumenta.
O presidente do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis do Estado (Sescon-RS), Célio Levandovski, destaca o mesmo aspecto. Para ele, o substitutivo teve o mérito de reconhecer a necessidade de tratamento diferenciado às empresas do Simples Nacional:
— Assim diminui o impacto sobre aquelas que mais geram emprego. É o que o país precisa neste momento.
Além disso, a versão aprovada prevê o corte de sete pontos percentuais na alíquota do IR para as empresas. O tributo passaria de 15% para 8%. Levandovski lembra que ao longo da tramitação a redução cogitada chegou a ser maior. Na prática, revela o dirigente, a carga para as pessoas jurídicas será diminuída dos atuais 34% para 26%, considerando o adicional do IR e a contribuição social.
— Ficou menos pior, mas é bem fácil fazer a conta. Vai onerar, porque pagava-se 34%, baixou para 26%, mas o que sobrava e era distribuído para os sócios com isenção agora terá uma carga adicional de 20%, antes, inexistente — calcula.
O diretor legislativo do Sescon-RS, Diogo Chamun, comenta que a matéria aprovada na Câmara, após a apreciação dos destaques, dificilmente será modificada no Senado. Segundo ele, o acordo feito às pressas para a votação do texto-base indica que o pacto de lideranças será mantido nas duas Casas legislativas.
— É preciso fazer uma reflexão. Às vezes nos prendemos ao texto e esquecemos o principal, que é a necessidade de indexação da tabela do IR à Inflação. Este é o motivo de tudo e estamos debatendo a defasagem de 113% pelas perdas inflacionárias, com uma reposição muito tímida de 31% na primeira faixa e apenas 13% nas demais — pontua.