
Idealizadora da série de ficção sobre a vida e o assassinato da vereadora Marielle Franco (1979-2018), a escritora Antonia Pellegrino pediu desculpas nesta quarta-feira (11) pela declaração em que justificou a escolha de José Padilha como diretor do projeto.
Em entrevista à coluna de Maurício Stycer, no portal UOL, Antonia disse que pensou em ter um diretor negro na série, mas deu a entender que não achou um profissional com as características que procurava.
— Se tivesse um Spike Lee, uma Ava DuVernay... — afirmou, referindo a dois conhecidos cineastas norte-americanos.
Após a repercussão negativa da declaração nas redes sociais, a escritora chegou a dizer que "não tem uma Ava DuVernay no Brasil não porque não existam diretoras negras talentosas, mas porque existe, sim, racismo estrutural."
Nesta quarta-feira (11), em longo texto publicado em seus perfis no Twitter e no Instagram, Antonia pediu desculpas.
"Peço perdão pela desastrosa declaração. Em seguida, gostaria de agradecer a todas as pessoas negras do cinema ou não, coletivos, blogs, movimentos, sites que apontaram o meu erro e me fizeram enxergar o que a branquitude não o fez", afirmou ela.
A autora também declarou que, desde o início, a sua intenção era ter uma equipe diversa, "com negros e mulheres na liderança do processo criativo":
"Os convites para essas lideranças, mapeadas muito antes da assinatura do contrato, estão em curso: autoras, autores, diretoras e diretores estão discutindo as condições de sua participação no projeto".
No texto, Antonia afirmou ainda que, em um primeiro momento, ao receber as críticas, achou que estava sendo mal-interpretada.
"Para mim, Antonia, era tão óbvio que eu me referia às relações de negócios viciadas pelo racismo estrutural que não consegui enxergar o que era realmente óbvio: tentei justificar uma relação estratégica de trabalho com um discurso que não apenas reforçava a tal estrutura que eu criticava, como era também a sua principal causa", escreveu.
A partir daí, ela disse que passou a escutar as críticas e entendeu que, "do alto da minha arrogância e ignorância de mulher branca, da zona sul do Rio, que eu não precisava 'denunciar' algo que todas e todos já sabiam."
Destacou que ficou decepcionada com ela mesma:
"Como eu pude dizer uma frase tão estúpida? Hoje, vejo que a resposta é simples: como muitas pessoas brancas progressistas e antirracistas, tive a certeza de que minhas intenções eram tão boas que jamais seriam questionadas neste âmbito".
A autora disse que em nenhum momento se sentiu atacada ou com raiva pelas críticas, mas teve vergonha pelo seu posicionamento inicial:
"Este é um projeto que, desde o primeiro momento, é fundamentalmente comprometido com a luta por justiça por Marielle Franco. São dois anos sem resposta para a pergunta: quem mandou matar Marielle? E contar sua saga, na atual conjuntura, dando máxima visibilidade à história desta heroína brasileira e à sua execução brutal é uma forma de manter o apelo social do caso. Entendo e respeito quem discorde, mas este foi meu compromisso com a família de Marielle", concluiu.
Série de ficção
A ideia da série, que ainda não tem título e deve estrear em 2021, foi desenvolvida por Antonia Pellegrino, escritora, diretora, roteirista e amiga pessoal de Marielle Franco.
Com previsão de duas temporadas, a primeira vai girar em torno da biografia de Marielle, culminando com as circunstâncias do crime que chocou o Brasil e o mundo. Já na segunda, o foco será nos mandantes e, se o caso for solucionado, na resolução do crime. Ainda não foi divulgado o elenco que deve integrar a série.
A socióloga Marielle Franco foi morta a tiros junto com o motorista Anderson Gomes, na zona norte do Rio de Janeiro, no dia 14 de março de 2018. A morte da vereadora causou grande comoção no Brasil e reverberou em outros países em um mobilização pela identificação e punição dos assassinos — até hoje, a pergunta de quem mandou matar a vereadora segue em aberto.
Além da série de ficção, a Globo apresenta nesta quinta-feira (12), após o Big Brother Brasil, o primeiro episódio de um documentário sobre o atentado que tirou a vida de Marielle. Na sexta-feira (13), todos os episódios estarão disponíveis na plataforma de streaming Globoplay.