O livro de um dos mais sanguinários personagens da história está de volta. Depois de vender 12 milhões de cópias e de se tornar um dos principais instrumentos de disseminação do ideário nazista, Minha Luta permaneceu por 70 anos fora das livrarias. Agora, a autobiografia de Adolf Hitler (1889 - 1945), que leva o título original de Mein Kampf, volta ao mercado editorial - inclusive do Brasil. O anúncio confirma a capacidade do livro de continuar gerando controvérsia: de um lado, há quem não concorde com a volta do volume às livrarias; de outro, há até mesmo quem defenda que se torne leitura obrigatória nas escolas.
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A obra volta à tona com sua entrada em domínio público no fim de 2015, ano em que se completaram 70 anos do suicídio de Hitler. Antes disso, os direitos da publicação estavam sob o domínio do governo regional da Baviera, que não autorizava novas edições. A falta de liberação, no entanto, não evitava que Minha Luta circulasse de forma clandestina, principalmente em formato digital, já que pode ser encontrado na internet. Além disso, o livro circulava em alguns países como EUA e Turquia.
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Na Alemanha, o livro retorna nesta sexta-feira, em uma edição crítica, com 2 mil páginas, sendo quase dois terços compostos por notas de rodapé e textos complementares - a legislação alemã entende que a reedição pura e simples do original configura propaganda nazista. O livro será publicado pelo Instituto de História Contemporânea de Munique (IHCM), "para evitar que editoras privadas ganhem dinheiro com ele", como divulgou o órgão.
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Para a ministra da Educação da Alemanha, Johanna Wanka, a edição é um modo de oferecer o texto em um formato indagador, que confronta as ideias delirantes do original. Ela defende sua leitura inclusive nas salas de aula: "Em vez de permitir que o encanto do proibido cative os jovens, é muito melhor que os alunos conheçam o texto pela mão de professores de História e Política", escreveu, em recente artigo no jornal Passauer Neue Presse.
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No Brasil, o escritor Ricardo Lísias, autor de O Livro dos Mandarins e Divórcio, entre outros, foi uma das principais vozes a se posicionar publicamente contra a volta de Minha Luta às livrarias. Depois de postar um texto a respeito do tema no Facebook, recebeu dezenas de comentários de apoio. O autor, que estudou a obra quando cursava mestrado em Letras, adverte para o perigo de a publicação se tornar um veículo de disseminação do discurso de ódio no país:
- O argumento de que o livro pode ser liberado porque tem notas de rodapé é patético. Quem disse que nazista acredita em nota de rodapé? Vou dar um exemplo: todo mundo sabe o que a ditadura militar significou para o Brasil, mas essas pessoas vão para as ruas pedindo a volta da ditadura, e, se você argumenta contra, dizem que você está mentindo. São pessoas irracionais, selvagens.
Lísias não concorda com a circulação comercial da obra, mas não se opõe a uma edição sem fins lucrativos, como a da alemã IHCM:
- Este não pode ser encarado como qualquer outro livro. Não deve ser proibido, mas deve ser lido por especialistas, e não editado comercialmente.
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Editor da Record, Carlos Andreazza assegurou no blog de sua casa editorial que não trabalhará o livro, mas ponderou: "Não marginalizo quem o publicará (...). Se o acesso ao livro de Hitler é facílimo e incontornável, cabe ao editor - do ponto de vista prático - preparar uma edição crítica, comentada, anotada, com acolaboração de historiadores, filósofos e cientistas políticos, que ofereça ao leitor também e fundamentalmente a história de como aquelas ideias terríveis foram aplicadas, e isso inclusive para que tal barbárie jamais se repita", escreveu.
A Geração Editorial trabalha há dois anos em uma tradução de Mein Kampf direta do alemão, repleta de notas críticas e textos de apoio. A edição chegará às livrarias em fevereiro. A editora Centauro também trabalhará a obra no país - no site Estante Virtual, já há exemplares. O livro não tem notas explicativas, mas o texto de divulgação afirma que "não apoia nem respalda, por nenhum meio ou forma, a ideologia ou os conceitos doutrinários de seu autor".
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Para o professor Luis Milman, da UFRGS, a circulação comercial pode ajudar as novas gerações a compreender o quanto o livro é "péssimo".
- Espero que as editoras tenham o cuidado de fazer edições com textos críticos, para que o livro não seja vendido como propaganda nazista. Mas não tenho qualquer objeção contra a publicação, até para mostrar para as pessoas que a qualidade do livro é horrível. Tive a obrigação e o infortúnio de lê-lo. É péssimo em todos os sentidos - avalia Milman.
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Minha Luta foi lançado em 1925, sem causar grande estardalhaço, mas ficou mais popular na medida em que seu autor avançava na escalada ao poder. Em 1933, quando Hitler se tornou chanceler, o livro ultrapassou o primeiro milhão em vendas. Já em 1940, virou leitura escolar obrigatória. Estima-se que 12 milhões de exemplares foram impressos.
Literatura
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